Problemas ao ver este e-mail?
Veja no browser

 
 
  Arquivo | CCVAlg - Astronomia
Com o apoio do Centro Ciência de Tavira
   
 
  Astroboletim #1876  
  01/03 a 03/03/2022  
     
     
   
 

Apresentação às Estrelas | E se o inverno quisesse ser primavera?
Data: 10 de março de 2022
Hora: 19:00-21:00
Os últimos fins de semana de março trazem-nos um equinócio e uma mudança de hora ao relógio. Este será o tema da Apresentação Às Estrelas deste mês, que inclui ainda a observação astronómica com telescópio se a meteorologia nos for favorável!
Adulto: 4€
Jovem: 2€
Menores de 12 anos: gratuito. Lotação máxima de 12 pessoas.
A observação astronómica depende de condições meteorológicas favoráveis.
Pré-inscrição: siga este link
Telefone: 289 890 920
E-mail: info@ccvalg.pt

 
     
 
Efemérides

Dia 01/03: 60.º dia do calendário gregoriano.
História:
Em 1870, nascia E. M. Antoniadi, astrónomo grego que ficou conhecido pelas suas observações de Marte. Foi o primeiro a apoiar a noção de canais marcianos, mas mais tarde chegou à conclusão de que era apenas uma ilusão ótica.
Em 1927, nascimento de George Abell, que catalogou 2712 enxames galáticos e determinou os números relativos de galáxias com vários brilhos intrínsecos. Morreu em 1983.
Em 1966, a sonda soviética Venera 3 colide com o planeta Vénus, tornando-se na primeira a "aterrar" na superfície de outro planeta.
Em 1980, a sonda Voyager 1 confirma a existência de Jano, uma lua de Saturno. 
Em 1982, a soviética Venera 13 envia as primeiras fotografias a cores de Vénus (a Venera 14 seguiu-a 4 dias depois).

Foi lançada a 30 de outubro de 1981 e a Venera 14 a 4 de novembro de 1981.
Em 2002, lançamento da missão STS-109, com objetivo de fazer a manutenção do Telescópio Espacial Hubble. No mesmo ano, o satélite ambiental Envisat alcança com sucesso uma órbita de 800 km por cima da Terra no seu 11.º lançamento, transportando a carga mais pesada até à data, 8500 quilogramas.
Observações: Num céu sem Lua e com Unicórnio passando a sul por trás de Orionte como se puxado por uma corda, é uma boa altura para traçar a figura desta constelação.
Contém também alguns objetos de céu profundo, como NGC 2244, um padrão retangular no centro da muito mais ténue Nebulosa Roseta. Fica mais ou menos na posição correspondente ao olho da figura do Unicórnio. As estrelas mais brilhantes do padrão são de sexta ou sétima magnitude. Encontre o enxame 10º para este-sudeste de Betelgeuse. O retângulo alongado está atualmente na vertical.
Se tiver acesso a binóculos grandes ou até a um telescópio, porque não tentar observar o Enxame da Árvore de Natal, NGC 2264? 15 Monocerotis, a estrela de quinta magnitude que assinala a ponta do chifre de Unicórnio, assinala a posição do objeto de céu profundo. A árvore atualmente está de cabeça para baixo.

Dia 02/03: 61.º dia do calendário gregoriano.
História: Em 1972, é lançada a sonda americana Pioneer 10. Torna-se na primeira a passar pela cintura de asteroides e a alcançar o planeta Júpiter (em 1973).

Torna-se também na primeira sonda a navegar para lá da órbita dos planetas do Sistema Solar exterior. A Pioneer 10 transporta uma placa desenhada para identificar a sua origem caso seja encontrada à deriva pela Via Láctea. Em 2003, após 31 anos, a Pioneer 10 deixa finalmente de se ouvir.
Em 1978, o astronauta checo Vladimir Remek torna-se no primeiro não-russo ou não-americano a ir ao espaço, a bordo da Soyuz 28.
Em 1998, dados enviados pela sonda Galileu indicam que a lua de Júpiter, Europa, tem um oceano líquido por baixo de uma espessa crosta de gelo.
Observações: À medida que amanhece, mais ou menos uns meros 20 minutos antes do nascer-do-Sol, use binóculos grandes ou um telescópio pequeno para observar o céu acima do horizonte a este-sudeste, à procura da conjunção entre Mercúrio e Saturno, separados por 0,7º. Estão cerca de 22º para baixo e para a esquerda de Vénus. Saturno é o objeto mais ténue, para cima e para a esquerda de Mercúrio. É necessário um horizonte desimpedido de edifícios ou árvores.
Lua Nova, pelas 17:35.

Dia 03/03: 62.º dia do calendário gregoriano.
História: Em 1915, é fundada a NACA, antecessora da NASA.
Em 1959, lançamento da sonda Pioneer 4, a primeira missão à Lua com êxito.

Falhou a Lua por 59.500 km em vez dos esperados 32.000 km, pelo que não conseguiu testar as câmaras, mas enviou dados excelentes sobre a radiação através dos seus contadores Geiger.
Em 1968, nascia Brian Cox, físico inglês, conhecido por apresentar vários programas televisivos de ciência. 
Em 1969, lançamento da Apollo 9, com o objetivo de testar o módulo lunar.
Em 2005, graças a observações do VLT do ESO e do XMM-Newton da ESA, astrónomos anunciam a descoberta da estrutura mais distante e mais massiva do Universo até à data. É um remoto enxame galáctico com milhares de vezes a massa da Via Láctea e está a mais de 9 mil milhões de anos-luz de distância.
Observações: Por baixo dos pés de Orionte esconde-se a constelação de Lebre. Tal como Cão Maior, é uma constelação "ligue os pontos" que realmente se parece com o que é suposto ser. É um coelhinho com o seu nariz apontado para baixo e para a direita, as suas ténues orelhas estendem-se para cima em direção a Rigel e o seu corpo "amontoado" para a esquerda. As suas duas estrelas mais brilhantes, Alpha e Beta Leporis, de 3.ª magnitude, formam a frente e a parte de trás do seu pescoço.

 
 
   
FRBs num local invulgar

Estão entre os grandes mistérios do Universo: explosões de radiação que duram cerca de um milésimo de segundo e que só aparecem em radiotelescópios. Desde a sua descoberta em 2007, os astrónomos têm vindo a investigar a causa destes flashes cósmicos. Agora, uma equipa que envolve o Instituto Max Planck para Radioastronomia e a sua antena de 100 metros em Effelsberg encontrou uma destas rápidas FRBs ("fast radiobursts" em inglês) à distância mais próxima da Terra até agora, na galáxia espiral Messier 81, a cerca de 12 milhões de anos-luz de distância. Além disso, a fonte está aparentemente localizada num enxame globular desta galáxia - onde menos se esperaria encontrar uma FRB.

 
Flashes no espaço: representação artística que mostra a explosão de radiação rádio como observada num enxame globular da galáxia espiral Messier 81.
Crédito: Daniëlle Futselaar/ASTRON (artsource.nl)
 

A maioria dos flashes rádio aparecem como se vindos do nada, alguns repetem-se periodicamente. Cada um destes surtos emite tanta energia quanto o Sol irradia num dia inteiro. Várias centenas destes flashes cósmicos são disparados todos os dias e têm sido observados por todo o céu. A maioria está localizada a grandes distâncias da Terra - em galáxias a milhares de milhões de anos-luz de distância.

Investigadores liderados por Franz Kirsten (Universidade de Chalmers, Suécia) e Kenzie Nimmo (Universidade de Amesterdão) analisaram agora de perto uma fonte de surtos repetidos detetada em janeiro de 2020 na direção da constelação de Ursa Maior. "Queríamos procurar pistas sobre as origens dos flashes," diz Kirsten.

Para este fim, os cientistas utilizaram a rede europeia de observação EVN (European VLBI Network). Combinaram os dados de 12 antenas parabólicas - incluindo o telescópio de 100 metros do Instituto Max Planck para Radioastronomia, o instrumento mais sensível do grupo - e foram assim capazes de identificar exatamente onde no céu teve origem a explosão de radiação.

A equipa acompanhou os flashes até à periferia da galáxia espiral próxima Messier 81 (M81), que fica a cerca de 12 milhões de anos-luz da Terra - e representa assim a fonte mais próxima de surtos rádios até à data. E: a sua posição coincide exatamente com um enxame globular que se encontra na galáxia e que consiste numa densa coleção de estrelas muito antigas.

É precisamente este facto que surpreende os investigadores, porque até agora as FRBs tinham sido encontradas mais longe no Universo, em lugares onde as estrelas são muito mais jovens. "A semelhança da explosão com a emissão de alguns pulsares na nossa Galáxia coloca-nos em terreno familiar, mas também deixa claro que os precursores da explosão rádio podem ser muito diferentes," diz Ramesh Karuppusamy do Instituto Max Planck para Radioastronomia em Bona.

Para compreender a surpresa, é preciso conhecer a teoria por detrás da causa das explosões rádio. Muitos especialistas pensam que os chamados magnetares estão por detrás delas. Estes são remanescentes muito densos de sóis massivos que explodiram - estrelas de neutrões com cerca de 20 quilómetros de diâmetro que giram rapidamente e que têm campos magnéticos extremamente fortes. "Nós esperamos que os magnetares sejam objetos jovens," diz Jason Hessels da Universidade de Amesterdão.

Os investigadores pensam, portanto, que a fonte dos surtos rádio da galáxia M81 é um objeto que foi previsto teoricamente, mas nunca visto ao vivo antes: um magnetar que se formou quando uma anã branca tinha acumulado massa suficiente para se desmoronar sob o seu próprio peso. "Coisas estranhas acontecem ao longo dos vários milhares de milhões de anos de existência de um enxame globular. Suspeitamos que estamos a observar uma estrela com uma história invulgar," diz Franz Kirsten.

As anãs brancas são consideradas as fases finais de estrelas normais como o nosso Sol, que vivem durante vários milhares de milhões de anos e acabam por transformar-se em objetos densos do tamanho da Terra sem explodir. Muitas destas anãs brancas existem em antigos enxames estelares, algumas delas em sistemas binários. Alguns destes pares devem ser tão íntimos que uma parceira "rouba" material da outra.

Se uma das anãs brancas acumular massa extra suficiente da sua companheira, pode transformar-se numa estrela ainda mais densa - um magnetar. "Este é um acontecimento raro, mas num enxame de estrelas velhas seria a forma mais fácil de produzir FRBs," diz o membro da equipa Mohit Bhardwaj da Universidade McGill no Canadá.

Durante as suas medições, os investigadores fizeram outra descoberta: alguns dos surtos eram mais curtos do que o esperado e mudaram de brilho em apenas algumas dezenas de nanossegundos. "Isto significa que devem vir de um volume minúsculo no espaço, menor do que um campo de futebol e talvez com apenas algumas dezenas de metros em diâmetro," diz Kenzie Nimmo.

Sinais ultracurtos semelhantes também são recebidos de um dos objetos mais famosos do céu, o pulsar da Nebulosa do Caranguejo. Esta também é uma estrela de neutrões, ou seja, o denso remanescente de uma explosão de supernova que foi avistada da Terra na direção da constelação de Touro no ano 1054. À medida que a estrela gira rapidamente sob si própria, emite dois feixes de radiação. Quando passam na direção da Terra, o objeto parece ser um pulsar, piscando como um farol.

"Alguns dos sinais que medimos são curtos e extremamente poderosos, da mesma forma que alguns sinais do pulsar de Caranguejo. Isto sugere que estamos de facto a ver um magnetar, mas num local onde os magnetares nunca foram encontrados antes," diz Kenzie Nimmo.

Observações futuras deste e de outros sistemas devem ajudar a determinar se a fonte é, de facto, um magnetar ou outra coisa qualquer, como um pulsar com propriedades invulgares. Ou mesmo um buraco negro em órbita de uma estrela compacta numa órbita íntima.

// Instituto Max Planck (comunicado de imprensa)
// Universidade Chalmers (comunicado de imprensa)
// ASTRON (comunicado de imprensa)
// Artigo científico #1 (Nature)
// Artigo científico #2 (Nature)
// Artigo científico #2 (arXiv.org)

 


Saiba mais

Notícias relacionadas:
SPACE.com
Universe Today
PHYSORG

FRB ("Fast Radio Burst"):
Wikipedia
Catálogo de FRBs (Universidade Swinburne)

Magnetar:
Wikipedia
AstronomyOnline.org

M81:
SEDS
Wikipedia

EVN:
Página oficial
Wikipedia

 
   
Buracos negros colossais "dançam" no coração de uma galáxia

Trancados numa épica valsa cósmica a 9 mil milhões de anos-luz de distância, dois buracos negros supermassivos parecem orbitar um em torno do outro a cada dois anos. Os dois corpos gigantes têm cada um massas que são centenas de milhões de vezes maiores que a do nosso Sol e os objetos estão separados por uma distância mais ou menos 50 vezes superior à que separa o nosso Sol e Plutão. Quando o par se fundir daqui a cerca de 10.000 anos, espera-se que a colisão titânica abane o próprio espaço e tempo, enviando ondas gravitacionais através do Universo.

Uma equipa de astrónomos liderada pelo Caltech descobriu evidências de que este cenário tem lugar dentro de um objeto ferozmente energético conhecido como um quasar. Os quasares são núcleos ativos de galáxias, nos quais um buraco negro supermassivo está a desviar material de um disco que o rodeia. Em alguns quasares, o buraco negro supermassivo cria um jato que é disparado a uma velocidade próxima da velocidade da luz. O quasar observado no novo estudo, PKS 2131-021, pertence a uma subclasse de quasares chamada blazares, no qual o jato aponta para a Terra. Os astrónomos já sabiam que os quasares poderiam possuir dois buracos negros em órbita, mas encontrar evidências diretas para tal tem-se revelado difícil.

 
Nesta ilustração, a luz de um buraco negro mais pequeno (à esquerda) é curvada em torno de um buraco negro maior e forma uma imagem quase espelhada do outro lado. A gravidade de um buraco negro pode empenar o tecido do próprio espaço, de tal forma que a luz que passa perto do buraco negro seguirá um caminho curvo à sua volta.
Crédito: Caltech-IPAC
 

Reportando na revista The Astrophysical Journal Letters, os investigadores argumentam que PKS 2131-021 é agora o segundo candidato conhecido de um par de buracos negros supermassivos apanhados no ato de fusão. O primeiro par candidato, dentro de um quasar chamado OJ 287, orbita-se um ao outro a distâncias maiores, circulando a cada nove anos vs. os dois anos necessários para que o par PKS 2131-021 complete uma órbita.

As provas reveladoras vieram das observações rádio de PKS 2131-021 que se estendem por 45 anos. De acordo com o estudo, um jato potente que emana de um dos dois buracos negros dentro de PKS 2131-021 está a deslocar-se para trás e para a frente devido ao movimento orbital do par. Isto causa alterações periódicas no brilho rádio do quasar. Estas oscilações foram registadas por cinco observatórios diferentes, incluindo o OVRO (Owens Valley Radio Observatory) do Caltech, o UMRAO (University of Michigan Radio Astronomy Observatory) o Observatório Haystack do MIT, o NRAO (National Radio Astronomy Observatory), o Radiobservatório Metsähovi na Finlândia e o telescópio espacial WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer) da NASA.

A combinação dos dados de rádio produz uma curva sinusoidal quase perfeita, ao contrário de qualquer coisa observada anteriormente a partir de quasares.

"Quando nos apercebemos que os 'altos e baixos' da curva de luz detetada em tempos recentes correspondia aos 'altos e baixos' observados entre 1975 e 1983, sabíamos que algo muito especial estava a acontecer," diz Sandra O'Neill, autora principal do novo estudo e aluna do Caltech que é orientada por Tony Readhead, professor de astronomia, emérito.

Ondulações no Espaço e no Tempo

A maioria, se não todas, as galáxias possuem buracos negros monstruosos nos seus núcleos, incluindo a nossa própria Galáxia Via Láctea. Quando as galáxias se fundem, os seus buracos negros "afundam-se" para o meio da galáxia recém-formada e acabam por se juntar para formar um buraco negro ainda mais massivo. À medida que os buracos negros espiralam um em direção ao outro, perturbam cada vez mais o tecido do espaço e do tempo, enviando ondas gravitacionais , que foram previstas pela primeira vez por Albert Einstein há mais de 100 anos.

O LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory) da NSF (National Science Foundation), que é gerido conjuntamente pelo Caltech e pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology), deteta ondas gravitacionais de pares de buracos negros com até dúzias de vezes a massa do nosso Sol. No entanto, os buracos negros supermassivos nos centros das galáxias têm milhões ou milhares de milhões de vezes mais massa do que o nosso Sol, e emitem frequências de ondas gravitacionais mais baixas do que as detetadas pelo LIGO.

No futuro, os PTAs (pulsar timing arrays) - que consistem de um conjunto de estrelas mortas pulsantes monitorizadas com precisão por radiotelescópios - deverão ser capazes de detetar as ondas gravitacionais de buracos negros supermassivos (a missão LISA, ou Laser Interferometer Space Antenna, deverá detetar a fusão de buracos negros cujas massas são 1000 a 10 milhões de vezes a massa do nosso Sol). Até agora, não foram registadas ondas gravitacionais de nenhuma destas fontes mais massivas, mas PKS 2131-021 fornece o alvo mais promissor até agora.

Entretanto, as ondas de luz são a melhor opção para detetar buracos negros supermassivos coalescentes.

O primeiro destes candidatos, OJ 287, também exibe variações periódicas no rádio. Estas flutuações são mais irregulares e não sinusoidais, mas sugerem que os buracos negros se orbitam um ao outro a cada nove anos. Os buracos negros dentro do novo quasar, PKS 2131-021, orbitam-se um ao outro de dois em dois anos e estão separados por 2000 unidades astronómicas, cerca de 50 vezes a distância entre o Sol e Plutão, ou 10 a 100 vezes mais perto do que o par OJ 287 (uma unidade astronómica é a distância entre a Terra e o Sol).

 
Dois buracos negros supermassivos são vistos em órbita um do outro nesta animação. O buraco negro mais massivo, com centenas de milhões de vezes a massa do nosso Sol, está a disparar um jato que muda de brilho aparente à medida que o par circula em torno do outro. Os astrónomos encontraram evidências para este cenário num quasar chamado PKS 2131-021, após uma análise de 45 anos de observações rádio que mostram o sistema periodicamente a escurecer e a ganhar brilho. Pensa-se que o padrão cíclico observado seja provocado pelo movimento orbital do jato.
Crédito: Caltech/R. Hurt (IPAC)
 

Revelando a Curva de Luz com 45 Anos

Readhead diz que as descobertas se desdobraram como um "bom romance policial", com início em 2008 quando ele e colegas começaram a usar o telescópio de 40 metros no OVRO para estudar como os buracos negros convertem material de que se "alimentam" em jatos relativistas, ou jatos que viajam a velocidades até 99,98% da velocidade da luz. Tinham estado a monitorizar o brilho de mais de 1000 blazares para este fim quando, em 2020, notaram um caso único.

"PKS 2131 variava não só periodicamente, mas sinusoidalmente," diz Readhead. "Isso significa que existe um padrão que podemos seguir continuamente ao longo do tempo." A questão, diz ele, tornou-se então: há quanto tempo é que este padrão de ondas sinusoidais está a ocorrer?

A equipa de investigação analisou então os dados rádio arquivados para procurar picos passados nas curvas de luz que correspondiam a previsões baseadas nas mais recentes observações OVRO. Primeiro, os dados do VLBA (Very Long Baseline Array) do NRAO e do UMRAO revelaram um pico de 2005 que coincidia com as previsões. Os dados UMRAO revelaram ainda que não houve qualquer sinal sinusoidal durante 20 anos antes desse período - até 1981, quando foi observado outro pico previsto.

"A história teria parado aí, pois não nos apercebemos de que havia dados sobre este objeto anteriores a 1980," diz Readhead. "Mas então Sandra pegou neste projeto em junho de 2021. Se não fosse ela, esta bela descoberta estaria na prateleira."

O'Neill começou a trabalhar com Readhead e com o segundo autor do estudo, Sebastian Kiehlmann, pós-doutorado na Universidade de Creta e ex-cientista do Caltech como parte do programa SURF (Summer Undergraduate Research Fellowship) da instituição de ensino norte-americana. O'Neill começou a faculdade focando-se em química, mas retomou o projeto de astronomia porque queria manter-se ativa durante a pandemia. "Cheguei à conclusão de que estava muito mais entusiasmada com isto do que com qualquer outra coisa em que tivesse trabalhado," diz.

Com o projeto de volta à mesa, Readhead procurou na literatura e descobriu que o Observatório Haystack tinha feito observações rádio de PKS 2131-021 entre 1975 e 1983. Estes dados revelaram outro pico correspondente às suas previsões, desta vez ocorrendo em 1976.

"Este trabalho mostra o valor de fazer uma monitorização precisa destas fontes ao longo de muitos anos a fim de realizar ciência," diz o coautor Roger Blandford, académico especialista em Astrofísica Teórica no Caltech que está atualmente em sabática da Universidade Stanford.

 
Três conjuntos de observações rádio do quasar PKS 2131-02, abrangendo 45 anos, são aqui representados, com dados do OVRO a azul; do UMRAO a castanho; e do Observatório Haystack a verde. As observações correspondem a uma simples onda sinusoidal, indicada a azul. Os astrónomos pensam que o padrão de onda sinusoidal é causado por dois buracos negros supermassivos no coração do quasar que orbitam um em torno do outro de dois em dois anos (um período de cinco anos foi realmente observado devido a um efeito Doppler causado pela expansão do Universo). Um dos buracos negros está a disparar um jato relativista que se escurece e ilumina periodicamente. Note-se que os dados do OVRO e do UMRAO coincidem para o pico em 2010, e os dados do UMRAO e do Observatório Haystack coincidem para o pico em 1981. As magnitudes dos picos observados por volta de 1980 são duas vezes maiores do que as observadas em tempos recentes, presumivelmente porque mais material estava a cair em direção ao buraco negro e a ser ejectado nessa altura.
Crédito: Tony Readhead/Caltech
 

Como um Relógio

Readhead compara o sistema do jato movendo-se para trás e para a frente com o tiquetaque de um relógio, onde cada ciclo, ou período, da onda sinusoidal corresponde à órbita de dois anos dos buracos negros (embora o ciclo observado seja na realidade de cinco anos devido à luz ser esticada pela expansão do Universo). Este tiquetaque foi visto pela primeira vez em 1976 e continuou durante oito anos antes de desparecer durante 20 anos, provavelmente devido a mudanças na alimentação do buraco negro. O tiquetaque está agora de volta há 17 anos.

"O relógio manteve o tiquetaque," diz. "A estabilidade do período ao longo deste intervalo de 20 anos sugere fortemente que este blazar abriga não um buraco negro supermassivo, mas dois buracos negros supermassivos que se orbitam um ao outro."

A física subjacente às variações sinusoidais foi, ao início, um mistério, mas Blanford desenvolveu um modelo simples e elegante para explicar a forma sinusoidal das variações.

"Sabíamos que esta bela onda sinusoidal tinha de nos estar a dizer algo importante sobre o sistema," diz Readhead. "O modelo de Roger mostra-nos que é simplesmente o movimento orbital que faz isto. Antes de Roger o resolver, ninguém tinha percebido que um binário com um jato relativista teria uma curva de luz que se parecia com isto."

Kiehlmann diz: "O nosso estudo fornece uma planta de como procurar tais binários blazar no futuro."

// Caltech (comunicado de imprensa)
// NASA (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico (arXiv.org)
// Buraco negro supermassivo binário mais íntimo encontrado no coração de galáxia distante (Caltech via YouTube)

 


Saiba mais

Blazar:
Wikipedia

Quasar:
Wikipedia

Buraco negro supermassivo:
Wikipedia

Ondas gravitacionais:
GraceDB (Gravitational Wave Candidate Event Database)
Wikipedia
Astronomia de ondas gravitacionais - Wikipedia
Ondas gravitacionais: como distorcem o espaço - Universe Today
Detetores: como funcionam - Universe Today
As fontes de ondas gravitacionais - Universe Today
O que é uma onda gravitacional (YouTube)

OVRO (Owens Valley Radio Observatory):
Caltech
Wikipedia

Observatório Haystack:
MIT
Wikipedia

Radiobservatório Metsähovi:
Página principal
Wikipedia

WISE:
NASA
Wikipedia
Caltech

LIGO:
Página oficial
Caltech
Advanced LIGO
Wikipedia

 
   
Astrónomos descobrem que buraco negro gira muito inclinado em relação à sua órbita

Os astrónomos encontraram um buraco negro que desafia os modelos teóricos atuais para a formação destes objetos compactos, utilizando telescópios no Observatório Roque de los Muchachos (Garafía, La Palma, Ilhas Canárias). Os resultados foram publicados na revista Science.

As observações, por esta equipa de investigadores, liderada pela Universidade de Turku (Finlândia) com participação do IAC (Instituto de Astrofísica de Canarias), encontra uma diferença de mais de 40 graus entre o eixo da órbita do binário de raios-X MAXI J1820+070 e o eixo de rotação do buraco negro. A existência de um buraco negro neste sistema binário foi descoberta anteriormente por uma equipa de investigadores do IAC com observações utilizando o GTC (Gran Telescopio Canarias) e o Telescópio William Herschel do Grupo de Telescópios Isaac Newton, ambos no Observatório Roque de los Muchachos.

 
Impressão de artista do sistema binário de raios-X MAXI J1820+070 contendo um buraco negro (pequeno ponto negro no centro do disco gasoso) e uma estrela companheira. Um jato estreito é dirigido ao longo do eixo de rotação do buraco negro, que está fortemente desalinhado em relação ao eixo de rotação da órbita.
Crédito: R. Hynes
 

Muitas vezes, para os sistemas com objetos mais pequenos em órbita de um corpo massivo central, o próprio eixo de rotação deste corpo está muito alinhado com o eixo de rotação dos seus satélites. Isto também é verdade para o nosso Sistema Solar: os planetas orbitam em torno do Sol num plano, que coincide aproximadamente com o plano equatorial do Sol. A inclinação do eixo de rotação do Sol em relação ao eixo orbital da Terra é de apenas sete graus.

"A expetativa de alinhamento, em grande medida, não se mantém para objetos bizarros como os binários de raios-X (com um buraco negro)," diz Juri Poutanen, professor de astronomia na Universidade de Turku e autor principal da publicação. E acrescenta: "Os buracos negros nestes sistemas foram formados como resultado de um cataclismo cósmico - o colapso de uma estrela massiva. Agora vemos o buraco negro a arrastar matéria da estrela companheira mais leve em órbita. Vemos radiação no visível e em raios-X como o último suspiro do material em queda, e também emissão rádio dos jatos relativistas expelidos do sistema."

Ao observar o sinal destes jatos, os investigadores conseguiram fazer uma estimativa muito precisa da direção do eixo de rotação do buraco negro. Cerca de um ano após a sua identificação, com o instrumento MAXI situado na Estação Espacial Internacional, a quantidade de gás que cai no buraco negro começou a diminuir e o sistema desvaneceu-se. A partir daí, uma parte significativa da emissão provém da estrela companheira. Ao estudar esta estrela com o GTC usando espectroscopia, foi possível medir a inclinação da sua órbita e verificou-se que era praticamente a mesma que a inclinação do jato.

"Para estabelecer a orientação espacial da órbita também precisamos de conhecer a posição angular do binário no plano do céu," explica Manuel Pérez Torres, investigador do IAC e coautor do artigo. "Esta medição foi obtida através do estudo da polarização da radiação emitida pelo binário. Esta informação, combinada com resultados anteriores, deu-nos uma imagem detalhada da estrutura do binário e da orientação 3D dos seus componentes, levando à descoberta de um buraco negro que gira, surpreendentemente, muito inclinado em relação à sua órbita.

Os resultados publicados na revista Science abrem perspetivas interessantes para estudos da formação de buracos negros e da evolução de tais sistemas, uma vez que esse desalinhamento extremo é difícil de obter em muitos cenários de formação de buracos negros e evolução binária.

"A diferença de mais de 40 graus entre o eixo orbital e a rotação do buraco negro foi completamente inesperada. Os cientistas assumiram frequentemente que esta diferença é muito pequena quando modelaram o comportamento da matéria num espaço-tempo curvo em torno de um buraco negro. Os modelos atuais já são realmente complexos e agora as novas descobertas obrigam-nos a acrescentar-lhes uma nova dimensão," afirma Poutanen.

Antes da escrita deste artigo científico, uma equipa de astrofísicos liderada pelo investigador do IAC Manuel Pérez Torres tinha confirmado a presença de um buraco negro e derivado a inclinação da órbita com dados também obtidos em La Palma, com o GTC e com o Telescópio William Herschel.

Contudo, as observações-chave para o presente estudo foram feitas com o Telescópio Liverpool e com o instrumento DIPol-UF no NOT (Nordic Optical Telescope), que pertence às Universidades de Turku (Finlândia) e Aarhus (Dinamarca), ambos no Observatório Roque de los Muchachos, La Palma.

// IAC (comunicado de imprensa)
// Universidade de Turku (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Science)

 


Saiba mais

CCVAlg - Astronomia:
29/10/2021 - Amadores ajudam à descoberta de um disco deformado em torno de um buraco negro
01/09/2020 - Descobertos ventos infravermelhos constantes durante a erupção de um buraco negro de massa estelar
02/06/2020 - MAXI J1820+070: surto de buraco negro "apanhado" em vídeo
15/10/2019 - Revelada explosão violenta no coração de um sistema que alberga um buraco negro
01/02/2019 - NICER mapeia "ecos de luz" de buraco negro recém-descoberto

Binário de raios-X de baixa massa:
Wikipedia

Buraco negro de massa estelar:
Wikipedia

GTC (Gran Telescopio Canarias):
Página principal
Wikipedia

WHT (William Herschel Telescope):
Página principal
Wikipedia

ING (Isaac Newton Group of Telescopes):
Página principal
Wikipedia

NOT (Nordic Optical Telescope):
Página principal
Wikipedia

Observatório Roque de los Muchachos:
Página oficial
Wikipedia

MAXI:
Wikipedia

 
   
Também em destaque
  Uma onda de choque que se estende por 6,5 milhões de anos-luz (via SARAO)
Uma equipa internacional de astrónomos fez as imagens mais detalhadas da maior onda de choque cósmica visível da Terra. Estas gigantescas ondas de choque são muito maiores do que toda a nossa Galáxia e formaram-se quando enxames de galáxias colidiram no que foram os eventos mais energéticos depois do Big Bang. Ler fonte
 
   
Álbum de fotografias - Galáxia Espiral NGC 4945
(clique na imagem para ver versão maior)
Crédito: Dietmar HagerEric Benson
 
A grande galáxia espiral NGC 4945 é vista de lado nesta ampliação cósmica de grande plano. De facto, NGC 4945 é quase do tamanho da nossa Via Láctea. O seu disco de poeira, jovens enxames estelares azuis e regiões cor-de-rosa de formação estelar sobressaem nesta colorida imagem telescópica. A cerca de 13 milhões de anos-luz na direção da constelação do hemisfério sul de Centauro, NGC 4945 está apenas cerca de seis vezes mais longe do que Andrómeda, a grande galáxia espiral mais próxima da Via Láctea. Embora a região central da galáxia esteja em grande parte escondida dos telescópios óticos, as observações em raios-X e no infravermelho indicam grandes emissões energéticas e formação estelar no núcleo de NGC 4945. O seu núcleo obscurecido mas ativo qualifica o belíssimo universo-ilha como uma galáxia Seyfert e provavelmente o lar de um buraco negro supermassivo central.
 
   
Arquivo | Feed RSS | Contacte o Webmaster | Remover da lista
 
       
       
   
Centro Ciência Viva do Algarve
Rua Comandante Francisco Manuel
8000-250, Faro
Portugal
Telefone: 289 890 922
E-mail: info@ccvalg.pt
Centro Ciência Viva de Tavira
Convento do Carmo
8800-311, Tavira
Portugal
Telefone: 281 326 231 | Telemóvel: 924 452 528
E-mail: geral@cvtavira.pt
   

Os conteúdos das hiperligações encontram-se na sua esmagadora maioria em Inglês. Para o boletim chegar sempre à sua caixa de correio, adicione noreply@ccvalg.pt à sua lista de contactos. Este boletim tem apenas um caráter informativo. Por favor, não responda a este email. Contém propriedades HTML e classes CSS - para vê-lo na sua devida forma, certifique-se que o seu cliente de webmail suporta este tipo de mensagem, ou utilize software próprio, como o Outlook ou outras apps para leitura de mensagens eletrónicas.

Recebeu esta mensagem por estar inscrito na newsletter de Astronomia do Centro Ciência Viva do Algarve e do Centro Ciência Viva de Tavira. Se não a deseja receber ou se a recebe em duplicado, faça a devida alteração clicando aqui ou contactando o webmaster.

Esta mensagem destina-se unicamente a informar e está de acordo com as normas europeias de proteção de dados (ver RGDP), conforme Declaração de Privacidade e Tratamento de dados pessoais.

2022 - Centro Ciência Viva do Algarve | Centro Ciência Viva de Tavira

ccvalg.pt cvtavira.pt