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A QUÍMICA ESCONDIDA DO GELO DE EUROPA
5 de Outubro de 2010

 

O frígido gelo da lua de Júpiter, Europa, pode estar a esconder mais do que um oceano: provavelmente pode estar a acontecer uma reacção química rápida entre a água e o dióxido de enxofre a temperaturas extremamente frias. Embora estas moléculas reajam facilmente com líquidos - são ingredientes bem-conhecidos da chuva ácida - Mark Loeffler e Reggie Hudson do Centro Aeroespacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, EUA, anunciaram que reagem como gelos a surpreendente velocidade e alto rendimento a temperaturas centenas de graus abaixo do ponto de congelação. Dado que esta reacção ocorre sem a ajuda de radiação, pode acontecer por todo o espesso manto de gelo de Europa - um resultado que pode reavivar o pensamento actual acerca da química e geologia desta lua, e talvez até de outras.

"Quando se fala acerca da química de Europa, normalmente discutem-se as reacções dirigidas pela radiação," afirma Mark Loeffler, cientista do Centro Goddard, autor principal do artigo publicado na revista Geophysical Research Letters. Isto porque a temperatura da lua varia entre os 86 e 130 Kelvin. Neste frio extremo, a maioria das reacções químicas requerem uma infusão de energia a partir de radiação ou luz. Em Europa, a energia vem das partículas das cinturas de radiação de Júpiter. Dado que a maioria destas partículas penetra apenas fracções de uma polegada da superfície, os modelos da química de Europa normalmente param aí.

"Por baixo da superfície de Europa, está frio e é sólido, e normalmente não esperamos que as coisas aconteçam muito depressa sob estas condições," explica o co-autor Reggie Hudson, também de Goddard.

"Mas com a química que descrevemos," afirma Loeffler, "podemos ter gelo com uma espessura de 10 ou 100 metros, e se houver uma mistura de dióxido de enxofre, temos uma reacção."

"Este é um resultado extremamente importante para a compreensão da química e da geologia da crosta gelada de Europa," afirma Robert E. Johnson, especialista acerca da química induzida por radiação em planetas e professor da Universidade da Virginia em Charlottesville, EUA.

A partir de observações remotas, os astrónomos sabem que existe enxofre no gelo de Europa. O enxofre vem dos vulcões da lua de Júpiter, Io, torna-se ionizado e é transportado para Europa, onde fica embebido no gelo. Mais enxofre pode vir do oceano que se pensa estar situado por baixo da superfície de Europa. "No entanto," salienta Johnson, "o destino do enxofre implantado ou de qualquer enxofre subsuperficial não é bem compreendido e depende da geologia e da química da crosta gelada."

Em experiências que simularam as condições em Europa, Loeffler e Hudson pulverizaram vapor de água e dióxido de enxofre em espelhos com o tamanho de moedas numa câmara de vácuo. Dado que os espelhos estavam a uma temperatura entre 50 e 100 K, os gases imediatamente condensaram-se como gelo. À medida que a reacção prosseguia, os investigadores usaram espectroscopia infravermelha para observar a diminuição das concentrações de água e dióxido de enxofre e o aumento nas concentrações de iões positivos e negativos gerados.

Apesar do frio extremo, as moléculas reagem rapidamente nas suas formas geladas. "A 130 Kelvin, que representa o extremo morno das temperaturas esperadas em Europa, esta reacção é essencialmente instantânea," afirma Loeffler. "A 100 K, podemos saturar a reacção após meio-dia até um dia. Se isso não soa rápido, há que lembrar que em escalas de tempo geológicas - milhares de milhões de anos - um dia é bem mais rápido que um piscar de olho."

Para testar a reacção, os investigadores acrescentaram dióxido de carbono gelado, também conhecido como gelo seco, normalmente encontrado nos corpos gelados, incluindo Europa. "Se o dióxido de carbono gelado tivesse bloqueado a reacção, não estaríamos tão interessados," explica Hudson, "porque aí a reacção provavelmente não seria tão relevante para a química de Europa. Seria apenas uma curiosidade laboratorial." Mas a reacção continuou, o que significa que é importante em Europa bem como em Ganimedes e em Calisto, duas outras luas de Júpiter, e noutros locais onde água e dióxido de enxofre estão presentes.

A reacção converteu um-quarto até quase um-terço do dióxido de enxofre. "Foi um rendimento inesperadamente alto para esta reacção química," afirma Loeffler. "Teríamos ficado contentes com 5%." Adicionalmente, os iões positivos e negativos produzidos reagem depois com outras moléculas. Isto pode levar a uma química intrigante, especialmente porque bissulfito, um tipo de ião de enxofre, e outros produtos desta reacção, são refratariamente estáveis o suficiente para aí permanecer durante algum tempo.

Robert Carlson, cientistas do JPL da NASA em Pasadena, Califórnia, que colabora com os dois investigadores, nota que pistas de água e dióxido de enxofre reagindo como sólidos já tinham sido descobertas mas não explicadas. "Os resultados de Loeffler e Hudson mostram a existência de reacções ácido-base realmente interessantes," afirma. "Estou ansioso por ver o que acontece quando se inserem outras espécies e como as menores concentrações de dióxido de enxofre na superfície do satélite afectam a química geral."

O derradeiro teste das experiências laboratoriais será saber se as evidências de quaisquer produtos das reacções podem ser descobertas em dados recolhidos durante observações remotas ou em visitas futuras a Europa. Johnson concorda que se o dióxido de enxofre subsuperficial em Europa "reage para formar espécies refractárias, como indicado, então o quadro muda completamente." Estes resultados não só afectam o nosso conhecimento de Europa, mas também podem ser refinados e testados com a proposta missão ao sistema Europa-Júpiter.

Links:

Notícias relacionadas:
NASA (comunicado de imprensa)
Geophysical Research Letters (requer subscrição)
PHYSORG.com
Universe Today

Europa:
Núcleo de Astronomia do CCVAlg
Wikipedia

 
Europa, observada pela sonda Galileu.
Crédito: NASA/JPL/DLR
(clique na imagem para ver versão maior)
 
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