De acordo com uma nova investigação liderada por investigadores da Universidade do Estado da Pensilvânia, nos EUA, e da Universidade de Osaka, no Japão, um sistema planetário invulgar, com três planetas conhecidos e de densidade ultrabaixa, tem pelo menos mais um outro planeta. A equipa de investigação propôs-se estudar Kepler-51 d, o terceiro planeta do sistema, com o Telescópio Espacial James Webb (JWST) da NASA, mas quase perdeu a oportunidade quando o planeta passou inesperadamente em frente da sua estrela duas horas mais cedo do que os modelos previam. Depois de examinarem dados novos e de arquivo de uma variedade de telescópios espaciais e terrestres, os investigadores descobriram que a melhor explicação é a presença de um quarto planeta, cuja atração gravitacional tem impacto nas órbitas dos outros planetas do sistema.
A descoberta do novo planeta é detalhada num artigo publicado dia 3 de dezembro na revista The Astronomical Journal.
"Estes planetas são muito invulgares na medida em que têm uma massa e uma densidade muito baixas", disse Jessica Libby-Roberts, bolseira de pós-doutoramento do Centro para Exoplanetas e Mundos Habitáveis da Penn State e coautora do artigo científico. "Os três planetas anteriormente conhecidos que orbitam a estrela Kepler-51 têm aproximadamente o tamanho de Saturno, mas apenas algumas vezes a massa da Terra, resultando numa densidade semelhante à do algodão doce. Pensamos que têm núcleos minúsculos e atmosferas enormes de hidrogénio e hélio, mas como estes estranhos planetas se formaram e como é que as suas atmosferas não foram destruídas pela intensa radiação da sua jovem estrela tem permanecido um mistério. Planeámos usar o JWST para estudar um destes planetas para ajudar a responder a estas questões, mas agora temos de explicar um quarto planeta de baixa massa no sistema!"
Quando um planeta passa em frente, ou transita, a sua estrela quando visto da Terra, bloqueia alguma da luz estelar, causando uma ligeira diminuição no brilho. A duração e a quantidade dessa diminuição dão pistas sobre o tamanho do planeta e outras características. Os planetas transitam quando completam uma órbita à volta da sua estrela, mas por vezes transitam uns minutos mais cedo ou mais tarde porque a gravidade de outros planetas no sistema os puxa. Estas pequenas diferenças são conhecidas como variações de tempo de trânsito e são incorporadas nos modelos dos astrónomos para lhes permitir prever com precisão quando os planetas vão transitar.
Os investigadores afirmaram não ter razões para acreditar que o modelo de três planetas do sistema Kepler-51 fosse impreciso, e utilizaram com sucesso o modelo para prever o tempo de trânsito de Kepler-51 b em maio de 2023 e acompanharam-no com o telescópio do Observatório de Apache Point para o observar dentro do prazo.
"Também tentámos usar o telescópio Davey Lab de Penn State para observar o trânsito de Kepler-51 d em 2022, mas algumas nuvens bloquearam a nossa visão no momento em que se previa que o trânsito começasse", disse Libby-Roberts. "É possível que tivéssemos descoberto que algo estava errado nessa altura, mas não tínhamos razões para suspeitar que Kepler-51 d não transitaria como esperado quando planeámos observá-lo com o JWST".
"Felizmente começámos a observar algumas horas antes para estabelecer uma linha de base, porque chegaram as 2 da manhã, depois as 3, e ainda não tínhamos observado uma mudança no brilho da estrela com o telescópio de Apache Point", disse Libby-Roberts. "Depois de termos repetido freneticamente os nossos modelos e escrutinado os dados, descobrimos uma ligeira queda no brilho estelar imediatamente quando começámos a observar com o telescópio de Apache Point, o que acabou por ser o início do trânsito - 2 horas mais cedo, o que está muito para além da janela de 15 minutos de incerteza dos nossos modelos!"
Quando os investigadores analisaram os novos dados do telescópio de Apache Point e do JWST, confirmaram que tinham captado o trânsito de Kepler-51 d, embora consideravelmente mais cedo do que o esperado.
"Ficámos realmente intrigados com o aparecimento precoce de Kepler-51 d, e nenhum ajuste fino do modelo de três planetas poderia explicar uma discrepância tão grande", disse Kento Masuda, professor associado de Ciências da Terra e do Espaço na Universidade de Osaka e coautor do artigo científico. "Só a adição de um quarto planeta explica esta diferença. Isto marca o primeiro planeta descoberto por variações de tempo de trânsito usando o JWST".
Para ajudar a explicar o que está a acontecer no sistema Kepler-51, a equipa de investigação revisitou dados anteriores de trânsito do telescópio espacial Kepler e do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite). Também fizeram novas observações dos planetas interiores do sistema, incluindo com o Telescópio Espacial Hubble e o telescópio do Observatório Palomar, e obtiveram dados de arquivo de vários telescópios terrestres. Uma vez que o novo planeta, Kepler-51 e, ainda não foi observado em trânsito - talvez por não passar na linha de visão entre a sua estrela e a Terra - os investigadores notaram a importância de obter o máximo de dados possível para apoiar os seus novos modelos.
"Realizámos o que se chama uma pesquisa de 'força bruta', testando muitas combinações diferentes de propriedades dos planetas para encontrar o modelo de quatro planetas que explica todos os dados de trânsito recolhidos nos últimos 14 anos", disse Masuda. "Descobrimos que o sinal é melhor explicado se Kepler-51 e tiver uma massa semelhante à dos outros três planetas e seguir uma órbita bastante circular de cerca de 264 dias - algo que seria de esperar com base noutros sistemas planetários. Outras soluções possíveis que encontrámos envolvem um planeta mais massivo numa órbita mais larga, embora pensemos que estas são menos prováveis".
Contando com um quarto planeta e ajustando os modelos também altera as massas esperadas dos outros planetas do sistema. De acordo com os investigadores, isto tem impacto noutras propriedades inferidas destes planetas e fornece informações sobre a maneira como se podem ter formado. Embora os três planetas interiores sejam ligeiramente mais massivos do que se pensava anteriormente, continuam a ser classificados como de "algodão doce". No entanto, não é claro se Kepler-51 e é também um planeta deste género, porque os investigadores não observaram um trânsito de Kepler-51 e e, portanto, não podem calcular o seu raio ou densidade.
"Os planetas de densidade ultrabaixa são bastante raros e, quando ocorrem, tendem a ser os únicos num sistema planetário", disse Libby-Roberts. "Tentar explicar como se formam três destes num só sistema já era um grande desafio, agora temos de explicar um quarto, quer seja de densidade ultrabaixa ou não. E também não podemos excluir a existência de outros planetas no sistema".
Dado que os investigadores pensam que Kepler-51 e tem uma órbita de 264 dias, disseram que é necessário mais tempo de observação para obter uma melhor imagem dos impactos da sua gravidade - ou da de planetas adicionais - nos três planetas interiores do sistema.
"Kepler-51 e tem uma órbita ligeiramente maior que a de Vénus e está dentro da zona habitável da estrela, pelo que muito mais poderá estar a ocorrer para lá dessa distância, se nos dedicarmos a observar", disse Libby-Roberts. "A continuação da análise das variações de tempo de trânsito pode ajudar-nos a descobrir planetas que estão mais longe das suas estrelas e pode ajudar na nossa procura de planetas que possam, potencialmente, suportar vida".
Os investigadores estão atualmente a analisar o resto dos dados do JWST, que podem fornecer informações sobre a atmosfera de Kepler-51 d. O estudo da composição e de outras propriedades dos três planetas interiores pode também melhorar a compreensão de como os invulgares planetas de "algodão doce" se formaram, concluíram os investigadores.
// Universidade do Estado da Pensilvânia (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astronomical Journal)
// Artigo científico (arXiv.org)
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CCVAlg - Astronomia:
27/12/2019 - Hubble investiga planetas de "algodão doce"
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