O rover Curiosity da NASA capturou estas nuvens logo após o pôr-do-sol de 19 de março de 2021, o 3063.º dia marciano, ou sol, da sua missão. O mosaico é constituído por 21 exposições individuais "costuradas" e corrigidas em termos de cor, para fazer com que a cena apareça como apareceria ao olho humano.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/MSSS
Depois de analisarem amostras de rochas em pó recolhidas da superfície de Marte pelo rover Curiosity da NASA, os cientistas anunciaram que várias das amostras são ricas num tipo de carbono que na Terra está associado a processos biológicos.
Embora a descoberta seja intrigante, não aponta necessariamente para vida antiga em Marte, uma vez que os cientistas ainda não encontraram evidências conclusivas que sustentem biologia antiga ou atual, tais como formações rochosas sedimentares produzidas por bactérias antigas, ou uma diversidade de moléculas orgânicas complexas formadas pela vida.
"Estamos a encontrar coisas em Marte que são tentadoramente interessantes, mas precisaríamos realmente de mais evidências para dizer que identificámos vida," disse Paul Mahaffy, que foi investigador principal do laboratório químico SAM (Sample Analysis at Mars), a bordo do Curiosity, até se reformar do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland, em dezembro de 2021. "Portanto, estamos a estudar o que mais poderia ter provocado a assinatura de carbono que estamos a ver, se não a vida."
Num artigo sobre os achados, publicado dia 18 de janeiro na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, os cientistas do Curiosity fornecem várias explicações para os sinais invulgares de carbono que detetaram. As suas hipóteses são em parte retiradas de assinaturas de carbono na Terra, mas os cientistas advertem que os dois planetas são tão diferentes que não podem tirar conclusões definitivas com base em exemplos da Terra.
"O mais difícil é pôr de lado a Terra, pôr de lado aquele viés que temos e tentar realmente debruçarmo-nos sobre os fundamentos da química, física e processos ambientes em Marte," disse a astrobióloga de Goddard, Jennifer L. Eigenbrode, que participou no estudo do carbono. Anteriormente, Eigenbrode liderou uma equipa internacional de cientistas do Curiosity na deteção de uma miríade de moléculas orgânicas - aquelas que contêm carbono - na superfície marciana.
"Precisamos de abrir as nossas mentes e pensar fora da caixa," disse Eigenbrode, "e é isso que este artigo faz."
A explicação biológica que os cientistas do Curiosity apresentam no seu artigo científico é inspirada pela vida terrestre. Envolve bactérias antigas na superfície, que teriam produzido uma assinatura única de carbono ao libertarem metano para a atmosfera, onde a luz ultravioleta teria convertido esse gás em moléculas maiores e mais complexas. Estas novas moléculas teriam "chovido" até à superfície e agora poderiam ser preservadas com a sua assinatura distinta de carbono nas rochas marcianas.
Duas outras hipóteses oferecem explicações não-biológicas. Uma sugere que a assinatura de carbono poderia ter resultado da interação da luz ultravioleta com o gás dióxido de carbono na atmosfera marciana, produzindo novas moléculas contendo carbono que se teriam fixado à superfície. E a outra especula que o carbono poderia ter sido deixado para trás por um raro evento há centenas de milhões de anos, quando o Sistema Solar passou por uma nuvem molecular gigante rica no tipo de carbono detetado.
"Todas as três explicações encaixam nos dados," disse Christopher House, cientista do Curiosity na Universidade Penn State que liderou o estudo do carbono. "Precisamos simplesmente de mais dados para as confirmar ou excluir."
Para analisar o carbono à superfície marciana, a equipa de House usou o instrumento TLS (Tunable Laser Spectrometer) dentro do laboratório SAM. O SAM aqueceu 24 amostras de locais geologicamente diversos na cratera Gale do planeta a cerca de 850º C, para libertar os gases no seu interior. Em seguida, o TLS mediu os isótopos de algum do carbono reduzido que foi libertado no processo de aquecimento. Os isótopos são átomos de um elemento com massas diferentes devido ao seu número distinto de neutrões, e são instrumentais para a compreensão da evolução química e biológica dos planetas.
O carbono é particularmente importante uma vez que este elemento se encontra em toda a vida na Terra; flui continuamente através do ar, água e solo, num ciclo que é bem compreendido graças às medições isotópicas.
Por exemplo, os seres vivos na Terra utilizam o mais leve e pequeno átomo de carbono-12 para metabolizar os alimentos ou para a fotossíntese, vs. o mais pesado átomo de carbono-13. Assim, significativamente mais carbono-12 do que carbono-13 em rochas antigas, juntamente com outras evidências, sugere aos cientistas que estão a olhar para assinaturas de química relacionada com a vida. Olhar para a proporção destes dois isótopos de carbono ajuda os cientistas a discernir que tipo de vida estão a estudar e em que ambiente essa vida existiu.
Em Marte, os investigadores do Curiosity descobriram que metade das suas amostras tinham quantidades surpreendentemente grandes de carbono-12 em comparação com o que os cientistas mediram na atmosfera e em meteoritos marcianos. Segundo os investigadores, estas amostras provinham de cinco locais distintos na cratera Gale, o que pode estar relacionado com o facto de todos os locais terem superfícies antigas e bem preservadas.
"Na Terra, os processos que produziriam o sinal de carbono que estamos a detetar em Marte são biológicos," disse House. "Temos de compreender se a mesma explicação funciona para Marte, ou se existem outras explicações, porque Marte é muito diferente."
Marte é único porque pode ter começado com uma mistura diferente de isótopos de carbono do que a Terra há 4,5 mil milhões de anos. Marte é mais pequeno, mais frio, tem uma gravidade mais fraca e gases diferentes na sua atmosfera. Além disso, o carbono em Marte poderia estar a circular sem qualquer vida envolvida.
"Há um enorme pedaço do ciclo de carbono na Terra que envolve vida e, por causa da vida, há um pedaço do ciclo de carbono na Terra que não conseguimos compreender, porque para onde quer que olhemos há vida", disse Andrew Steele, cientista do Curiosity situado no Instituto Carnegie para Ciência em Washington, DC.
Steele notou que os cientistas estão nas fases iniciais de compreender como os ciclos de carbono em Marte funcionam e, portanto, de como interpretar os rácios isotópicos e as atividades não-biológicas que poderiam levar estas proporções. O Curiosity, que chegou ao Planeta Vermelho em 2012, é o primeiro rover com ferramentas para estudar os isótopos de carbono à superfície. Outras missões recolheram informações sobre assinaturas isotópicas na atmosfera, e os cientistas mediram rácios de meteoritos marcianos que foram recolhidos na Terra.
"A definição do ciclo de carbono em Marte é absolutamente fundamental para tentar compreender como a vida poderia caber nesse ciclo," disse Steele. "Fizemos isso com bastante sucesso na Terra, mas estamos apenas a começar a definir esse ciclo para Marte."
Os cientistas do Curiosity vão continuar a medir isótopos de carbono para ver se obtêm uma assinatura semelhante quando o rover visitar outros locais suspeitos de terem superfícies antigas bem preservadas. Para testar ainda mais a hipótese biológica envolvendo microrganismos produtores de metano, a equipa do Curiosity gostaria de analisar o conteúdo de carbono de uma pluma de metano libertada da superfície. O rover encontrou inesperadamente uma tal pluma em 2019, mas não há forma de prever se isso irá acontecer novamente. Caso contrário, os investigadores salientam que este estudo fornece orientação à equipa que está por detrás do rover Perseverance da NASA sobre os melhores tipos de amostras a recolher para confirmar a assinatura de carbono e assim determinar definitivamente se esta provém ou não de vida. O Perseverance está a recolher amostras da superfície marciana para um possível envio futuro para a Terra.
|
|
Esta imagem mostra o buraco perfurado chamado "Highfield" feito pelo rover Curiosity da NASA ao recolher uma amostra na área Vera Rubin na cratera Gale em Marte. O pó feito pela broca, neste buraco, está enriquecido de carbono-12. A imagem foi obtida pelo MAHLI (Mars Hand Lens Imager) no 2247.º dia marciano, ou sol, da missão.
Crédito: NASA/Caltech-JPL/MSSS
Este mosaico foi feito a partir de imagens tiradas pela Mast Camera a bordo do rover Curiosity da NASA no 2729.º dia marciano, ou sol, da missão. Mostra a paisagem da formação de arenito Stimson na cratera Gale. Neste local, o Curiosity perfurou o furo "Edinburgh", uma amostra do qual foi enriquecida de carbono-12.
Crédito: NASA/Caltech-JPL/MSSS
// NASA (comunicado de imprensa)
// PennState (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (PNAS)
// Artigo científico (PDF)
Saiba mais
Notícias relacionadas:
Science
SPACE.com
Astrobiology web
ScienceDaily
PHYSORG
science alert
Smithsonian
CNN
Marte:
CCVAlg - Astronomia
Wikipedia
Cratera Gale:
Wikipedia
Monte Sharp (Wikipedia)
Rover Curiosity (MSL):
NASA
NASA - 2
Facebook
Twitter
Wikipedia
Rover Perseverance:
NASA
NASA - 2
Facebook
Twitter
Wikipedia |