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ASTRÓNOMOS OBTÊM PRIMEIRA IMAGEM DE UM BURACO NEGRO
12 de abril de 2019

 


Usando o EHT, os cientistas obtiveram uma imagem do buraco negro no centro da galáxia M87, delineado pela emissão de gás quente em seu redor sob a influência de forte gravidade perto do horizonte de eventos.
Crédito: Colaboração EHT

 

O EHT (Event Horizon Telescope) — uma rede à escala planetária de oito radiotelescópios colocados no solo, formada através de colaboração internacional — foi concebido para capturar imagens de um buraco negro. Na passada quarta-feira, em conferências de imprensa coordenadas em todo o mundo, os investigadores do EHT revelaram que foram bem-sucedidos, mostrando a primeira evidência visual direta de um buraco negro supermassivo e da sua sombra.

Este resultado pioneiro foi anunciado numa série de seis artigos científicos publicados num número especial da revista da especialidade The Astrophysical Journal Letters. A imagem revela o buraco negro situado no centro de Messier 87, uma galáxia massiva localizada no enxame galáctico de Virgem (a sombra de um buraco negro é o mais próximo da imagem do buraco negro propriamente dito que conseguimos obter, já que este é um objeto completamente escuro do qual a luz não pode escapar. A fronteira do buraco negro — o horizonte de eventos que dá o nome ao EHT — é cerca de 2,5 vezes mais pequena que a sombra que projeta e mede menos de 40 mil milhões de km de um lado ao outro). Este buraco negro reside a 55 milhões de anos-luz de distância da Terra e possui uma massa de 6,5 mil milhões de vezes a do Sol.

Os buracos negros supermassivos são objetos astronómicos relativamente pequenos — o que faz com que até agora tenham sido impossíveis de observar diretamente. Como o tamanho do horizonte de eventos de um buraco negro é proporcional à sua massa, quanto mais massivo for o buraco negro, maior será a sua sombra. Graças à sua enorme massa e relativa proximidade, previu-se que o buraco negro de M87 fosse um dos maiores visto a partir da Terra — o que o tornou num excelente alvo para o EHT.

O EHT liga telescópios situados em todo o globo, formando um telescópio virtual do tamanho da Terra sem precedentes. O EHT proporciona aos astrónomos uma nova maneira de estudarem os objetos mais extremos do Universo previstos pela relatividade geral de Einstein durante o ano centenário da experiência histórica que confirmou esta teoria pela primeira vez.

Apesar dos telescópios não estarem fisicamente ligados, foi possível sincronizar os dados recolhidos com relógios atómicos — masers de hidrogénio — que dão o tempo preciso das observações. Estas observações foram obtidas a um comprimento de onda de 1,3 mm durante uma campanha global em 2017. Cada telescópio do EHT produziu enormes quantidades de dados — cerca de 350 terabytes por dia — os quais foram armazenados em discos de hélio de elevado desempenho. Estes dados foram depois combinados em supercomputadores altamente especializados — chamados correladores — existentes no Instituto Max Planck de Rádio Astronomia e no Observatório Haystack do MIT. Foram seguidamente convertidos numa imagem usando ferramentas computacionais inovadoras, desenvolvidas pela colaboração.

"Tirámos a primeira fotografia de um buraco negro," disse o diretor do projeto EHT, Sheperd S. Doeleman do Center for Astrophysics | Harvard & Smithsonian, EUA. "Trata-se de um feito científico extraordinário levado a cabo por uma equipa de mais de 200 investigadores."

Os buracos negros são objetos cósmicos extraordinários com massas enormes e tamanhos extremamente compactos. A presença destes objetos afeta o meio onde estão inseridos de maneira extrema, deformando o espaço-tempo e superaquecendo o material que os rodeia.

"Se estiverem imersos numa região brilhante, como um disco de gás brilhante, pensamos que o buraco negro crie uma região escura semelhante a uma sombra — algo previsto pela relatividade geral de Einstein que nunca foi observado anteriormente," explica o Presidente do Conselho Científico do EHT, Heino Falcke da Universidade Radboud, na Holanda. "Esta sombra, causada pela curvatura gravitacional e captura da luz no horizonte de eventos, revela-nos muito sobre a natureza destes fascinantes objetos e permite-nos medir a enorme massa do buraco negro de M87."

Calibrações múltiplas e métodos de obtenção de imagens revelaram uma estrutura semelhante a um disco com uma região central escura — a sombra do buraco negro — que se manteve em várias observações independentes do EHT.

"Quando tivemos a certeza de ter efetivamente capturado a sombra, pudemos comparar o nosso resultado com uma extensa biblioteca de modelos de computador, a qual inclui a física do espaço deformado, matéria superaquecida e campos magnéticos muito fortes. Muitas das estruturas da imagem observada ajustam surpreendentemente bem os nossos modelos teóricos, o que nos dá confiança na interpretação das observações, incluindo a estimativa da massa do buraco negro," comenta Paul T. P. Ho, membro do Conselho do EHT e Diretor do Observatório do Leste Asiático.

"O confronto entre a teoria e as observações é sempre um momento dramático para os teóricos. Foi um alívio e um motivo de orgulho ver que as observações ajustavam tão bem as nossas previsões," explica Luciano Rezzolla da Goethe Universität, na Alemanha, também membro do Conselho do EHT.

Criar o EHT tratou-se de um desafio enorme, pois foi necessário atualizar e ligar uma rede mundial de oito telescópios pré-existentes colocados numa quantidade de locais de altitude elevada. Estes locais incluem vulcões no Hawaii e no México, montanhas no Arizona, EUA, a Sierra Nevada espanhola, o deserto chileno do Atacama e a Antártida.

As observações do EHT usaram uma técnica conhecida por interferometria de linha de base muito longa (VLBI, sigla do inglês para very-long-baseline interferometry), que sincroniza os vários telescópios e explora a rotação do nosso planeta de modo a formar um enorme telescópio do tamanho da Terra, que observa a um comprimento de onda de 1,3 mm. A VLBI permite ao EHT atingir uma resolução angular de 20 microssegundos de arco — o suficiente para se ler um jornal colocado em Nova Iorque a partir de um café em Paris (as observações do EHT no futuro próximo irão ver um aumento substancial da sua sensibilidade, devido à participação dos IRAM NOEMA Observatory, Greenland Telescope e Kitt Peak Telescope).

Os telescópios que contribuíram para este resultado foram: Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), Atacama Pathfinder Experiment (APEX), telescópio IRAM de 30 metros, James Clerk Maxwell Telescope, Large Millimeter Telescope Alfonso Serrano, Submillimeter Array, Submillimeter Telescope e South Pole Telescope. Foram combinados petabytes de dados obtidos por estes telescópios em supercomputadores altamente especializados, situados no Instituto Max Planck de Rádio Astronomia e no MIT Haystack Observatory.

As infraestruturas e financiamento europeu desempenharam um papel crucial neste esforço mundial, com a participação de telescópios europeus avançados e o apoio do Conselho Europeu de Investigação — particularmente com uma bolsa de 14 milhões de euros para o projeto BlackHoleCam. Os apoios do ESO, IRAM e Sociedade Max Planck foram também determinantes. "Este resultado apoia-se em décadas de experiência europeia na área da astronomia milimétrica", comentou Karl Schuster, Diretor do IRAM e membro do Conselho do EHT.

A construção do EHT e as observações anunciadas representam o culminar de décadas de trabalho observacional, técnico e teórico. Este exemplo de trabalho de equipa global apoiou-se em colaborações estreitas entre investigadores de todo o mundo. Treze instituições parceiras trabalharam em conjunto para criar o EHT, fazendo uso tanto de infraestruturas já existentes como do apoio de várias agências. O financiamento principal foi dado pela Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos da América (NSF), pelo Conselho Europeu de Investigação da União Europeia (ERC) e por agências financiadoras do Leste Asiático.

"O ESO orgulha-se de ter contribuído de forma significativa para este resultado através da sua liderança europeia e papel principal em dois dos telescópios componentes do EHT, situados no Chile — o ALMA e o APEX," comentou o Diretor Geral do ESO, Xavier Barcons. "O ALMA é a infraestrutura mais sensível do EHT e as suas 66 antenas de alta precisão foram determinantes no sucesso do EHT."

"Conseguimos algo que se julgava impossível há apenas uma geração atrás," concluiu Doeleman. "Juntámos avanços pioneiros em tecnologia, ligações entre os melhores rádio observatórios do mundo e algoritmos inovadores para abrir uma nova janela para os buracos negros e o seu horizonte de eventos."

 

 


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Messier 87 (M87) é uma galáxia elíptica enorme situada a cerca de 55 milhões de anos-luz de distância da Terra, visível na constelação da Virgem. Foi descoberta por Charles Messier em 1781, mas não foi identificada como galáxia até ao século XX. Com o dobro da massa da nossa própria galáxia, a Via Láctea, e contendo cerca de dez vezes mais estrelas, conta-se entre as maiores galáxias do Universo Local. Para além do seu tamanho, M87 tem algumas características bastante únicas. Por exemplo, contém uma grande quantidade de enxames globulares: enquanto a nossa Via Láctea não tem mais de 200, M87 conta com cerca de 12.000, o que alguns cientistas sugerem ser devido ao facto de os ter arrebatado a galáxias vizinhas mais pequenas. Tal como todas as grandes galáxias, M87 tem um buraco negro supermassivo no seu centro. O buraco negro pode também explicar uma das características mais energéticas da galáxia: um jacto relativista de matéria que está a ser ejectado com uma velocidade quase igual à da luz.
Este buraco negro foi objeto de observações do Event Horizon Telescope. O EHT escolheu-o como alvo por duas razões. Apesar da resolução do EHT ser muito boa, ainda assim tem os seus limites. Como os buracos negros mais massivos são também maiores em diâmetro, o buraco negro central de M87 apresentava um alvo invulgarmente grande, o que significa que podiam obter-se imagens dele mais facilmente do que de buracos negros mais pequenos mas mais próximos. A outra razão foi claramente mais "terrena". M87 apresenta-se relativamente perto do equador celeste quando observada a partir da Terra, o que a torna visível tanto no hemisfério norte como no hemisfério sul. Este facto maximizou o número de telescópios do EHT que a podiam observar, aumentando assim a resolução da imagem final.
Crédito: ESO


Esta imagem artística mostra um buraco negro supermassivo a rodar rapidamente, rodeado por um disco de acreção. O disco fino de material em rotação é constituído por restos de uma estrela do tipo do Sol que foi desfeita por ação das forças de maré do buraco negro. O buraco negro está assinalado, mostrando a anatomia deste fascinante objeto.
Crédito: ESO


Este esquema mostra a localização dos telescópios utilizados nas observações EHT de 2017 da galáxia M87.
Crédito: NRAO


Este poster do NRAO explica alguns dos conceitos chave em interferometria, a técnica que tornou possíveis as observações do buraco negro de M87 pelo Event Horizon Telescope.
Crédito: NRAO/AUI/NSF; S. Dagnello


// ESO (comunicado de imprensa)
// EHT (comunicado de imprensa)
// Observatório ALMA (comunicado de imprensa)
// NASA (comunicado de imprensa)
// MIT (comunicado de imprensa)
// Artigo científico #1 (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico #2 (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico #3 (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico #4 (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico #5 (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico #6 (The Astrophysical Journal Letters)
// Conferência de imprensa (Comissão Europeia via YouTube)
// ESOcast 199 (ESO via YouTube)

Saiba mais

CCVAlg - Astronomia:
25/01/2019 - Levantando o véu do buraco negro no coração da nossa Galáxia
16/10/2018 - Qual é o aspeto de um buraco negro?
31/03/2017 - Os astrónomos vão tentar fotografar a região mais próxima do buraco negro da Via Láctea

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Buraco negro supermassivo de M87:
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Buraco negro supermassivo:
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