TELESCÓPIOS ENCONTRAM FONTE DE RAIOS-X NO INTERIOR DE SUPERNOVA MISTERIOSA 15 de janeiro de 2019
AT2018cow explodiu dentro de ou próximo da galáxia CGCG 137-068, localizada a cerca de 200 milhões de anos-luz de distância na direção da constelação de Hércules. Esta ampliação mostra a posição do fenómeno.
Crédito: Sloan Digitized Sky Survey
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Os telescópios espaciais de alta energia da ESA, INTEGRAL e XMM-Newton, ajudaram a encontrar uma poderosa fonte de raios-X no centro de uma explosão estelar, de brilho e evolução sem precedentes, que apareceu subitamente no céu.
O telescópio ATLAS no Hawaii foi o primeiro a avistar o fenómeno, desde então chamado AT2018cow, no dia 16 de junho. Pouco tempo depois, astrónomos de todo o mundo apontaram telescópios terrestres e espaciais para o objeto celeste recém-descoberto, localizado numa galáxia a aproximadamente 200 milhões de anos-luz.
Rapidamente perceberam que era algo completamente novo. Em apenas dois dias, o objeto excedeu o brilho de qualquer supernova observada anteriormente - uma poderosa explosão de uma estrela massiva e velha que expele a maior parte do seu material para o espaço circundante, varrendo a poeira e os gases interestelares na sua vizinhança.
O novo artigo, aceite para publicação na revista The Astrophysical Journal, descreve as observações dos primeiros 100 dias da existência do objeto, cobrindo todo o espectro eletromagnético da explosão, desde o rádio até aos raios-gama.
A análise, que inclui observações do INTEGRAL e XMM-Newton da ESA, bem como dos telescópios espaciais NuSTAR e Swift da NASA, encontrou uma fonte de raios-X altamente energéticos situada no interior da explosão.
O comportamento desta fonte, revelado nos dados, sugere que o fenómeno estranho pode ser ou um buraco negro nascente ou uma estrela de neutrões com um poderoso campo magnético, sugando o material circundante.
"A interpretação mais empolgante é que podemos ter visto pela primeira vez o nascimento de um buraco negro ou de uma estrela de neutrões," comenta Raffaella Margutti da Universidade Northwestern, EUA, autora principal do artigo.
"Sabemos que os buracos negros e as estrelas de neutrões se formam quando as estrelas colapsam e explodem como supernovas, mas nunca vimos tais objetos no momento exato da sua formação," acrescenta Indrek Vurm do Observatório Tartu, na Estónia, que trabalhou na modelagem das observações.
A explosão AT2018cow não foi apenas 10 a 100 vezes mais brilhante do que qualquer outra supernova já observada anteriormente: também atingiu o pico de luminosidade muito mais depressa do que qualquer outro evento conhecido anteriormente - em apenas alguns dias em comparação com as duas semanas normais.
O INTEGRAL fez as suas primeiras observações do fenómeno cerca de cinco dias depois de ter sido relatado e manteve a monitorização durante 17 dias. Os seus dados mostraram-se cruciais para a compreensão do estranho objeto.
"O INTEGRAL estuda uma gama de comprimentos de onda que não é coberta por qualquer outro satélite," realça Erik Kuulkers, cientista do projeto INTEGRAL da ESA. "Nós temos uma certa sobreposição com o NuSTAR na parte dos raios-X altamente energéticos, mas também podemos observar a energias mais altas."
Assim, enquanto os dados do NuSTAR revelaram em grande detalhe o espectro de raios-X, com o INTEGRAL os astrónomos foram capazes de ver o espectro inteiro da fonte, incluindo o seu limite superior em raios-gama suaves.
"Vimos uma espécie de 'solavanco' com um corte acentuado no espectro mais energético," explica Volodymyr Savchenko, astrónomo da Universidade de Genebra, na Suíça, que trabalhou nos dados do INTEGRAL. "Este 'solavanco' é um componente adicional da radiação libertada pela explosão, brilhando através de um meio opaco ou opticamente espesso."
"Esta radiação altamente energética veio provavelmente de uma área de plasma muito quente e denso em torno da fonte," acrescenta Carlo Ferrigno, também da Universidade de Genebra.
Dado que o INTEGRAL continuou a monitorizar a explosão AT2018cow por um maior período de tempo, os seus dados também puderam mostrar que o sinal de raios-X altamente energéticos estava gradualmente a desvanecer.
Raffaella explica que a estes raios-X altamente energéticos que desapareceram se dá o nome radiação reprocessada - radiação da fonte que interage com material expelido pela explosão. À medida que o material se afasta do centro da explosão, o sinal diminui gradualmente e acaba por desaparecer completamente.
No entanto, neste sinal os astrónomos foram capazes de encontrar padrões típicos de um objeto que atrai matéria dos seus arredores - seja um buraco negro ou uma estrela de neutrões.
"É a característica mais invulgar que observámos em AT2018cow e é definitivamente algo sem precedentes no mundo dos eventos astronómicos transientes e explosivos," diz Raffaella.
Entretanto, o XMM-Newton observou esta explosão invulgar duas vezes nos primeiros 100 dias da sua existência. Detetou a parte menos energética da sua emissão de raios-X que, segundo os astrónomos, vem diretamente do "motor" no núcleo da explosão. Ao contrário dos raios-X altamente energéticos provenientes do plasma circundante, ainda são visíveis os raios-X de baixa energia da fonte.
Os astrónomos planeiam usar o XMM-Newton para realizar uma observação de acompanhamento no futuro, o que permitirá com que compreendam o comportamento da fonte ao longo de um maior período de tempo e em grande detalhe.
"Continuamos a analisar os dados do XMM-Newton para tentar compreender a natureza da fonte," realça a coautora Giulia Migliori, da Universidade de Bolonha, na Itália, que trabalhou nos dados de raios-X. "A acreção dos buracos negros deixa marcas características em raios-X, que podemos detetar nos nossos dados."
"Este evento foi completamente inesperado e mostra que há muito que não entendemos completamente," diz Norbert Scharterl, cientista do projeto XMM-Newton da ESA. "Um satélite, um único instrumento, nunca seria capaz de entender um objeto tão complexo. Os conhecimentos detalhados que pudemos reunir sobre o funcionamento da misteriosa explosão AT2018cow só foram alcançados graças à ampla cooperação e combinação de muitos telescópios."
Os astrónomos, usando observações terrestres, avistaram a progressão do evento cósmico AT2018cow, visto nestas três imagens. Esquerda: o SDSS no estado norte-americano do Novo México observou a galáxia hospedeira em 2003, sem sinal à vista (o círculo verde indica a eventual posição da explosão). Centro: o Telescópio Liverpool nas Ilhas Canárias viu o fenómeno muito perto do seu brilho máximo no dia 20 de junho de 2018, quanto era muito mais brilhante do que a galáxia hospedeira. Direita: o Telescópio William Herschel, também nas Ilhas Canárias, obteve uma imagem de alta resolução de AT2018cow quase um mês depois de ter atingido o seu brilho máximo, enquanto diminuia de brilho.
Crédito: Daniel Perley, Universidade John Moores de Liverpool
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A evolução da explosão de supernova AT2018cow, observada em raios-X suaves com os observatórios espaciais Swift da NASA (círculos vermelhos) e XMM-Newton da ESA (triângulos vermelhos), e a raios-X mais energéticos com o NuSTAR da NASA (círculos cor-de-laranja) e com o INTEGRAL da ESA (círculos amarelos).
A supernova foi avistada pela primeira vez no dia 16 de junho de 2018 com o telescópio ATLAS no Hawaii. Os dados aqui presentes foram recolhidos entre os dias 22 de junho e 22 de julho.
Estas observações revelaram uma fonte de poderosos raios-X no centro desta explosão estelar de brilho e evolução sem precedentes, sugerindo que pode ou ser o nascimento de um buraco negro ou uma estrela de neutrões com um campo magnético poderoso, atraindo material em redor.
Crédito: Cortesia de R. Margutti et al. (2019)
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