Astrónomos profissionais e amadores juntaram-se à inteligência artificial para descobrir um trio estelar inigualável chamado TIC 290061484, graças às "luzes estroboscópicas" cósmicas captadas pelo TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA.
O sistema contém um conjunto de estrelas gémeas que se orbitam mutuamente a cada 1,8 dias e uma terceira estrela que orbita o par em apenas 25 dias. A descoberta bate o recorde do período orbital exterior mais curto para este tipo de sistema, estabelecido em 1956, em que uma terceira estrela orbitava um par interior em 33 dias.
"Graças à configuração compacta do sistema, visto de lado, podemos medir as órbitas, massas, tamanhos e temperaturas das suas estrelas", disse Veselin Kostov, investigador do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland, e do Instituto SETI em Mountain View, Califórnia, EUA. "E podemos estudar como o sistema se formou e prever como poderá evoluir".
O artigo científico que descreve os resultados, liderado por Kostov, foi publicado no dia 2 de outubro na revista The Astrophysical Journal.
As cintilações na luz estelar ajudaram a revelar o trio íntimo, que se situa na direção da constelação de Cisne. O sistema é quase plano da nossa perspetiva. Isto significa que as estrelas se cruzam mesmo em frente umas das outras, ou eclipsam-se, enquanto orbitam. Quando isso acontece, a estrela mais próxima bloqueia parte da luz da estrela mais distante.
Utilizando a aprendizagem de máquina, os cientistas filtraram enormes conjuntos de dados sobre a luz das estrelas obtidos pelo TESS para identificar padrões de escurecimento que revelam eclipses. Depois, uma pequena equipa de cientistas cidadãos fez uma nova filtragem, baseando-se em anos de experiência e formação informal para encontrar casos particularmente interessantes.
Estes astrónomos amadores, que são coautores do novo estudo, conheceram-se como participantes num projeto online de ciência cidadã chamado Planet Hunters, que esteve ativo de 2010 a 2013. Mais tarde, os voluntários juntaram-se a astrónomos profissionais para criar uma nova colaboração chamada Visual Survey Group, que está ativa há mais de uma década.
"Procuramos principalmente assinaturas de sistemas multiestelares compactos, estrelas pulsantes invulgares em sistemas binários e objetos estranhos", disse Saul Rappaport, professor emérito de física no MIT (Massachusetts Institute of Technology) em Cambridge, EUA. Rappaport é coautor do artigo científico e ajudou a dirigir o Visual Survey Group durante mais de uma década. "É excitante identificar um sistema como este, porque raramente são encontrados, mas podem ser mais comuns do que os registos atuais sugerem". É provável que muitos mais "salpiquem" a nossa Galáxia, à espera de serem descobertos.
Em parte porque as estrelas do recém-descoberto sistema orbitam quase no mesmo plano, os cientistas dizem que provavelmente é muito estável, apesar da sua configuração íntima (as órbitas do trio cabem numa área mais pequena do que a órbita de Mercúrio em torno do Sol). A gravidade de cada estrela não perturba demasiado as outras, como aconteceria se as suas órbitas estivessem inclinadas em direções diferentes.
Mas embora as suas órbitas se mantenham provavelmente estáveis durante milhões de anos, "ninguém vive aqui", disse Rappaport. "Pensamos que as estrelas se formaram em conjunto a partir do mesmo processo de crescimento, o que teria impedido a formação de planetas muito próximos de qualquer uma das estrelas." A exceção poderá ser um planeta distante a orbitar as três estrelas como se fossem uma só.
À medida que as estrelas interiores envelhecem, vão expandir e acabam por se fundir, desencadeando uma explosão de supernova dentro de 20 a 40 milhões de anos.
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Este gráfico destaca as áreas de pesquisa de três missões de deteção de trânsitos: O futuro Telescópio Espacial Nancy Grace Roman da NASA, o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) e o reformado Telescópio Espacial Kepler. O Kepler encontrou 13 sistemas estelares triplos triplamente eclipsantes, o TESS encontrou mais de 100 até agora e os astrónomos esperam que o Roman encontre mais de 1000.
Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA |
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Entretanto, os astrónomos estão à procura de estrelas triplas com órbitas ainda mais curtas. É difícil fazer isso com a tecnologia atual, mas uma nova ferramenta está a caminho.
As imagens do futuro Telescópio Espacial Nancy Grace Roman da NASA serão muito mais pormenorizadas do que as do TESS. Na mesma área do céu coberta por um único pixel do TESS caberão mais de 36.000 pixéis do Roman. E, enquanto que o TESS observou todo o céu de uma forma ampla e superficial, o Roman penetrará profundamente no coração da nossa Galáxia, onde as estrelas se aglomeram, fornecendo uma amostra do núcleo em vez de percorrer toda a superfície.
"Sabemos pouco sobre muitas das estrelas no centro da Galáxia, à exceção das mais brilhantes", disse Brian Powell, coautor e cientista de dados no Centro Goddard. "A visão de alta resolução do Roman vai ajudar-nos a medir a luz de várias estrelas que normalmente parecem apenas uma, proporcionando o melhor olhar até agora sobre a natureza dos sistemas estelares na nossa Galáxia."
E dado que o Roman vai monitorizar a luz de centenas de milhões de estrelas como parte de um dos seus principais estudos, vai ajudar os astrónomos a encontrar mais sistemas estelares triplos em que todas as estrelas se eclipsam umas às outras.
"Estamos curiosos por saber porque é que não temos encontrado sistemas estelares como estes com períodos orbitais exteriores ainda mais curtos", disse Powell. "O Roman deverá ajudar-nos a encontrá-los e aproximar-nos dos seus limites."
O Telescópio Roman poderá também encontrar estrelas eclipsantes unidas em grupos ainda maiores - meia dúzia, ou talvez até mais, todas a orbitarem-se umas às outras como abelhas a zumbir à volta de uma colmeia.
"Antes dos cientistas terem descoberto sistemas triplos triplamente eclipsantes, não esperávamos que existissem", disse o coautor Tamás Borkovits, investigador sénior do Observatório Baja da Universidade de Szeged, na Hungria. "Mas quando os encontrámos, pensámos: porque não? O Roman também pode revelar categorias nunca antes vistas de sistemas e objetos que irão surpreender os astrónomos".
// NASA (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal)
// Artigo científico (arxiv.org)
Quer saber mais?
Sistema estelar triplo:
Wikipedia
TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite):
NASA
NASA/Goddard
Programa de Investigadores do TESS (HEASARC da NASA)
MAST (Arquivo Mikulski para Telescópios Espaciais)
Exoplanetas descobertos pelo TESS (NASA Exoplanet Archive)
Wikipedia
RST ([Nancy Grace] Roman Space Telescope, anteriormente WFIRST):
NASA
Wikipedia
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