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PLANETAS DO TAMANHO DA TERRA: A GERAÇÃO MAIS RECENTE E ESTRANHA
28 de fevereiro de 2017

 


Esta impressão de artista apareceu na capa da edição de 23 de fevereiro de 2017 da revista Nature, anunciando que a estrela TRAPPIST-1, uma anã vermelha ultrafria, tem em órbita sete planetas do tamanho da Terra. Qualquer um destes planetas pode ter água líquida. Os planetas mais distantes têm, mais provavelmente, grandes quantidades de gelo, especialmente na face oposta à estrela.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
(clique na imagem para ver versão maior)

 

Uma "safra" abundante de planetas do tamanho da Terra, amontoados em torno de uma estrela anã vermelha ultrafria, poderá ser pouco mais do que pedaços de rocha atingidos por radiação, ou mundos cobertos de nuvens tão quentes como Vénus.

Ou podem abrigar formas de vida exóticas, prosperando sob céus de crepúsculos avermelhados.

Os cientistas estão a ponderar as possibilidades depois do anúncio da semana passada: a descoberta de sete mundos em órbita de uma pequena estrela "fria" a cerca de 40 anos-luz de distância, todos idênticos à Terra em termos de massa e diâmetro. Três dos planetas residem na "zona habitável" ao redor da sua estrela, TRAPPIST-1, onde os cálculos sugerem que as condições possam ser adequadas para que a água líquida exista às suas superfícies - embora sejam necessárias observações de acompanhamento para ter a certeza.

Todos os sete são os primeiros embaixadores de uma nova geração de alvos de caça exoplanetária.

As estrelas anãs vermelhas - também chamadas "anãs-M" - são mais numerosas que outros tipos de estrelas, incluindo estrelas amarelas como o nosso Sol, por um fator de três para um, constituindo quase 75% das estrelas na nossa Galáxia. Também duram muito mais tempo. E os seus planetas são proporcionalmente maiores em comparação com as pequenas estrelas que orbitam. Isto significa que mundos rochosos e pequenos, em órbita das anãs vermelhas mais próximas, serão os alvos principais dos novos e poderosos telescópios que entrarão em funcionamento nos próximos anos, tanto no espaço como no solo.

"A maioria das estrelas são anãs-M, fracas, pequenas e pouco luminosas," comenta Martin Still, cientista na sede da NASA em Washington, EUA. "Por isso, a maioria dos lugares onde podemos procurar planetas será em torno destas estrelas pequenas e frias. Estamos interessados nas estrelas mais próximas, e as estrelas mais próximas são, na maior parte, anãs-M."

Mas estes serão certamente planetas estranhos com propriedades estranhas que terão que ser extraídas com uma observação cuidadosa, bem como com simulações de computador. A possível descoberta de que podem suportar alguma forma de vida, e que tipo, provavelmente irá manter os astrobiólogos a trabalhar horas extra, talvez tentando recriar em laboratório algumas das condições deste mundos tingidos a vermelho.

"Estamos definitivamente a trabalhar horas extra agora," comenta Nancy Kiang, astrobióloga do Instituto Goddard para Estudos Espaciais da NASA em Nova Iorque.

Será que a vida encontra um caminho?

A opinião dos especialistas, sobre se os planetas das anãs vermelhas são adequados para a vida, tende a balançar para trás e para a frente, "como um pêndulo," realça Shawn Domagal-Goldman, cientista espacial do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland.

"Nós descobrimos razões teóricas para que um tal planeta tenha que lutar para ser habitável," disse. "Olhamos depois para aquelas preocupações teóricas com um pouco mais de detalhe e descobrimos que não são assim tão preocupantes. E depois surgem outros dados teóricos que nos preocupam novamente."

De momento, o pêndulo balança-se na direção da ausência de vida. Descobertas recentes sugerem que a vida terá dificuldades em sobreviver num planeta próximo de uma anã vermelha, em grande parte porque estas estrelas são extremamente ativas durante os seus primeiros anos - disparando rajadas potencialmente letais de radiação.

Estas birras juvenis duram algum tempo. As anãs vermelhas têm uma energia muito menor do que o nosso Sol, mas vivem muito mais tempo, talvez com uma duração de biliões de anos - mais do que a idade atual do Universo. Espera-se que o nosso Sol chegue ao fim da sua vida após cerca de 10 mil milhões de anos; estamos a meio da sua vida útil.

Não sabemos a idade exata da estrela TRAPPIST-1, mas os cientistas pensam que tem pelo menos 500 milhões de anos, ou cerca de um-décimo dos 4,5 mil milhões de anos do nosso Sol.

Alguns nascem para uma noite sem fim

As anãs vermelhas podem precisar de mil milhões de anos para se acalmaram o suficiente para permitir que quaisquer planetas próximos fiquem habitáveis. E a "zona habitável" em torno de tais estrelas é, de facto, muito próxima. Todos os sete planetas do tamanho da Terra orbitam tão perto da estrela que completam uma única órbita - o seu "ano" - numa questão de dias, 1,5 dias para o planeta mais interior e 20 dias para o mais distante.

Este tipo de proximidade significa que os planetas têm, provavelmente, bloqueio de marés, ou seja, a mesma face está sempre virada para a estrela e a outra sempre na direção oposta, da mesma forma que a Lua apresenta sempre a mesma face à Terra. E enquanto as anãs vermelhas são "frias" em comparação com o nosso Sol, destacar-se-iam em tamanho no céu de um planeta próximo e com bloqueio de marés, talvez "cozendo" a face virada para a estrela. O outro lado, entretanto, poderia estar preso numa noite gelada e eterna.

É possível que um tipo certo de atmosfera mitigasse tais efeitos, transportando calor para o lado oculto do planeta e ajudando a moderar o clima global.

Um estudo recente que se baseou em simulações de computador de planetas de anãs vermelhas, no entanto, forneceu mais notícias sombrias. Segundo um estudo por uma equipa de Goddard, liderada por Vladimir Airapetian, as birras explosivas das jovens anãs vermelhas, com as suas rajadas de raios-X altamente energéticos e emissões ultravioleta podem, na verdade, retirar oxigénio das atmosferas de planetas próximos.

Outros cenários envolvem a completa remoção da atmosfera.

Domagal-Goldman comenta que ainda outro efeito potencialmente esterilizante, até para planetas de anãs-M que conseguem manter as suas atmosferas, resultaria da radiação altamente energética que desencadeia um efeito de estufa.

"Talvez acabássemos por ter um clima estável demasiado quente para suportar vida," salienta.

Mas sabe-se tão pouco sobre o começo da vida, e de quão comum ou rara pode ser no cosmos, que a possibilidade de vida resistente em planetas de anãs-M permanece uma possibilidade distinta.

Embora a perda de atmosfera devido a tempestades estelares seja uma preocupação legítima, tem por base modelos computacionais complexos, realça Frank Selsis da Universidade de Bordéus, um dos autores do artigo sobre TRAPPIST-1.

Dado que os modelos computacionais contêm certas suposições sobre as estrelas e sobre os planetas, podem não estar completos. Os modelos podem não ter em conta os efeitos da estrela sobre atmosferas planetárias que possam criar um campo magnético protetor. Ou podem produzir taxas de perda atmosférica tão altas que são, fisicamente, implausíveis.

Quanto a TRAPPIST-1, "o atual silêncio relativo da estrela e as fontes plausíveis de reabastecimento atmosférico ainda possibilitam com que os planetas tenham condições atmosféricas e superficiais habitáveis," comenta Michaël Gillon, investigador principal para o TRAPPIST na Universidade de Lieja, Bélgica. "A nossa única maneira de ir além destas suposições teóricas é tentar detetar e estudar detalhadamente as suas atmosferas."

Talvez a vida consiga "lidar com a situação"

Outros cientistas também forneceram cenários possíveis sobre o lado mais otimista da equação da habitabilidade da anã-M.

"Talvez a atmosfera possa recuperar e esteja de boa saúde," comenta Tom Barclay, investigador sénior do Centro de Pesquisa Ames da NASA em Moffett Field, Califórnia, EUA. Barclay trabalhou no mais prolífico caçador de exoplanetas, o telescópio espacial Kepler da NASA, tanto durante a sua missão original como na sua segunda encarnação, conhecida como K2.

No cenário de Barclay, as formas de vida encontram um modo de se adaptarem às explosões de radiação estelar.

"Temos estes eventos regulares, mas a vida está já habituada," observa Barclay. "Apenas aprendeu a lidar com isso. Vemos, certamente, vida na Terra capaz de hibernar por longos períodos de tempo. Vemos que a vida entra num estado onde se 'desliga', por vezes durante anos ou décadas. Por isso não devemos, provavelmente, descartá-la, mas colocar esforços no estudo para determinar se este é um lugar onde pensamos que a vida poderia prosperar."

Telescópios futuros, incluindo o Telescópio Espacial James Webb da NASA, com lançamento previsto para 2018, podem ajudar a resolver estas questões analisando cuidadosamente os gases atmosféricos dos planetas de TRAPPIST-1. Se um desses instrumentos descobrisse vapor de água e, digamos, uma combinação de oxigénio e metano, tal poderá ser uma forte indicação de um mundo potencialmente habitado.

O Telescópio Espacial Hubble também terá um papel importante na caracterização das atmosferas dos planetas de TRAPPIST-1 e, de facto, já iniciou um estudo preliminar. Ambos os telescópios espaciais estão equipados para capturar o espectro de luz dos planetas, revelando os tipos de gases aí presentes.

Julien de Wit, investigador de pós-doutoramento do MIT (Massachusetts Institute of Technology, em português Instituto de Tecnologia Massachusetts), autor do novo artigo sobre TRAPPIST-1, disse: "Nós vamos observar as atmosferas em diferentes comprimentos de onda, o que permite obter a composição, temperatura, pressão. E isso permitir-nos-á restringir a habitabilidade."

Além disso, as birras estelares podem até nem ser assim tão más - isto é, caso os planetas da anã-M estejam com uma maré de sorte.

"Podem começar com densos invólucros de hidrogénio que são destruídos," comenta Victoria Meadows da Universidade de Washington, a investigadora principal do Laboratório Planetário Virtual do Instituto de Astrobiologia da NASA. "É como uma pele protetora sobre o planeta."

A radiação estelar removeria o hidrogénio, deixando para trás um mundo potencialmente habitável.

Os planetas também podem ter-se formado mais longe da estrela, aproximando-se ao longo do tempo.

"Podem migrar de mais longe para mais perto, onde há mais água e temperaturas mais frias," realça. "Isso dar-lhes-ia mais proteção contra a perda de água. Existem muitas opções."

Os modelos mostram, na verdade, que os sistemas planetários compactos das anãs-M - parecidos com o sistema TRAPPIST-1 - são mais propensos a se formarem mais longe e a migrarem para dentro, dado que o sistema estelar interior não teria material suficiente para formar tantos planetas.

Em qualquer caso, se tais planetas possuem vida, é mais provável que as formas de vida sejam simples.

"Estou a falar de organismos parecidos com os fungos mais simples," salienta Meadows. "São muito mais fáceis de evoluir do que seres conscientes. A maioria da vida, a existir pelo Universo, é provavelmente unicelular, vida relativamente primitiva. É este o tipo que estaríamos à procura em planetas em órbita destas anãs-M."

 


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Esta ilustração mostra os sete planetas em órbita de TRAPPIST-1, uma anã ultrafria, de uma perspetiva da Terra usando um telescópio fictício e incrivelmente poderoso.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
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Links:

Núcleo de Astronomia do CCVAlg:
24/02/2017 - Anã ultrafria e os sete planetas
10/02/2017 - NASA descobre que planetas de anãs vermelhas podem perder oxigénio nas zonas habitáveis
28/10/2016 - Preferencialmente, planetas do tamanho da Terra com muita água
16/09/2016 - Conheça a estrela, conheça o planeta 
22/07/2016 - Hubble faz o primeiro estudo atmosférico de exoplanetas do tamanho da Terra
03/05/2016 - Três mundos potencialmente habitáveis em torno de uma estrela anã muito fria

Notícias relacionadas:
NASA (comunicado de imprensa)
Universe Today

TRAPPIST-1:
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Planetas extrasolares:
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PlanetQuest
Enciclopédia dos Planetas Extrasolares

Telescópio Espacial Kepler:
NASA (página oficial)
K2 (NASA)
Arquivo de dados do Kepler
Arquivo de dados da missão K2
Descobertas planetárias do Kepler
Wikipedia

Telescópio TRAPPIST:
Página oficial (Universidade de Lieja)
ESO
Wikipedia

Telescópio Espacial Hubble:
Hubble, NASA 
ESA
STScI
SpaceTelescope.org
Base de dados do Arquivo Mikulski para Telescópios Espaciais

JWST (Telescópio Espacial James Webb):
NASA
STScI
ESA
Wikipedia

 
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