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MUNDO GELADO DESCOBERTO EM SISTEMA BINÁRIO
8 de Julho de 2014

 

Um planeta recém-descoberto num sistema binário, localizado a 3000 anos-luz da Terra, está a alargar as noções dos astrónomos de onde planetas parecidos com a Terra - e até mesmo potencialmente habitáveis - podem formar-se, e de como podem encontrá-los.

Com duas vezes a massa da Terra, o planeta orbita uma das estrelas do binário quase à mesma distância que a Terra orbita o Sol. No entanto, dado que a estrela-mãe do planeta é muito mais ténue que o nosso Sol, o planeta é muito mais frio que a Terra - na verdade, um pouco mais frio que a lua gelada de Júpiter, Europa.

Quatro equipas internacionais de pesquisa, lideradas pelo professor Andrew Gould da Universidade Estatal do Ohio, publicaram a sua descoberta na edição de 4 de Julho da revista Science.

O estudo fornece a primeira evidência de que os planetas terrestres podem formar-se em órbitas parecidas à da Terra, mesmo num sistema binário onde as estrelas não estão muito distantes uma da outra. Embora o planeta propriamente dito seja demasiado frio para ser habitável, o mesmo planeta mas orbitando uma estrela tipo-Sol num sistema binário estaria na chamada "zona habitável", a região onde as condições podem ser favoráveis à vida.

"Isto alarga e muito as potenciais localizações para a descoberta de planetas habitáveis no futuro," afirma Scott Gaudi, professor de astronomia da mesma universidade. "Metade das estrelas na Galáxia encontram-se em sistemas binários. Não fazíamos ideia que planetas parecidos com a Terra, em órbitas semelhantes à da Terra, podiam formar-se nestes sistemas."

Muito raramente, a gravidade de uma estrela foca a luz de uma estrela ainda mais distante e amplia-a como uma lente. Ainda mais raramente, a assinatura de um planeta aparece dentro de um sinal de luz ampliado. A técnica que os astrónomos usam para encontrar estes planetas é chamada microlente gravitacional, e as simulações computacionais destes eventos já são complicadas quando apenas uma estrela e o seu planeta agem como lente, quanto mais duas estrelas.

Quando os astrónomos conseguiram detectar este novo planeta, foram capazes de documentar que produziu duas assinaturas separadas - a primária, que usam normalmente para detectar planetas, e uma secundária que previamente apenas se supunha existir. A procura de planetas em sistemas binários é complexa para a maioria dos métodos de detecção, porque a luz da segunda estrela complica a interpretação dos dados. "Mas nas microlentes gravitacionais," explica Gould, "nós nem sequer olhamos para a luz do sistema estrela-planeta. Apenas observamos como a sua gravidade afecta a luz de uma estrela mais distante, sem relação. Isto dá-nos uma nova ferramenta para a procura de planetas em sistemas duplos."

A primeira assinatura foi uma breve diminuição da luz, à medida que a gravidade do planeta interrompia uma das imagens ampliadas da fonte estelar. Mas o segundo efeito foi uma distorção geral do sinal de luz.

"Mesmo que não tivéssemos visto a assinatura inicial do planeta, conseguíamos detectá-lo à mesma apenas graças à distorção," comenta Gould ao apontar para um gráfico do sinal de luz. "O efeito não é óbvio. Não pode ser visto a olho nu, mas o sinal é inconfundível na modelagem computacional."

Gaudi explicou as implicações.

"Agora que sabemos que com microlentes gravitacionais, conseguimos inferir a existência de um planeta - e saber a sua massa e distância da estrela - sem detectar directamente a diminuição de brilho devido ao planeta," afirma. "Nós pensávamos que, em princípio, conseguíamos fazê-lo, mas agora que temos evidências empíricas, podemos usar este método para, no futuro, encontrar mais planetas."

A natureza destas distorções ainda é um pouco misteriosa, admite.

"Nós não temos uma compreensão intuitiva da razão pela qual funciona. Temos uma ideia, mas neste momento, penso que seria justo dizer que está na fronteira do nosso trabalho teórico."

O planeta, chamado OGLE-2013-BLG-0341LBb, apareceu pela primeira vez como um "mergulho" na linha de rastreamento do brilho obtida pelo telescópio OGLE (Optical Gravitational Lensing Experiment) a 11 de Abril de 2013. O planeta perturbou brevemente uma das imagens da estrela que orbita à medida que o sistema passava em frente de uma estrela muito mais distante a 20.000 anos-luz de distância na direcção da constelação de Sagitário.

"Antes do mergulho, este era apenas mais um evento de microlente," afirma Gould. Foi um de aproximadamente 2000 descobertos cada ano pelo OGLE, com a sua nova câmara de grande formato que monitoriza 100 milhões de estrelas muitas vezes por noite à procura de tais eventos.

"Esta descoberta foi possível graças ao novo levantamento OGLE-IV," acrescenta. "Tivemos meia-dúzia de medições desta diminuição de brilho e acertámos em cheio." Pela forma do mergulho, cujas "asas" foram rastreadas em dados do MOA (Microlensing Observations in Astrophysics), conseguimos ver que a fonte dirigia-se directamente para a estrela central.

Durante duas semanas, e a partir de telescópios no Chile, Nova Zelândia, Israel e Austrália, os astrónomos observaram que a luz ampliada continuava a aumentar. As equipas incluem o OGLE, MOA, MicroFUN (Microlensing Follow Up Network) e o Observatório Wise.

Mesmo assim, ainda não sabiam que a estrela-mãe do planeta tinha outra companheira - uma segunda estrela bloqueada em órbita. Mas porque já estavam atentos ao sinal, os astrónomos notaram quando a companheira binária provocou inesperadamente uma grande erupção de luz chamada travessia cáustica.

Quando se aperceberam que a lente não era apenas uma estrela, mas duas, já tinham capturado uma quantidade considerável de dados - e feito uma descoberta surpreendente: a distorção.

Semanas depois de todos os sinais do planeta terem-se dissipado, a luz da travessia cáustica da lente binária tornou-se distorcida, como se houvesse uma espécie de eco do sinal original do planeta.

Uma análise intensiva de computador, levada a cabo pelo professor Cheongho Han da Universidade Nacional de Chungbuk na Coreia do Sul, revelou que a distorção continha informação acerca do planeta - a sua massa, separação da sua estrela e orientação - e que essa informação coincidia perfeitamente com o que os astrónomos viram durante a sua observação directa da diminuição de luz devido ao planeta. Por isso, a mesma informação pode ser capturada apenas da distorção.

Esta análise detalhada mostra que o planeta tem duas vezes a massa da Terra e orbita a sua estrela a uma distância parecida à distância Terra-Sol, quase 150 milhões de quilómetros. Mas a sua estrela é 400 vezes mais fraca que o nosso Sol, por isso o planeta é muito frio (ronda os -213º Celsius), mais frio que a lua de Júpiter, Europa. A segunda estrela no sistema está (relativamente à companheira) à mesma distância que Saturno está do Sol. Esta é também muito ténue.

Mesmo assim, os astrónomos dizem que os sistemas binários compostos por estrelas fracas como estas são o tipo mais comum de sistema estelar na nossa Galáxia. Portanto, esta descoberta sugere que podem haver muito mais planetas terrestres por aí - alguns possivelmente mais quentes, e possivelmente habitáveis.

Já foram descobertos outros três planetas em sistemas binários com separações parecidas, mas usando uma técnica diferente. Este é o primeiro parecido com a Terra que segue uma órbita idêntica à da Terra, e a sua descoberta dentro de uma estrela dupla graças a microlentes gravitacionais foi por mero acaso.

"Normalmente, quando vemos que temos um binário, paramos de observar. A única razão porque obtivemos observações tão intensivas deste binário é que já sabíamos que aí existia um planeta," afirma Gould. "No futuro, vamos mudar a nossa estratégia."

Em particular, Gould destacou o trabalho do astrónomo amador e colaborador frequente, Ian Porritt, de Palmerston North, Nova Zelândia, que aguardou aberturas nas nuvens durante a noite de 24 de Abril para obter as primeiras medições críticas do salto no sinal de luz que revelou que o planeta se encontrava num sistema binário. Outros seis amadores da Nova Zelândia e da Austrália também contribuíram para a descoberta.

Links:

Notícias relacionadas:
Universidade Estatal do Ohio (comunicado de imprensa)
NASA (comunicado de imprensa)
Artigo científico (formato PDF)
Science (requer subscrição)
PHYSORG
SPACE.com
NewScientist
redOrbit
EarthSky
io9
AstroPT

OGLE-2013-BLG-0341LBb:
Exoplanet.eu

Planetas extrasolares:
Wikipedia
Lista de planetas confirmados (Wikipedia)
Lista de planetas não confirmados (Wikipedia)
Lista de exoplanetas potencialmente habitáveis (Wikipedia)
Lista de extremos (Wikipedia)
Open Exoplanet Catalogue
PlanetQuest
Enciclopédia dos Planetas Extrasolares
Exosolar.net

Microlentes gravitacionais:
Wikipedia

Sistemas binários:
Wikipedia

OGLE:
Página oficial
Wikipedia

MOA:
Página oficial
Wikipedia


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Impressão de artista que mostra o recém-descoberto planeta (direita) em órbita de uma estrela pertencente a um sistema binário.
Crédito: Cheongho Han, Universidade Nacional de Chungbuk, República da Coreia
(clique na imagem para ver versão maior)

 
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