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PHOBOS PODERÁ SER O PRÓXIMO GRANDE SALTO DA HUMANIDADE
2 de Fevereiro de 2010

 

Phobos é um nome que irá começar a ouvir bastante nos próximos anos. Pode ser pouco mais que um asteróide - com apenas dois mil milionésimos da massa do nosso planeta, sem atmosfera e quase sem gravidade -, mas a maior das duas luas de Marte está destinada a tornar-se no nosso próximo posto no espaço, a nossa segunda casa.

Embora a nossa própria Lua esteja aqui bem perto, a sua gravidade implica o uso de foguetões relativamente grandes de modo a levar os astronautas para e da sua superfície. O mesmo se aplica a Marte, o que torna o lançamento de missões ao Planeta Vermelho também algo dispendioso - talvez até proibitivamente caro, a acreditar na revisão da política de exploração espacial da NASA pelo Presidente Barack Obama. Em Outubro passado, um comité de especialistas independentes, liderado pelo industrialista Norman Augustine, concluíu que a NASA necessitaria de cerca de 3 mil milhões de dólares por ano, a mais, se quisesse realmente enviar astronautas de volta à Lua - já sem falar de Marte - até 2020. Mas isso não quer dizer que os seres humanos não têm mais lugares para onde ir.

Uma opção que o relatório Augustine sugeriu levaria tripulações da NASA até asteróides vizinhos e até aos satélites de Marte. "O custo bruto de uma missão a Marte está em fazer chegar e trazer os astronautas da superfície," diz Pascal Lee, presidente do Instituto de Marte em Moffett Field, Califórnia, EUA. "Se esperarmos até que tudo esteja pronto, passar-se-ão décadas. Phobos oferece-nos uma maneira de chegar à porta de Marte."

Dado que Phobos é tão pequeno, o campo gravitacional que gera é muito fraco, tão fraco que uma vez que alcançássemos órbita marciana, necessitaríamos apenas de poucos impulsos para aterrar e descolar de Phobos. Isto significa que é mais barato e fácil enviar naves até à distante lua Phobos, do que à superfície da nossa própria Lua.

A partir de Phobos podíamos facilmente explorar a superfície de Marte usando telescópios ou rovers controlados remotamente, antes de fazer a descida final até à superfície do planeta quando houvesse dinheiro.

Mas Phobos tem mais que se lhe diga: não é apenas um ponto de paragem conveniente - é muito mais. Phobos é um mistério espacial gigante. "Sabemos como são todos os corpos do Sistema Solar, à excepção de Phobos," afirma Lee. "Não sabemos como é que se formou."

Phobos foi descoberto, conjuntamente com a sua irmã mais pequena, Deimos, em 1877 pelo astrónomo americano Asaph Hall no Observatório Naval dos Estados Unidos em Washington, DC. Durante grande parte dos anos que seguiram, os pequenos tamanhos das luas relegaram-nas para meras notas de rodapé nos livros de Astronomia. Phobos é uma rocha irregular com menos de 28 km de diâmetro, e Deimos é ainda mais pequena. Por isso têm sido ignoradas como pequenas rochas espaciais que se aproximaram demasiado de Marte e tiveram o azar de ser capturadas pela sua gravidade.

Esta visão foi amparada pelas primeiras medições da composição de Phobos, obtidas pelas sondas Mariner 9 e Vikings 1 e 2 nos anos 70. A luz solar reflectida da superfície mostrou que Phobos era escura, absorvendo mais de 90% da luz solar, e que se assemelhava com meteoritos condritos-carbonáceos. Pensa-se que estes antigos objectos celestes sejam originários das partes mais longínquas da cintura de asteróides, ao dobro da distância de Marte ao Sol. As medições mais recentes de Phobos revelaram uma parecença mais íntima com asteróides ainda mais antigos, descobertos apenas no Sistema Solar exterior, bem para lá da cintura de asteróides principal. O mesmo se verificou com Deimos.

São então asteróides capturados? Não é bem assim. As órbitas que estas luas seguem não são o que seria de esperar para corpos capturados. Em vez de orbitarem numa órbita aleatoriamente inclinada, como aconteceria se tivessem sido capturadas em alturas diferentes, tanto Phobos como Deimos seguem percursos que se situam perto do plano equatorial de Marte. O que se passa?

As órbitas equatoriais implicam que as luas se formaram no mesmo local e da mesma nuvem que coalesceu para formar Marte. Mas se isto for verdade, então a composição das luas não faz sentido; Phobos e Deimos deveriam ser parecidas com as rochas marcianas, e não com asteróides condritos-carbonáceos. Num esforço de compreender a composição e assim a origem de Phobos, a sonda Mars Express da ESA fez uma corajosa sequência de passagens rasantes, a um mínimo de 460 km da lua, em 2006, e 270 km em 2008.

A esta distância, a minúscula gravidade de Phobos alterou a velocidade da sonda por apenas alguns milímetros por segundo. Não obstante, os controladores da missão cá na Terra conseguiram identificar o seu efeito no seguimento do seu sinal de rádio - uma variação no sinal de apenas uma parte em um bilião.

"Foi um feito incrível, da parte de quem esteve envolvido," afirmou Martin Pätzold da Univeridade de Cologne na Alemanha e líder da experiência científica de rádio da Mars Express. Isto permitiu com que a massa de Phobos fosse medida com 100 vezes a precisão anterior, e também levantou a possibilidade da lua se tornar numa "sonda fiduciária" para melhor estudar a estrutura interna de Marte.

Durante os voos rasantes, a câmara HRSC a bordo da Mars Express mapeou a superfície de Phobos, o que levou à construção do modelo tridimensional mais preciso da lua jamais obtido e à medição do seu volume. Embora seja muito menos preciso que a sua massa, a determinação do volume permite a determinação da densidade média usando o valor ultra-preciso da massa. O que daqui emerge é um dos paradoxos mais interessantes da lua.

"A densidade média é inesperadamente baixa. Deve ser um corpo poroso," afirma Pätzold. Por isso em vez de ser um simples bocado de rocha sólida, deve ter provavelmente vastas cavernas no seu interior, o que pode proteger os futuros astronautas dos malefícios da radiação espacial.

No entanto, sem amostras do satélite, a sua composição permanece largamente desconhecida. Se for um asteróide capturado, o material de que é feito será menos denso que uma rocha vulgar, e a fracção oca rondará os 15%. Se a lua tiver uma composição equivalente à das rochas marcianas, então o vazio interior de Phobos deve ser maior: à volta de 45%.

Estas ideias dão dores de cabeça aos cientistas planetários. Se Phobos for constituído por rochas tipo-Marte, o tamanho deste vazio significa que a probabilidade da lua se ter formado a partir dos pequenos grãos de poeira em órbita de Marte, enquanto este se formava por baixo, é baixa, pois isto levaria à formação de um corpo sólido. Como alternativa, Pätzold e Pascal Rosenblatt do Observatório Real da Bélgica em Bruxelas, favorecem uma sequência de eventos na qual um impacto gigante em Marte expeliu grandes quantidades de detritos para órbita. Estes então coalesceram em ângulos fortuitos para formar o aglomerado que agora chamamos de Phobos.

Para testar esta sugestão, a Mars Express irá revisitar a lua em Março para o seu "flyby" mais rasante de sempre. A sonda passará a uns meros 60 km da superfície, fornecendo à equipa os primeiros vestígios do campo gravítico de Phobos.

"O campo gravitacional está relacionado com a distribuição interna da massa," afirma Rosenblatt. Por isso, quando a Mars Express estiver por cima de um vazio interior, não será tão influenciada como quando estiver por cima de rocha sólida.

Os investigadores irão também usar o instrumento MARSIS (Mars Advanced Radar for Subsurface and Ionospheric Sounding) para estudar o interior de Phobos. Durante os voos rasantes anteriores, a equipa do MARSIS descobriu como ressaltar o seu radar da lua. Agora esperam usar este radar penetrante para observar o seu interior. "Estamos confiantes em observar estruturas subsuperficiais em Março, mas aqui entram em jogo muitos factores," afirma Andrea Cicchetti do Instituto Italiano de Física de Ciência Interplanetária em Roma, que pertence à equipa do MARSIS.

A equipa é especialmente dotada para determinar a composição da lua cujo espectro sugere a hipótese de asteróide capturado. Rosenblatt pensa, no entanto, que existe uma clásula de fuga. "O espectro superficial pode ser o resultado da influência de milhares de milhões de anos de clima espacial," afirma. Sem uma atmosfera para as proteger, as rochas marcianas que coalesceram para formar Phobos podem ter sido alteradas superficialmente pelas partículas carregadas libertadas pelo Sol ao longo de milhares de milhões de anos, mascarando a sua verdadeira identidade e enganando os espectómetros. A solução? Aterrar em Phobos e trazer amostras para estudo cá na Terra.

Isto é exactamente o que a Rússia planeia fazer no final de 2011 com a sonda Phobos-Grunt (Phobos-solo em russo). "Não podemos compreender a origem de Phobos sem saber a composição da lua, e a Phobos-Grunt dir-nos-á isso mesmo," afirma Rosenblatt.

A Phobos-Grunt poderá até providenciar aos cientistas planetários informações cruciais acerca do próprio Planeta Vermelho. Durante os últimos quatro mil milhões de anos, os impactos de meteoritos em Marte devem ter expelido detritos para órbita. Phobos deve ter "arado" através destas correntes de detritos, algumas das quais deviam conter grandes bocados de rocha, como demonstrado pela cratera com 9 quilómetros de diâmetro em Phobos, a Stickney.

A maioria dos impactos teriam sido bem mais pequenos, o que provavelmente explica as "estrias" que abundam na superfície de Phobos. O mapa recente pela Mars Express mostrou que estas linhas são originárias do apogeu principal de Phobos, o ponto que está sempre virado na direcção do movimento da lua e é por isso o alvo natural para estes detritos.

O facto excitante é que a Natureza tem recolhido amostras de Marte há já milhares de milhões de anos e armazenou-as em Phobos - um dos locais mais fáceis de alcançar em todo o Sistema Solar. O que apenas precisamos de fazer é ir lá buscá-las. "Phobos é a Biblioteca de Alexandria de Marte," afirma Lee. "As amostras do jovem planeta Marte podem estar muito melhor preservadas em Phobos do que em Marte propriamente dito." Podem até conter a assinatura química de vida marciana, embora Lee realce fortemente o "pode" na afirmação.

E a Phobos-Grunt pode ser apenas a primeira numa linha de missões cada vez mais ambiciosas à maior lua de Marte. "Marte deve permanecer o destino final para a exploração tripulada," diz Leroy Chiao, antigo astronauta e membro do comité Augustine. "Mas se nós [o comité] tivéssemos pedido directamente o dinheiro necessário para aterrar em Marte, teríamos perdido credibilidade."

Para criar uma ponte, Lee encara Phobos como uma paragem ideal enquanto as técnicas e equipamentos necessários para aterrar em Marte são desenvolvidos pela NASA. Ele já estudou a viabilidade de uma hipotética missão canadiana a Phobos. Ele argumentou o seu caso tão bem que Lee está agora envolvido num estudo parecido para a NASA.

Ele realça que só o ir a Phobos permitiria aos astronautas praticar técnicas-chave para alcançar órbita marciana, como a aerotravagem, na qual uma nave perde velocidade ao "surfar" a atmosfera do planeta.

E mais: a lua poderia ter um armazém de peças de foguetão e outros equipamentos, construídos com o passar do tempo por missões robóticas. Quando os astronautas aí chegassem, equipamentos gastos ou avariados poderiam ser facilmente substituídos.

Se a missão da NASA seguir em frente, teria como alvo uma espectacular estrutura em Phobos conhecida como o Monolito. Esta plataforma rochosa sólida eleva-se da superfície até 90 metros.

A sonda aterraria perto do monolito, e poderia estudar a rocha exposta, e depois viajar até outra parte da lua e recolher mais amostras. Levantaria depois voo e viajaria até Deimos, para recolher amostras da lua mais pequena. Finalmente, regressaria à Terra. "Seria uma missão excitante," afirma Lee. "A missão poderia descolar da Terra cinco anos após a obtenção de um orçamento."

Está agora nas mãos da Casa Branca, enquanto estudam o Relatório Augustine. Nem mesmo Chiao sabe o resultado provável destas deliberações. "Tal como todos nós, estou apenas à espera que o governo decida como quer agir," afirma.

Aterrar em Phobos é uma maneira de ficar mais perto de Marte. Mas decerto que seria como viajar até um destino e não ter a coragem de bater à porta? Segundo Lee, não. "Existem imensas pessoas que quereriam ir nesta viagem espacial, incluíndo eu," afirma. "Só a vista de Marte seria de cortar a respiração."

Chiao, no entanto, afirma que seria duro fazer parte de uma viagem apenas a Phobos. "Para mim, é difícil imaginar percorrer todo este caminho e não alcançar a superfície de Marte," acrescenta. "Mas se tivesse que escolher entre Phobos e nada, escolhia sempre Phobos!"

Links:

Núcleo de Astronomia do CCVAlg:
12/04/08 - MRO captura imagens de lua de Marte, a cores e em 3D
18/10/08 - ESA aproxima-se da verdadeira origem da maior lua de Marte

Phobos:
Núcleo de Astronomia do CCVAlg
Wikipedia
Monolito (Wikipedia)

Marte:
Núcleo de Astronomia do CCVAlg
Wikipedia

Mars Express:
Página oficial da ESA
Wikipedia

Phobos-Grunt:
Vídeo do projecto Phobos-Grunt (cortesia YouTube; em russo)
Wikipedia

 


A lua de Marte, Phobos.
Crédito: ESA/DLR/FU Berlin (G. Neukum)
(clique na imagem para ver versão maior)


A câmara HiRISE a bordo da sonda MRO da NASA tirou esta imagem da maior das duas luas de Marte, Phobos, a 23 de Março de 2008, a uma distância de 6800 km.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Uinversidade do Arizona
(clique na imagem para ver versão maior e em cores mais falsas)


Modelo 3D de Phobos, com texturas baseadas em imagens reais.
Crédito: ESA/DLR (K. Willner)/FU Berlin (G. Neukum)
(clique na imagem para ver animação em formato MPEG)


Impressão de artista do radar MARSIS.
Crédito: ESA
(clique na imagem para ver versão maior)


Impressão de artista da sonda Phobos-Grunt.
Crédito: Agência Espacial Russa
(clique na imagem para ver versão maior)


Imagem do Monolito, obtida pela sonda Mars Global Surveyor em 1998. Esta rocha encontra-se a poucos quilómetros Esta da cratera Stickney.
Crédito: NASA/USGS
(clique na imagem para ver versão maior)

 
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