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PERDA DE ÁGUA DE MARTE ESCULPIDA PELAS ESTAÇÕES E PELAS TEMPESTADES
26 de março de 2021

 


Infografia da perda de água marciana para o espaço ao longo da sua órbita em torno do Sol.
Crédito: ESA; dados: A. Fedorova et al. (2021)

 

Marte perdeu a maior parte da sua antes abundante água, com pequenas quantidades remanescentes na atmosfera do planeta. A sonda Mars Express da ESA revela agora mais sobre para onde essa água foi, mostrando que a sua fuga para o espaço é acelerada por tempestades de poeira e pela proximidade do planeta ao Sol, e sugerindo que alguma água pode ter recuado para o subsolo.

Embora árido hoje, Marte provavelmente já foi um mundo coberto de água como o nosso. As evidências disso podem ser vistas em vastos canais de escoamento formados por inundações, vales de rios e deltas esculpidos na superfície do planeta, bem como em observações de radar de reservatórios de água líquida presos sob o gelo e poeira no polo sul de Marte.

A água agora só pode existir em Marte na forma de gelo ou gás devido à baixa pressão atmosférica do planeta, que é menos de 1% da da Terra. Marte perdeu grande parte da sua água anterior para o espaço nos últimos milhares de milhões de anos e ainda hoje escapa da sua atmosfera.

Dois novos estudos, liderados por Anna Fedorova do IKI (Institut Kosmicheskikh Issledovaniy) da Academia Russa de Ciências e Jean-Yves Chaufray do Laboratório LATMOS (Laboratoire Atmospheres Observations Spatiales), na França, esclarecem agora como a água se move através e deixa a atmosfera de Marte. Eles revelam que este processo é afetado pela distância do planeta ao Sol e pelas mudanças no seu clima e na sua meteorologia, incluindo as enormes tempestades globais de poeira vistas frequentemente no Planeta Vermelho.

Ambos os estudos usaram conjuntos extensos de dados obtidos durante vários anos pelo instrumento SPICAM (Spectroscopy for the Investigation of the Characteristics of the Atmosphere of Mars).

"A atmosfera é o elo entre a superfície e o espaço e, portanto, tem muito a dizer-nos sobre como Marte perdeu a sua água," diz Anna. "Nós estudámos o vapor de água na atmosfera desde o solo até 100 km de altitude, uma região que ainda não havia sido explorada, ao longo de oito anos marcianos."

Anna e os seus colegas descobriram que o vapor de água permaneceu confinado a menos de 60 km quando Marte estava longe do Sol, mas que se estendeu até 90 km de altitude quando Marte estava mais próximo do Sol. Numa órbita completa, a distância entre o Sol e o Planeta Vermelho varia de 207 a 249 milhões de quilómetros.

Perto do Sol, as temperaturas mais quentes e a circulação mais intensa na atmosfera impediram que a água congelasse a uma determinada altitude. "Então, a atmosfera superior fica umedecida e saturada de água, explicando porque as taxas de escape de água aumentam durante esta estação - a água é transportada para mais alto, ajudando à sua fuga para o espaço," acrescenta Anna.

Nos anos em que Marte teve uma tempestade global de poeira, a atmosfera superior tornou-se ainda mais húmida, acumulando água em excesso a altitudes superiores a 80 km.

"Isto confirma que as tempestades de poeira, que são conhecidas por aquecer e perturbar a atmosfera de Marte, também levam água a grandes altitudes," diz Anna. "Graças ao monitoramento contínuo da Mars Express, fomos capazes de analisar as duas últimas tempestades globais de poeira, em 2007 e 2018, e comparar o que descobrimos em anos sem tempestades para identificar como as tempestades afetaram a fuga de água marciana."

Este achado é apoiado por investigações lideradas por Jean-Yves, que modelou a densidade dos átomos de hidrogénio na atmosfera superior de Marte ao longo de dois anos e explorou como isso está relacionado com o escape da água.

"Comparámos os nossos resultados com os dados do SPICAM e encontrámos uma boa concordância - exceto durante a estação empoeirada, quando o nosso modelo subestimou a quantidade de hidrogénio presente," realça Jean-Yves. "Muito mais água escapa pela atmosfera durante condições perturbadas do que o modelo previu."

Ao longo de dois anos marcianos, um dos quais teve uma tempestade de poeira, Jean-Yves e colegas estimaram que a taxa de perda de água variou por um fator de cerca de 100, destacando o efeito significativo que as tempestades de poeira podem ter nos ritmos de perda de água em Marte.

As descobertas mostram que Marte perde o equivalente a uma camada global de água com dois metros de profundidade a cada mil milhões de anos. No entanto, mesmo acumulada ao longo da história de 4 mil milhões de anos de Marte, esta quantidade é insuficiente para explicar para onde foi toda a água de Marte.

"Deve ter existido uma quantidade significativa de água no planeta para explicar as características que vemos," diz Jean-Yves. "Como nem toda foi perdida para o espaço, os nossos resultados sugerem que ou esta água se moveu para o subsolo ou que as taxas de escape de água eram muito mais altas no passado."

Os resultados de Anna, Jean-Yves e colegas complementam as recentes descobertas da ExoMars TGO (Trace Gas Orbiter) da ESA-Roscosmos, que desde 2018 e juntamente com a Mars Express, monitorizou a distribuição de água por altitude na atmosfera de Marte. Estas descobertas sugerem que o ritmo de perda de água marciana pode estar ligado a mudanças sazonais.

O trabalho da Mars Express para determinar a perda de água em Marte também é apoiado pela missão MAVEN (Mars Atmosphere and Volatile Evolution) da NASA, que mede sistematicamente a composição química da atmosfera marciana (especificamente, os níveis de hidrogénio atómico e deutério, um isótopo pesado do hidrogénio). Estes dados multimissão vão ajudar a restringir não apenas como a água está a comportar-se atualmente, como também a perda cumulativa de água ao longo da história marciana - vital para descobrir se a água de Marte foi para o subsolo ou para o espaço.

"Dois temas principais na nossa exploração contínua de Marte são a evolução do planeta e a perda de água, e o papel das tempestades de poeira na formação do clima e da atmosfera marciana," diz Dmitrij Titov, cientita do projeto Mars Express da ESA.

"Estas descobertas ajudam-nos a entender os processos a longo termo por trás da perda de água marciana e a pintar uma imagem não apenas da sua climatologia atual, mas de como o seu clima mudou ao longo da história. Para tais estudos, precisamos do tipo de conjuntos de dados de alta qualidade fornecidos pelo SPICAM e também pelos instrumentos a bordo da ExoMars TGO. Juntas, estas e outras missões avançadas vão continuar a desvendar os mistérios de Marte."

A Mars Express foi lançada no dia 2 de junho de 2003, e há mais de 17 anos que está em órbita de Marte a monitorizar cuidadosamente as propriedades da atmosfera do planeta.

 


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Impressão de artista da sonda Mars Express. O plano de fundo é baseado numa imagem real de Marte captada pela câmara de alta-resolução do orbitador.
Crédito: imagem da sonda - ESA/ATG medialab; Marte - ESA/DLR/FU Berlin


Imagem obtida pela Mars Express que mostra a impressionante frente de nuvens de poeira - parte direita da imagem - perto da calote polar norte de Marte em abril de 2018.
Crédito: ESA/DLR/FU Berlin


// ESA (comunicado de imprensa)
// Artigo científico #1 (Journal of Geophysical Research: Planets)
// Artigo científico #2 (Icarus)

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Mars Express:
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MAVEN:
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