Em 1936, os astrónomos observaram um evento intrigante na constelação de Orionte: a jovem estrela FU Orionis (FU Ori) tornou-se cem vezes mais brilhante numa questão de meses. No seu pico, FU Ori era intrinsecamente 100 vezes mais brilhante do que o nosso Sol. No entanto, ao contrário de uma estrela em explosão, a sua luminosidade diminuiu apenas ligeiramente desde então.
Agora, uma equipa de astrónomos utilizou as capacidades ultravioletas do Telescópio Espacial Hubble da NASA para aprender mais sobre a interação entre a superfície estelar de FU Ori e o disco de acreção que tem despejado gás sobre a estrela em crescimento durante quase 90 anos. Descobriram que o disco interior que toca a estrela é extraordinariamente quente - o que desafia a sabedoria convencional.
As observações foram efetuadas com os instrumentos COS (Cosmic Origins Spectrograph) e STIS (Space Telescope Imaging Spectrograph) do telescópio. Os dados incluem os primeiros espetros no ultravioleta distante e no ultravioleta próximo de FU Ori.
"Esperávamos validar a parte mais quente do modelo do disco de acreção, para determinar a sua temperatura máxima, medindo mais perto do que nunca a orla interior do disco de acreção", disse Lynne Hillenbrand do Caltech em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia, e coautora do artigo científico. "Penso que havia alguma esperança de vermos algo mais, como a interface entre a estrela e o seu disco, mas não estávamos certamente à espera disso. O facto de termos visto tanto a mais - era muito mais brilhante no ultravioleta do que o previsto - foi a grande surpresa".
Uma melhor compreensão da acreção estelar
Originalmente considerada como um caso único entre as estrelas, FU Ori exemplifica uma classe de estrelas jovens e eruptivas que sofrem mudanças dramáticas de brilho. Estes objetos são um subconjunto das estrelas T Tauri clássicas, que são estrelas em formação recente que se estão a "construir" através da acreção de material do seu disco e da nebulosa circundante. Nas estrelas T Tauri clássicas, o disco não toca diretamente na estrela porque é restringido pela pressão exterior do campo magnético da estrela.
Os discos de acreção em torno de objetos tipo FU Ori, no entanto, são suscetíveis a instabilidades devido à sua enorme massa relativamente à estrela central, a interações com uma companheira binária ou a material em queda. Tal instabilidade significa que a taxa de acreção de massa pode mudar dramaticamente. O aumento do ritmo perturba o delicado equilíbrio entre o campo magnético estelar e a borda interior do disco, levando a que o material se aproxime e acabe por tocar na superfície da estrela.
O aumento da taxa de material em queda e a proximidade do disco de acreção à estrela tornam os objetos FU Ori muito mais brilhantes do que uma típica estrela T Tauri. De facto, durante uma explosão, a própria estrela é ofuscada pelo disco. Além disso, o material do disco está a orbitar rapidamente à medida que se aproxima da estrela, muito mais depressa do que a rotação da superfície estelar. Isto significa que deve haver uma região onde o disco impacta a estrela e o material abranda e aquece significativamente.
"Os dados do Hubble indicam uma região de impacto muito mais quente do que os modelos previam anteriormente", disse Adolfo Carvalho, do Caltech e principal autor do estudo. "Em FU Ori, a temperatura é de 16.000 K [quase três vezes a temperatura da superfície do nosso Sol]. Esta temperatura escaldante é quase o dobro da calculada por modelos anteriores. Isto desafia-nos e encoraja-nos a pensar como é que um tal salto na temperatura pode ser explicado".
Para resolver a diferença significativa de temperatura entre os modelos anteriores e as recentes observações do Hubble, a equipa oferece uma interpretação revista da geometria da região interior de FU Ori: O material do disco de acreção aproxima-se da estrela e, quando atinge a superfície estelar, produz-se um choque quente que emite muita luz ultravioleta.
A sobrevivência de planetas em torno de FU Ori
Compreender os mecanismos do rápido processo de acreção de FU Ori relaciona-se mais amplamente com ideias da formação e sobrevivência de planetas.
"O nosso modelo revisto, baseado nos dados do Hubble, não é estritamente uma má notícia para a evolução dos planetas, é uma espécie de mistura", explicou Carvalho. "Se o planeta estiver muito afastado no disco durante a sua formação, as explosões de um objeto FU Ori deverão influenciar o tipo de elementos químicos que o planeta acabará por herdar. Mas se um planeta em formação estiver muito próximo da estrela, a história é um pouco diferente. No espaço de algumas explosões, qualquer planeta que se esteja a formar muito perto da estrela pode mover-se rapidamente para o interior e acabar por se fundir com ela. Podemos perder, ou pelo menos fritar completamente, planetas rochosos que se estejam a formar perto de uma estrela deste género".
Está a ser feito trabalho adicional com as observações UV do Hubble. A equipa está a analisar cuidadosamente as várias linhas de emissão espetral de múltiplos elementos presentes no espetro obtido pelo COS. Isto deverá fornecer mais pistas sobre o ambiente de FU Ori, tal como a cinemática do gás que entra e sai da região interior.
"Muitas destas estrelas jovens são espetroscopicamente muito ricas nos comprimentos de onda do ultravioleta distante", refletiu Hillenbrand. "Uma combinação do Hubble, do seu tamanho e cobertura de comprimentos de onda, bem como as circunstâncias afortunadas de FU Ori, permitem-nos ver mais profundamente do que nunca o motor deste fascinante tipo de estrela".
// NASA (comunicado de imprensa)
// STScI (comunicado de imprensa)
// Caltech (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal Letters)
Quer saber mais?
FU Orionis:
Wikipedia
Classe de estrelas FU Orionis:
Wikipedia
Simostronomy
Formação estelar:
Wikipedia
Acreção:
Wikipedia
Discos protoplanetários:
Wikipedia
Formação planetária (Wikipedia)
Telescópio Espacial Hubble:
Hubble, NASA
ESA
Hubblesite
STScI
Base de dados do Arquivo Mikulski para Telescópios Espaciais
Arquivo de Ciências do eHST
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