Ainda não descobriram como retirar sangue de rochas, mas um grupo de cientistas franceses está a recolher novos dados que podem alterar o modo como os cientistas pesquisam por sinais de vida nas rochas marcianas.
Ao estudar a fossilização laboratorial de microorganismos, cientistas obtiveram um breve olhar de como a potencial vida terrestre e marciana poderá ter sido preservada em rochas. Os cientistas focaram-se sobre Pyrococcus abyssi e Methanocaldococcus jannaschii, extremófilos que prosperam em ambientes muito quentes (80º C) e sem oxigénio (<0,2% dos níveis actuais).
Alguns acreditam que foi neste tipo de ambiente, quente e anóxico, que a vida começou na Terra, e até mesmo em Marte.
"As condições ambientais eram similares nos jovens planetas terrestres e traços de vida marciana poderão ter sido similarmente preservados como microfósseis silicificados," escrevem os cientistas no seu estudo, que apareceu na edição de Setembro da revista Geobiology.
Na Terra, alguns fósseis são criados quando os microorganismos são capturados em fluxos concentrados de sílica e outros minerais perto de fontes hidrotermais. Em vez de estudar vulcões hidrotermais existentes nos oceanos ou em nascentes termais, os cientistas imitaram este processo de fossilização natural em laboratório. Isto permitiu-lhes imitar mais de perto os ambientes sem-oxigénio de uma jovem Terra e de um jovem Marte.
Os efeitos observados nos dois organismos foram bastante diferentes. A maioria das células M. jannaschii colapsou e morreu numa semana. Deixaram para trás apenas subtis traços orgânicos, após a inoculação com uma solução de sílica. Muitas das características de P. abyssi persistiram quase 4 meses após a inoculação. Isto criou uma janela maior para a potencial preservação.
"Eles realmente fossilizaram um bocado, mas não o suficiente para sobreviver ao tempo," afirma Frances Westall, paleobióloga do Centro Nacional de Pesquisa Científica em Orleães, França, que supervisou o trabalho da equipa de pesquisa.
Dorothy Oehler do Centro Espacial Johnson da NASA, que não esteve envolvida no estudo, diz que embora os organismos no estudo não tenham fossilizado particularmente bem, muitos fósseis antigos foram descobertos preservados em sílica. Isto indica que outros micróbios estudados sobre diferentes condições podem oferecer um maior potencial para a fossilização.
Os cientistas notaram no seu estudo que uma substância em particular, produzida pelo micróbios, consegue permanecer por mais tempo. Esta substância pode contar como prova de vida, mesmo que os próprios corpos já não existam.
Os corpos mortos e fossilizados podem ser difíceis de descobrir em rochas antigas. Muitas rochas foram já mastigadas e cuspidas pelo programa de reciclagem tectónica da Terra, que puxa as rochas para baixo da crosta e as aquece. Outras rochas que conseguem evitar este processo geológico estão ainda sujeitas à degradação pelo vento ou pela chuva. Os cientistas conseguem contornar estes problemas ao procurar evidências de vida que possa sobreviver com o passar do tempo, tal como as biomoléculas. Ao procurar substâncias associadas à vida, os cientistas podem determinar se a vida existiu ou não aquando da formação das rochas.
Algumas rochas são formadas quando poeira é capturada em biofilmes - uma espécie de película pegajosa criada quando os micróbios excretam substâncias tipo-verniz denominadas "substâncias poliméricas extracelulares", ou SPE. Depois da morte dos organismos nestes biofilmes, a poeira nestas matrizes transforma-se em pedra ("litifica"). Antigos biofilmes litificados contêm provas químicas da vida que os criou.
Este novo estudo relça que as SPE libertadas pelos micróbios fossilizam rapidamente, tornando-se parte da rocha. Por causa disto, as SPE podem estar na lista de substâncias biológicas que indicam a presença passada de vida.
Oehler realça, no entanto, que SPEs numa rocha podem ser o resultado da entrada de organismos nos poros de uma rocha, mas muito tempo depois de se ter formado. Isto significa que embora as SPEs possam ser um indício de vida, testes adicionais têm que ser feitos para determinar se a SPE é da mesma idade que a rocha ou se foi introduzida por micróbios colonos um determinado tempo depois.
Saber quando a vida estava presente é algo importante para os cientistas que estudam o crescimento da vida na Terra. Muitos acreditam que a vida apareceu há 3,5 mil milhões de anos atrás ou mesmo até antes, mas os fósseis que datam até aí estão envolvidos em muita controvérsia. Embora alguns cientistas argumentem que as formas microscópicas mostram fortes provas de terem já sido vida, outros afirmam que estes denominados fósseis são apenas depósitos minerais não-biológicos.
A descoberta de quando é que a vida começou na Terra tem implicações para a pesquisa de vida em Marte. Pensa-se que os ambientes da jovem Terra e do jovem Marte tenham sido muito parecidos num passado distante. Existem provas que a superfície marciana já esteve coberta por oceanos, lagos e rios há 3,5 mil milhões de anos, e estas condições ricas em água podem ter persistido episodicamente no Planeta Vermelho até há 3 mil milhões de anos. Novas descobertas mostram que água gelada situa-se actualmente mesmo por baixo da superfície marciana. Se Marte era tipo-Terra por volta da mesma altura que a vida emergiu no nosso planeta, então parece ser possível que a vida também tenha emergido em Marte.
"Se a vida surgiu em Marte, então existe uma grande probabilidade que traços dessas formas de vida tenham ficado preservadas através da fossilização com sílica ou outros minerais," escrevem os cientistas. "Dado que muitos microfósseis antigos da Terra estão preservados numa forma de sílica denominada cherte, isto proporciona esperança para a descoberta de possíveis formas de vida passada em Marte."
Embora os rovers Spirit e Opportunity estejam ainda a investigar a superfície de Marte, não são capazes de estudar as rochas em detalhe suficiente para descobrir evidências de vida. "Tivémos que usar tecnologias de alta-resolução para estudar os microfósseis," diz Westall. "Não podemos fazer isto em Marte. A conclusão a que chegámos é que precisamos de estudar rochas cuidadosamente escolhidas e trazidas de Marte até à Terra."
Links:
Marte:
Núcleo de Astronomia do CCVAlg
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