Utilizando dados de arquivo do telescópio Gemini Norte, uma equipa de astrónomos mediu o par de buracos negros supermassivos mais pesado alguma vez encontrado. A fusão de dois buracos negros supermassivos é um fenómeno há muito previsto, mas nunca observado. Este par massivo dá pistas sobre a razão pela qual um tal acontecimento parece tão improvável no Universo.
Quase todas as galáxias massivas albergam um buraco negro supermassivo no seu centro. Quando duas galáxias se fundem, os seus buracos negros podem formar um par binário, o que significa que se orbitam um ao outro. Teoriza-se que estes binários estão destinados a fundir-se, mas tal nunca foi observado. A questão de saber se tal acontecimento é possível tem sido um tópico de discussão entre os astrónomos durante décadas. Num artigo científico publicado recentemente na revista The Astrophysical Journal, uma equipa de astrónomos apresentou uma nova perspetiva sobre esta questão.
A equipa utilizou dados do telescópio Gemini Norte no Hawaii, uma metade do Observatório Gemini operado pelo NOIRLab (National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory) da NSF (National Science Foundation), para analisar um buraco negro binário supermassivo localizado na galáxia elíptica B2 0402+379. Este é o único buraco negro binário supermassivo alguma vez resolvido com detalhe suficiente para ver ambos os objetos separadamente (já foram feitas observações anteriores de galáxias contendo dois buracos negros supermassivos, mas nesses casos estão separados por milhares de anos-luz - demasiado longe para se orbitarem um ao outro) e detém o recorde de ter a menor separação alguma vez medida diretamente - apenas 24 anos-luz (existem outras fontes idênticas com, possivelmente, separações menores, mas foram apenas inferidas usando observações indiretas e portanto só podem ser classificados como candidatos a binário). Embora esta separação próxima prenuncie uma fusão poderosa, outros estudos revelaram que o par está "parado" a esta distância há mais de três mil milhões de anos, o que levanta a questão: porquê a demora?
Para compreender melhor a dinâmica deste sistema e a sua fusão "interrompida", a equipa recorreu a dados de arquivo do instrumento GMOS (Gemini Multi-Object Spectrograph), que lhes permitiu determinar a velocidade das estrelas na vizinhança dos buracos negros. "A excelente sensibilidade do GMOS permitiu-nos mapear as velocidades crescentes das estrelas à medida que nos aproximamos do centro da galáxia", disse Roger Romani, professor de física da Universidade de Stanford e coautor do artigo científico. "Com isso, conseguimos inferir a massa total dos buracos negros que lá residem".
A equipa estima que a massa do binário seja 28 mil milhões de vezes superior à do Sol, o que faz do par o buraco negro binário mais massivo alguma vez medido. Esta medição não só fornece um contexto valioso para a formação do sistema binário e para a história da sua galáxia hospedeira, como também apoia a teoria de longa data de que a massa de um buraco negro binário supermassivo desempenha um papel fundamental no bloqueio de uma potencial fusão (esta teoria foi apresentada pela primeira vez em 1980 por Begelman et al. e há muito que se defende a sua ocorrência com base em décadas de observações dos centros das galáxias).
"O arquivo de dados que serve o Observatório Gemini contém uma mina de ouro de descobertas científicas inexploradas", diz Martin Still, diretor do programa NSF para o Observatório Gemini. "As medições da massa deste extremo buraco negro binário supermassivo são um exemplo inspirador do impacto potencial de nova investigação que explora esse rico arquivo."
Compreender como é que este binário se formou pode ajudar a prever se e quando se irá fundir - e algumas pistas apontam para que o par se tenha formado através de múltiplas fusões de galáxias. A primeira é que B2 0402+379 é um "enxame fóssil", o que significa que é o resultado da fusão de estrelas e gás de todo um enxame de galáxias numa única galáxia massiva. Além disso, a presença de dois buracos negros supermassivos, juntamente com a sua grande massa combinada, sugere que resultaram da fusão de vários buracos negros mais pequenos de várias galáxias.
Após uma fusão galáctica, os buracos negros supermassivos não colidem de frente. Em vez disso, começam a passar uns pelos outros à medida que se estabelecem numa órbita. Com cada passagem que fazem, a energia é transferida dos buracos negros para as estrelas que os rodeiam. À medida que perdem energia, o par é arrastado para cada vez mais perto, até ficarem a apenas alguns anos-luz de distância, altura em que a radiação gravitacional assume o controlo e se fundem. Este processo foi observado diretamente em pares de buracos negros de massa estelar - o primeiro caso registado foi em 2015, através da deteção de ondas gravitacionais - mas nunca num binário da variedade supermassiva.
Com o novo conhecimento da massa extremamente elevada do sistema, a equipa concluiu que teria sido necessário um número excecionalmente grande de estrelas para abrandar a órbita do binário o suficiente para os aproximar tanto. No processo, os buracos negros parecem ter expelido quase toda a matéria na sua vizinhança, deixando o núcleo da galáxia sem estrelas e sem gás. Sem mais matéria disponível para abrandar ainda mais a órbita do par, a fusão estagnou na sua fase final.
"Normalmente, parece que as galáxias com pares de buracos negros mais leves têm estrelas e massa suficientes para os juntar rapidamente", disse Romani. "Uma vez que este par é tão pesado, eram necessárias muitas estrelas e gás para o fazer. Mas o binário retirou essa matéria da galáxia central, deixando-a estagnada e acessível para o nosso estudo."
Ainda não se sabe se o par vai ultrapassar a sua estagnação e acabar por se fundir em escalas de tempo de milhões de anos, ou se vai continuar no limbo orbital para sempre. Se se fundirem, as ondas gravitacionais resultantes serão cem milhões de vezes mais poderosas do que as produzidas pela fusão de buracos negros de massa estelar. É possível que o par conquiste a distância final através de outra fusão de galáxias, que injetaria no sistema material adicional, ou potencialmente um terceiro buraco negro, para abrandar a órbita do par o suficiente para se fundir. No entanto, dado o estatuto de B2 0402+379 como enxame fóssil, outra fusão galáctica é improvável.
"Aguardamos com expetativa o acompanhamento das investigações do núcleo de B2 0402+379, onde iremos analisar a quantidade de gás presente", diz Tirth Surti, estudante de Stanford e autor principal do artigo científico. "Isto deverá dar-nos mais informações sobre se os buracos negros supermassivos podem eventualmente fundir-se ou se ficarão presos como binários".
// NOIRLab (comunicado de imprensa)
// Observatório Gemini (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal)
// Artigo científico (arXiv.org)
Quer saber mais?
CCVAlg - Astronomia:
30/06/2017 - Incrível descoberta confirma existência de buracos negros supermassivos em órbita um do outro
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Buraco negro supermassivo:
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Galáxia B2 0402+379:
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Observatório Internacional Gemini:
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GMOS (Observatório Gemini) |