O Universo parece mesmo estar a expandir-se rapidamente. Demasiado depressa, até. Uma nova medição confirma o que resultados anteriores - e muito debatidos - tinham mostrado: o Universo está a expandir-se mais rapidamente do que o previsto pelos modelos teóricos e mais rapidamente do que o que pode ser explicado pela nossa compreensão atual da física.
Esta discrepância entre o modelo e os dados ficou conhecida como a tensão de Hubble. Agora, resultados publicados na revista The Astrophysical Journal Letters dão um apoio ainda mais forte ao ritmo de expansão mais rápido.
"A tensão transforma-se agora numa crise", disse Dan Scolnic, que liderou a equipa de investigação. A determinação do ritmo de expansão do Universo - um valor conhecido como a constante de Hubble - tem sido um objetivo científico importante desde 1929, quando Edwin Hubble descobriu pela primeira vez que o Universo estava em expansão.
Scolnic, professor associado de Física na Universidade de Duke, explica-o como uma tentativa de construir o gráfico de crescimento do Universo: sabemos que tamanho tinha no Big Bang, mas como é que chegou ao tamanho que tem agora? Na sua analogia, a fotografia de bebé do Universo representa o Universo distante, as sementes primordiais das galáxias. A fotografia atual do Universo representa o Universo local, que contém a Via Láctea e as suas vizinhas. O modelo padrão da cosmologia é a curva de crescimento que liga as duas. O problema é que as fotografias não se estão a interligar.
"Isto está a dizer, até certo ponto, que o nosso modelo cosmológico pode estar errado", disse Scolnic.
Medir o Universo requer uma "escada cósmica", que é uma sucessão de métodos usados para medir as distâncias dos objetos celestes, com cada método, ou "degrau", a depender do anterior para calibração.
A escada utilizada por Scolnic foi criada por uma outra equipa utilizando dados do DESI (Dark Energy Spectroscopic Instrument), que observa mais de 100.000 galáxias todas as noites a partir do seu ponto de observação no Observatório Nacional de Kitt Peak.
Scolnic reconheceu que esta escada poderia ser ancorada mais perto da Terra com uma distância mais precisa ao Enxame Galáctico de Coma, um dos enxames de galáxias mais próximos de nós.
"A colaboração DESI fez a parte realmente difícil, a escada deles não tinha o primeiro degrau", disse Scolnic. "Eu sabia como obtê-lo e sabia que isso nos daria uma das medições mais precisas da constante de Hubble que poderíamos obter, por isso, quando o artigo científico deles saiu, larguei absolutamente tudo e trabalhei nisto sem parar".
Para obter uma distância exata do Enxame de Coma, Scolnic e os seus colaboradores, com financiamento da Fundação Templeton, utilizaram as curvas de luz de 12 supernovas do Tipo Ia existentes no enxame. Tal como velas que iluminam um caminho escuro, as supernovas do Tipo Ia têm uma luminosidade previsível que se correlaciona com a sua distância, tornando-as objetos fiáveis para o cálculo de distâncias.
A equipa chegou a uma distância de cerca de 320 milhões de anos-luz, quase no centro do intervalo de distâncias relatadas ao longo de 40 anos de estudos anteriores - um sinal tranquilizador da sua precisão.
"Esta medição não é influenciada pela forma como pensamos que a história da tensão de Hubble vai acabar", disse Scolnic. "Este enxame está no nosso quintal, foi medido muito antes de se saber a sua importância".
Usando esta medição de alta precisão como primeiro degrau, a equipa calibrou o resto da escada de distâncias cósmicas. Chegaram a um valor para a constante de Hubble de 76,5 quilómetros por segundo por megaparsec, o que significa essencialmente que o Universo local está a expandir-se 76,5 quilómetros por segundo mais depressa a cada 3,26 milhões de anos-luz.
Este valor corresponde às medições existentes do ritmo de expansão do Universo local. No entanto, tal como todas essas medições, entra em conflito com as medições da constante de Hubble que utilizam previsões do Universo distante. Por outras palavras: corresponde ao ritmo de expansão do Universo tal como outras equipas a mediram recentemente, mas não como a nossa compreensão atual da física a prevê. A questão de longa data é: a falha está nas medições ou nos modelos?
Os novos resultados da equipa de Scolnic dão um enorme apoio à imagem emergente de que a origem da tensão de Hubble está nos modelos.
"Ao longo da última década, mais ou menos, tem havido muitas reanálises da comunidade para ver se os resultados originais da minha equipa estavam corretos", disse Scolnic, cuja investigação tem desafiado consistentemente a constante de Hubble prevista pelo modelo padrão da física. "Em última análise, apesar de estarmos a trocar tantas peças, continuamos a obter um número muito semelhante. Por isso, para mim, esta é a melhor confirmação de sempre".
"Estamos num ponto em que estamos a pressionar fortemente os modelos que temos vindo a utilizar há duas décadas e meia, e estamos a ver que as coisas não estão a corresponder", disse Scolnic. "Isto pode estar a mudar a forma como pensamos acerca do Universo, e é emocionante! Ainda há surpresas na cosmologia, e quem sabe que descobertas virão a seguir?"
// Universidade de Duke (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal Letters)
Quer saber mais?
Universo:
A expansão acelerada do Universo (Wikipedia)
Universo (Wikipedia)
Lei de Hubble (Wikipedia)
Determinando a constante de Hubble (Wikipedia)
Idade do Universo (Wikipedia)
Estrutura a grande-escala do Universo (Wikipedia)
Big Bang (Wikipedia)
Cronologia do Big Bang (Wikipedia)
Modelo Lambda-CDM (Wikipedia)
Indicadores de distâncias cósmicas (Wikipedia)
"Escada" de distâncias cósmicas (Wikipedia)
Enxame Galáctico de Coma:
Wikipedia
Supernovas:
Wikipedia
Tipo Ia (Wikipedia)
DESI (Dark Energy Spectroscopic Instrument):
Página oficial
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