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GÁS QUENTE NO ESPAÇO IMITA VIDA
15 de Agosto de 2007
 

Poderá a vida extraterrestre existir sob a forma de partículas de poeira? De acordo com novas simulações computacionais, partículas de pó interestelar carregadas electricamente organizam-se em duplas hélices tal como o ADN, e demonstram propriedades normalmente atribuídas a sistemas vivos, tal como a evolução e a reprodução.

Mas os cientistas estão hesitantes em dizer que as partículas de poeiras estão "vivas", e ao invés dizem que são apenas mais um exemplo de como é difícil definir o termo «vida».

O novo modelo computacional, detalhado na edição de 14 de Agosto do New Journal of Physics, mostra o que acontece a partículas microscópicas de poeira quando injectadas para o plasma.

O plasma é o quarto estado de matéria (os restantes três são: o sólido, o líquido e o gasoso). Embora pouco familiar para a maioria das pessoas, o plasma é a fase de matéria mais comum no Universo. Está em todo o lado: as estrelas são bolas luminosas de plasma, e o plasma difuso invade o espaço entre as estrelas. O plasma forma-se quando o gás se torna tão quente que aos electrões são retirados os seus núcleos atómicos, deixando para trás uma sopa de partículas carregadas.

Estudos anteriores aqui na Terra mostraram que se suficientes partículas forem injectadas para um plasma de baixa temperatura, estas irão espontaneamente organizar-se em estruturas cristalinas.

As novas simulações computacionais sugerem que no ambiente livre de gravidade do espaço, as partículas de plasma se aglomeram para formar filamentos tipo-corda que se torcem em formas espirais. Os cordões helicoidais assemelham-se a ADN, estão também carregados electricamente e são atraídos uns pelos outros.

E, tal como o ADN, estas espirais de poeira podem armazenar informação. Fazem-no através da armação dos seus corpos, pois têm dois estados estáveis - um com um grande diâmetro e outro com um mais pequeno - e sendo assim a espiral poderia carregar uma série de largas e finas secções.

As partículas de plasma modeladas informaticamente podem também ser divididas para formar duas cópias da estrutura original e até "evoluir" em estruturas mais estáveis, capazes de sobreviver melhor no plasma.

As espirais, de certo modo, até se alimentam, pois necessitam de plasma para sobreviver e crescer, sugerindo que possam competir por alimento. E dado que se conseguem reproduzir, então talvez consigam evoluir em estruturas mais complexas.

"Estas complexas e auto-organizadas estruturas plasmáticas exibem todas as propriedades necessárias para qualificá-las como candidatas a matéria viva inorgânica," disse o membro da equipa de estudo V. N. Tsytovich da Academia de Ciência Russa.

"É interessante," diz o astrobiólogo Chris McKay do Centro de Pesquisa Ames da NASA em Moffett Field, Califórnia. "Algumas pessoas dizem que a vida é um sistema auto-organizado [que está sem equilíbrio], mas também podemos dizer o mesmo de um furacão. O que estes cientistas fizeram está um nível acima do apontar para um furacão e dizer que é um organismo vivo. Acreditam que existe uma maneira de guardarem informação, que é uma característica central da vida. Mas é uma espécie de desilusão, pois isto é tudo apenas trabalho teórico."

"Dizer que algo está (ou não) vivo é quase inútil porque não existe nenhuma definição matematicamente rigorosa do que é a vida," concorda David Grier da Universidade de Nova Iorque.

O colega de Tsytovich e também membro da equipa de estudo, Gregor Morfill do Instituto Max Planck para Física Extraterrestre em Garching, Alemanha, hesita em dizer que as partículas de plasma estão vivas.

"Talvez seja uma questão de educação," disse Morfill. "Hesito em chamar-lhe de vida. A razão para a publicação deste artigo não é porque queríamos sugerir que isto poderia evoluír para vida, mas porque queríamos começar a discussão... uma vez mais, do que exactamente queremos dizer com 'vida'."

Seth Shostak, astrónomo sénior do Instituto SETI em Mountain View, Califórnia, é também cauteloso em dizer que as partículas estão vivas. "Os factos são: não temos ainda uma boa definição do que é realmente 'vida'," disse Shostak.

Shostak realça que embora a maioria dos manuais escolares inclua como requisitos para a vida a capacidade de se metabolizar e se reproduzir, é fácil pensar em coisas que quebram estas regras. O fogo, por exemplo, reproduz-se e metaboliza-se, mas as pessoas não dizem que está vivo; e as mulas, que estão claramente vivas, não se conseguem reproduzir.

"Ainda não conseguimos explicar o que significa exactamente estar vivo, e isso significa que essas moléculas complexas estão num 'limbo' entre o que é vivo e o que está meramente reagindo," adicionou Shostak.

A equipa está agora a construír uma experiência para descobrir realmente se as espirais de poeira existem. É complicado, pois a gravidade tenderá a perturbar a delicada estrutura, mas isto poderá ser contornado até um certo ponto comprimindo o plasma de poeiras, aumentando assim as forças eléctricas. Para ir bem mais além, terão que descobrir outro método de contrariar a gravidade - talvez usando campos magnéticos, ou pondo a experiência em queda-livre a bordo da Estação Espacial Internacional.

Vivas ou não, estas estruturas podem existir na Natureza. Existem muitos locais no espaço onde os pequenos grãos de material estão embebidos no plasma. "No nosso Sistema Solar, os lugares que possam ter as condições ideais são os anéis planetários, especialmente os anéis de Saturno e de Urano. Aí, a "poeira" seria na realidade finos grãos de gelo, e o plasma seria fornecido pelo vento solar, canalizado pelos campos magnéticos dos planetas. Mas as espirais poderão ser difíceis de se formar no espaço, pois requerem grãos de forma e tamanho uniformes. É difícil imaginar isto acontecer no espaço numa escala grande o suficiente para ser observável.

Se as partículas fossem, de facto, consideradas como "vivas", disse Shostak, revolucionaria completamente outra suposição comum acerca da vida.

"Sempre assumimos que a vida era um fenómeno planetário. Apenas em planetas é que temos os líquidos que pensamos serem necessários para a química da vida," disse. "Por isso, se conseguíssemos ter vida nos gases quentes de uma estrela, ou nos quentes gases interestelares que preenchem o espaço entre as estrelas, bem, não só isso seria 'vida como a não conhecemos', mas também poderia ser o tipo de vida mais comum do Universo."

Links:

Links relacionados:
Artigo científico do New Journal of Physics (formato PDF)
Artigo científico do New Journal of Physics (formato HTML)
Experiência de cristais de plasma, Instituto Max Planck para Física Extraterrestre

Plasma:
Wikipedia

 


Os relâmpagos são bons exemplos de plasma presente na Terra. Tipicamente, um relâmpago descarrega 30,000 amperes, a quase 100 milhões de volts, e emite luz, ondas de rádio, raios-X e até raios-gama. As temperaturas do plasma nos relâmpagos podem chegar aos 28,000 K e as densidades dos electrões podem ultrapassar 10^24/m^3.
Crédito: Wikipedia
(clique na imagem para ver versão maior)


Os cristais de plasma que se comportam como vida poderão existir nos anéis de Saturno, onde a 'poeira' seria na verdade finos grãos de gelo, e o plasma seria fornecido pelo vento solar.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute

(clique na imagem para ver versão maior)
 
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