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MISSÕES DA NASA CONSTROEM MAPA SEM PRECEDENTES DO CAMPO MAGNÉTICO DO SOL
23 de fevereiro de 2021

 


A medição da força do campo magnético a quatro altitudes diferentes usando dados do CLASP2 e do Hinode permitiu o mapeamento da propagação das linhas do campo magnético na cromosfera da "praia" solar.
Crédito: NAOJ

 

Durante décadas após a sua descoberta, os observadores só podiam ver a cromosfera solar por alguns momentos fugazes: durante um eclipse solar total, quando um brilho vermelho rodeava a silhueta da Lua.

Mais de cem anos depois, a cromosfera continua a ser a mais misteriosa das camadas atmosféricas do Sol. Situada entre a brilhante superfície e a etérea coroa solar, a atmosfera externa do Sol, a cromosfera é um lugar de mudanças rápidas, onde a temperatura aumenta e os campos magnéticos começam a dominar o comportamento do Sol.

Agora, pela primeira vez, três missões da NASA perscrutaram a atmosfera para enviar medições a várias altitudes do seu campo magnético. As observações - capturadas por dois satélites e pela missão CLASP2 (Chromospheric Layer Spectropolarimeter 2), a bordo de um pequeno foguete suborbital - ajudam a revelar como os campos magnéticos à superfície do Sol dão origem às erupções brilhantes na sua atmosfera externa. O artigo científico foi publicado na passada sexta-feira na revista Science Advances.

Um objetivo principal da heliofísica - a ciência da influência do Sol no espaço, incluindo as atmosferas planetárias - é prever o clima espacial, que geralmente começa no Sol, mas pode espalhar-se rapidamente pelo espaço e causar distúrbios perto da Terra.

O que impulsiona estas erupções solares é o campo magnético do Sol, as linhas invisíveis de força que se estendem da superfície solar ao espaço bem para lá da Terra. Este campo magnético é difícil de ver - só pode ser observado indiretamente, pela luz do plasma, ou gás superaquecido, que traça as suas linhas como faróis de carros que viajam numa estrada distante. No entanto, a forma como essas linhas magnéticas se organizam - sejam frouxas e retas ou firmes e emaranhadas - faz toda a diferença entre um Sol silencioso e uma erupção solar.

"O Sol é belo e misterioso, com atividade constante desencadeada pelos seus campos magnéticos," disse Ryoko Ishikawa, física solar no NAOJ (National Astronomical Observatory of Japan) em Tóquio e autora principal do artigo.

Idealmente, os investigadores poderiam ler as linhas do campo magnético na coroa, onde ocorrem as erupções solares, mas o plasma é muito esparso para leituras precisas (a coroa é mais de mil milhões de vezes menos densa do que o ar ao nível do mar).

Ao invés, os cientistas medem a fotosfera mais densamente compactada - a superfície visível do Sol - duas camadas abaixo. Usam então modelos matemáticos para propagar esse campo para cima até à coroa. Esta abordagem ignora a medição da cromosfera, que fica entre as duas, na esperança de simular o seu comportamento.

Infelizmente, a cromosfera é "selvagem", onde as linhas do campo magnético reorganizam-se de maneiras difíceis de prever. Os modelos lutam para capturar esta complexidade.

"A cromosfera é uma 'bagunça' quente," disse Laurel Rachmeler, ex-cientista do projeto CLASP2 da NASA, agora na NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration). "Nós fazemos suposições simplificadas da física na fotosfera e suposições separadas na coroa. Mas na cromosfera, a maioria dessas suposições desfazem-se."

Instituições nos EUA, Japão, Espanha e França trabalharam juntas para desenvolver uma nova abordagem para medir o campo magnético da cromosfera, apesar da sua natureza desorganizada. Modificando um instrumento que voou em 2015, acoplaram o seu observatório solar num foguete de sondagem, assim chamado devido ao termo náutico "sondar", que significa investigar, explorar. Este tipo de foguetões é lançado para o espaço para breves pesquisas de alguns minutos antes de cair de volta à Terra. Mais acessíveis e rápidos de construir e voar do que missões com satélites maiores, são também um palco ideal para testar novas ideias e técnicas inovadoras.

Lançado a partir do Campo de Teste de Mísseis de White Sands, no estado norte-americano do Novo México, o foguete atingiu uma altitude de 274 km para uma visão do Sol acima da atmosfera da Terra, que de outra forma bloqueia certos comprimentos de onda da luz. Os cientistas voltaram-se para a "praia solar", a orla de uma "região ativa" do Sol onde a força do campo magnético era forte, ideal para os seus sensores.

Enquanto o CLASP2 observava o Sol, o IRIS (Interface Region Imaging Spectrograph) da NASA e o satélite Hinode da JAXA/NASA, ambos observando o Sol a partir de órbita terrestre, ajustaram os seus telescópios para olhar para o mesmo local. Em coordenação, as três missões concentraram-se na mesma parte do Sol, mas perscrutaram profundidades diferentes.

O Hinode focou-se na fotosfera, procurando linhas espectrais do ferro neutro aí formado. O CLASP2 visou três alturas diferentes dentro da cromosfera, examinando linhas espectrais do magnésio ionizado e do manganês. Entretanto, o IRIS media as linhas de magnésio em mais alta resolução, para calibrar os dados do CLASP2. Juntas, as missões monitorizaram quatro camadas diferentes dentro e ao redor da atmosfera.

Eventualmente, chegaram os resultados: o primeiro mapa a várias alturas do campo magnético da cromosfera.

"Quando Ryoko me mostrou estes resultados pela primeira vez, eu simplesmente não consegui ficar sentado," disse David McKenzie, investigador principal do CLASP2 no Centro de Voo Espacial Marshall da NASA em Huntsville, Alabama. "Eu sei que parece esotérico - mas acabou de me mostrar o campo magnético a quatro alturas ao mesmo tempo. Ninguém faz isso!"

O aspeto mais impressionante dos dados foi o quão variada a cromosfera acabou por ser. Tanto ao longo da porção do Sol que estudaram, quanto a diferentes alturas no seu interior, o campo magnético variou significativamente.

"Na superfície do Sol, vemos campos magnéticos que mudam a distâncias curtas: mais acima, essas variações são muito mais difusas. Em alguns lugares, o campo magnético não alcançou todo o caminho até ao ponto mais alto que medimos, enquanto noutros lugares, ainda estava com força total."

A equipa espera usar esta técnica para medições magnéticas a várias alturas para mapear todo o campo magnético da cromosfera. Isto não apenas ajudaria na nossa capacidade de prever o clima espacial, mas também nos forneceria informações importantes sobre a atmosfera em torno da nossa estrela.

"Sou física coronal - estou muito interessada nos campos magnéticos lá de cima," disse Rachmeler. "Ser capaz de elevar o nosso limite de medição ao topo da cromosfera ajudar-nos-ia a entender muito mais, ajudar-nos-ia a prever muito mais - seria um grande passo em frente na física solar."

Terão em breve a oportunidade de dar esse passo em frente: um novo voo da missão recebeu o sinal verde da NASA. Embora a data de lançamento ainda não tenha sido definida, a equipa planeia usar o mesmo instrumento, mas com uma nova técnica para medir uma faixa muito mais ampla do Sol.

"Em vez de apenas medirmos os campos magnéticos ao longo de uma faixa muito estreita, queremos examiná-lo ao longo do alvo e fazer um mapa bidimensional," disse McKenzie.

 

 


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A cromosfera está situada entre a fotosfera, ou a brilhante superfície do Sol que emite luz visível, e a coroa superaquecida, ou atmosfera externa do Sol, fonte de erupções solares. A cromosfera é um elo fundamental entre estas duas regiões e uma variável em falta na determinação da estrutura magnética do Sol.
Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA


A imagem em tons avermelhados, obtida pelo telescópio da SDO da NASA, mostra a região ativa simultaneamente observada pelo CLASP2 e pelo Hinode. As linhas verdes nos paineis à esquerda mostram a posição da ranhura vista pelo espectropolarímetro do CLASP2. A cada ponto desta linha, o CLASP2 mediu a variação de comprimentos de onda em termos de intensidade (painel superior direito) e a polarização circular (painel inferior direito) de várias linhas cromosféricas do espectro ultravioleta solar. Ao mesmo tempo, a polarização circular das linhas fotosféricas na gama espectral visível foi medida pelo telescópio espacial Hinode. Estes sinais de polarização circular surgem dos campos magnéticos presentes a diferentes alturas na atmosfera solar e, a partir daí, os investigadores conseguiram determinar como o campo magnético varia desde a fotosfera até à base da coroa.
Crédito: NAOJ, IAC, NASA/MSFC, IAS


Componente longitudinal do campo magnético (em gauss) a cada ponto ao longo da direção espacial indicada pela linha verde na imagem acima. Os campos magnéticos mais fortes e mais fracos podem ser encontrados na fotosfera (curva verde), onde existem regiões fortemente magnetizadas (até 1250 gauss) separadas por outras que são fracamente magnetizadas (10 gauss). Esta variação substancial na intensidade do campo magnético quando movendo-se horizontalmente na fotosfera diminui a altitudes correspondentes à cromosfera inferior (símbolos azuis) e até mais baixas nas camadas intermédias (símbolos pretos) e superiores (símbolos vermelhos) da cromosfera. Estes resultados confirmam e provam que, em tais regiões ativas da atmosfera solar, a força do campo magnético diminui com a altitude e que as linhas da força do campo magnético expandem-se e preenchem toda a cromosfera antes de alcançar a base da coroa.
Crédito: NAOJ, IAC, NASA/MSFC, IAS


// NASA (comunicado de imprensa)
// JAXA (comunicado de imprensa)
// NAOJ (comunicado de imprensa)
// IAC (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Science Advances)
// Primeiros resultados do CLASP2 (IAC via YouTube)

Saiba mais

Notícias relacionadas:
EurekAlert!
New Scientist
Space Daily
PHYSORG

Sol:
CCVAlg - Astronomia
Wikipedia
Cromosfera (Wikipedia)
Atividade magnética do Sol (Wikipedia)
"Praia" solar (Wikipedia)

CLASP2:
NAOJ

IRIS:
NASA
Wikipedia

Hinode:
JAXA
Wikipedia

 
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