A sonda Mars "Express" recebeu este nome por ter sido construída e lançada em tempo recorde e a um custo muito inferior ao de missões anteriores semelhantes, mas nada mais passou rapidamente. Em todos os aspetos, a Mars Express sobreviveu, superou e, de facto, ultrapassou todas as expectativas.
Em anos humanos, a Mars Express seria agora muito velha, tendo sobrevivido cinco vezes mais tempo do que aquele para que foi projetada. Embora possa estar a sentir a sua idade avançada, continua a revelar o Planeta Vermelho, com implicações para a nossa compreensão do nosso próprio lar.
Mars Express: momentos marcantes
Lançada no dia 2 de junho de 2003, a partir do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, a Mars Express iniciou a primeira viagem da Europa para explorar o nosso vizinho carmesim e, na realidade, de qualquer outro planeta. Transportando um conjunto de instrumentos científicos, a nave espacial tinha como objetivo estudar a geologia, o clima e a atmosfera de Marte, fornecendo informações valiosas sobre a sua história e o seu potencial para albergar vida
Um dos feitos mais significativos da missão foi a chegada bem-sucedida a Marte, no dia 25 de dezembro de 2003, quando a nave espacial entrou habilmente em órbita do planeta - uma proeza nada fácil. Capturada pela gravidade de Marte, abriu-se uma janela que nos permitiu captar imagens de cortar a respiração da superfície marciana e da alteração dos padrões climáticos, revelando paisagens diversas, desde vulcões imponentes a vales profundos e antigos leitos de rios.
As imagens de alta resolução do instrumento HRSC (High Resolution Stereo Camera) do DLR (Deutsches Zentrum für Luft- und Raumfahrt e.V., o Centro Aeroespacial Alemão) continuam a fornecer aos cientistas dados inestimáveis, permitindo-lhes reconstruir a história geológica do planeta e lançar luz sobre o seu potencial para a vida, passada ou presente.
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O instrumento HRSC da Mars Express da ESA obteve esta vista em perspetiva no dia 2 de fevereiro de 2005, durante a sua 1343.ª órbita , com uma resolução no solo de aproximadamente 15 metros por pixel. Mostra uma cratera de impacto sem nome localizada em Vastitas Borealis, e no seu centro, água gelada.
Crédito: ESA/DLR/FU Berlim (G. Neukum) |
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Mas não foram apenas as imagens que moldaram a nossa compreensão de Marte. O instrumento de radar da Mars Express, MARSIS (Mars Advanced Radar for Subsurface and Ionosphere Sounding), tem sido fundamental na deteção de água gelada à superfície do planeta e escondida, e o instrumento OMEGA (Observatoire pour la Minéralogie, l'Eau, les Glaces et l'Activité), numa das primeiras descobertas da sonda, encontrou água gelada exposta nas calotes polares.
Ainda mais excitante foi a descoberta, pelo MARSIS, de sinais de água líquida escondida sob camadas de gelo em regiões árticas e "reminiscentes do Lago Vostok, descoberto cerca de 4 km abaixo do gelo na Antártida, na Terra".
Estas descobertas têm grandes implicações. Uma vez que a água é um ingrediente vital para a existência de vida tal como a conhecemos, a Mars Express despertou um maior interesse em futuras missões ao Planeta Vermelho, centradas na exploração da possibilidade de vida microbiana passada ou presente.
A missão com muito mais do que nove vidas
A longevidade da Mars Express não é um acaso. A sua longa vida e os anos de ciência "extra" devem-se ao design robusto da nave espacial e ao engenho e dedicação da equipa de operações da missão no controlo de missão da ESA em Darmstadt, Alemanha, da equipa de operações científicas no ESAC (European Space Astronomy Centre) em Madrid, Espanha, e dos cientistas e parceiros industriais espalhados por toda a Europa que ajudaram a manter a missão a voar muito para além do seu tempo de vida nominal planeado de um ano marciano (687 dias terrestres).
Juntos, os engenheiros e cientistas da Mars Express ultrapassaram um número impressionante de problemas a centenas de milhões de quilómetros de distância.
Pouco depois do lançamento, um problema com a cablagem do sistema de energia solar da Mars Express levou a que apenas 60% da energia esperada estivesse disponível. Este contratempo obrigou a equipa de controlo a desenvolver um conceito de missão totalmente novo nos seis meses que demorou a chegar a Marte, ajustando as definições de potência e conseguindo aumentá-la para cerca de 70%.
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Os "números" da Mars Express.
Crédito: ESA |
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A caminho de Marte, a nave espacial também recuperou de vários modos de segurança e, durante o desdobramento da antena do radar MARSIS, a primeira parte ficou presa. A equipa teve de encontrar uma solução para a aquecer e conseguir libertá-la com sucesso - um problema idêntico aconteceu recentemente com a sonda JUICE (JUpiter Icy moon Explorer), a caminho do sistema de Júpiter, que felizmente também teve resolução feliz.
Em 2011, a Mars Express deparou-se com um grande problema de memória que resultou na perda das suas capacidades de armazenamento a longo prazo. Em resposta, as equipas desenvolveram um novo conceito operacional utilizando o armazenamento da memória de curto prazo da nave espacial, o que exigia encontrar uma forma de encaixar 3000 "telecomandos" numa fila que só podia conter 117 - o que conseguiram fazer.
Tendo em conta que as baterias da nave espacial também envelheceram com o tempo, a equipa de controlo da missão implementou medidas de poupança de energia cada vez mais elaboradas para maximizar a sua longevidade - ao otimizar o consumo e a utilização de energia, fizeram da Mars Express uma das naves mais eficientes a deixar a Terra.
Em 2014, a Mars Express teve de navegar num encontro muito próximo com o cometa Siding Spring. Apesar de o cometa não ter atingido Marte nem o orbitador de fabrico europeu, as partículas na sua cauda viajariam a uns impressionantes 56 km/segundo! Os engenheiros protegeram a missão desta poeira, ajustando a sua órbita e utilizando o próprio planeta Marte como escudo, ao mesmo tempo que conseguiram recolher observações científicas do momento único em que um cometa passou por um planeta rochoso.
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Imagem obtida pelo Telescópio Espacial Hubble do Cometa Siding Spring, que preocupou a sonda Mars Express e os controladores da missão.
Crédito: NASA, ESA e J.-Y. Li (PSI) |
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E, em 2018, a Mars Express liderou o caminho ao ser a primeira nave espacial da ESA a ficar "sem giroscópio". Muitas vezes, a parte que mais limita a vida útil de uma velha nave espacial são os giroscópios - unidades que giram rapidamente e que indicam à nave espacial para que lado está virada no espaço. Há cinco anos, a equipa de controlo de voo da missão reprogramou a nave espacial de modo a que os giroscópios pudessem ser desligados durante longos períodos de tempo, confiando apenas nas câmaras das estrelas para calcular a sua orientação e prolongando provavelmente a vida útil da missão em 10 anos.
Apesar de tudo isto (e muito mais), a Mars Express viveu 18 anos a mais do que o planeado. Até, numa ação inédita para uma nave espacial já em órbita, desenvolveu um novo instrumento - a "Mars Webcam"! O seu rádio de retransmissão MELACOM (Mars Express Lander Communications) foi reutilizado para estudar a atmosfera marciana juntamente com a sonda ExoMars TGO (Trace Gas Orbiter) da ESA e, mais importante, tem sido uma grande ajuda para toda a comunidade de missões científicas em Marte, desempenhando um papel vital no apoio às aterragens da missão Phoenix da NASA em 2008 e da missão MSL (Mars Science Laboratory), que transportou o rover Curiosity em 2012.
Mais Mars Express
A vida da Mars Express foi prolongada várias vezes e não é de admirar. A missão vai continuar a explorar o Planeta Vermelho até, pelo menos, 2026, como foi anunciado este ano na última extensão da missão.
O sucesso duradouro da Mars Express também proporciona lições valiosas para as próximas missões, incluindo o rover ExoMars e as missões de entrega de amostras, bem como mais oportunidades para apoiar os parceiros através da retransmissão de dados e do apoio à comunicação, incluindo a campanha MSR (Mars Sample Return) da NASA.
Em órbita a milhões de quilómetros da Terra, a Mars Express continua a revelar os segredos de Marte - um planeta que pode ter albergado vida e que no futuro poderá tornar-se num novo lar para a humanidade. Esta exploração é um alicerce para a nossa exploração contínua do Sistema Solar, mas é também uma oportunidade preciosa para olharmos para o nosso próprio planeta, para compreender o seu potencial futuro e para garantir que continua a ser o rodopiante ponto azul e verde que é hoje.
// ESA (comunicado de imprensa)
Quer saber mais?
Mars Express:
ESA
Wikipedia
Marte:
CCVAlg - Astronomia
Wikipedia
Cometa Siding Spring (C/2013 A1):
NASA
Wikipedia |