Embora a maioria dos 500 exoplanetas, ou planetas para lá do nosso Sistema Solar, descobertos até à data, sejam demasiado quentes para serem habitáveis, a probabilidade de descobrirmos um exoplaneta pequeno e frio o suficiente para hospedar vida deverá aumentar durante os próximos anos à medida que a tecnologia melhora. Telescópios maiores e melhores deverão ajudar os astrónomos a estudar as atmosferas de planetas extrasolares mais pequenos e a determinar se contêm moléculas como água e oxigénio, essenciais para a vida como a conhecemos.
Uma pista importante acerca da atmosfera e do interior de um planeta é a proporção de carbono para oxigénio na sua atmosfera. Os planetas rochosos, ou terrestres, no Sistema Solar - Mercúrio, Vénus, Terra e Marte - têm todos mais oxigénio que carbono, tal como o Sol, que tem um rácio carbono-oxigénio de 1 para 2, ou 0,5. Mas esta relação não é conhecida para os planetas gigantes como Júpiter (318 vezes a massa da Terra) porque a água, o portador principal do oxigénio, está apenas presente nas profundezas das suas atmosferas e é por isso difícil de medir. Durante anos, os astrónomos têm desenvolvido modelos de todas as atmosferas e interiores exoplanetários com base no pressuposto que a proporção carbono-oxigénio seria também 0,5.
Mas uma equipa liderada por um antigo investigador pós-doutoral do Departamento de Ciências Terrestres, Atmosféricas e Planetárias do MIT, e do Instituto Kavli para Astrofísica, também do MIT, recentemente mediu a primeira atmosfera substancialmente rica em carbono. Os cientistas descobriram que o rácio carbono-oxigénio de WASP-12b, um exoplaneta com 1,4 vezes a massa de Júpiter e localizado a cerca de 1200 anos-luz de distância, é maior que 1. Um artigo publicado na edição da passada Quarta-feira da revista Nature explica que esta atmosfera rica em carbono suporta a possibilidade de exoplanetas rochosos serem compostos puramente por rochas de carbono, como diamante ou grafite, em vez de rochas com base em sílica, encontradas cá na Terra.
"Este é um novo território e vai motivar investigadores a estudar como é que poderão ser os interiores de planetas ricos em carbono," afirma Nikku Madhusudhan, autor principal do estudo, agora investigador pós-doutoral da Universidade de Princeton. Embora WASP-12b seja um "Júpiter Quente", um exoplaneta com o tamanho de Júpiter, extremamente quente, constituído na sua maioria por gás e sem superfície para albergar vida, pode potencialmente ter um interior sobre a forma de diamante ou grafite. A primeira descoberta de um exoplaneta rico em carbono introduz uma classe inteiramente nova de exoplanetas exóticos para explorar. É também possível que exoplanetas rochosos e com o tamanho da Terra, possam também ter-se formado em torno da mesma estrela que WASP-12b há milhares de milhões de anos. Se detectados, estes planetas mais pequenos podem também ter atmosferas e interiores ricos em carbono, o que significa que para a vida existir nesses planetas, terá que sobreviver com muito pouca água e oxigénio e muito metano, afirma Madhusudhan. Esta hipótese poderá não ser muito rebuscada, tendo em conta o anúncio da semana passada da descoberta, cá na Terra, de bactérias que conseguem sobreviver com arsénico, um veneno para nós, seres humanos.
Os astrónomos conseguem determinar a composição atmosférica de um planeta ao observar a luz reflectida pelo planeta em diferentes comprimentos de onda. A equipa, coordenada por Joe Harrington, cientista planetário da Universidade da Flórida Central, EUA, usou o Telescópio Espacial Spitzer da NASA para observar WASP-12b antes de passar por trás da sua estrela, um evento conhecido como eclipse secundário. Estas observações foram então combinadas com observações previamente publicadas e obtidas na Terra usando o Telescópio do Canadá-França-Hawaii no Hawaii. O planeta foi descoberto em 2009 por investigadores do Reino Unido do WASP (Wide Angle Search for Planets), que são também co-autores do estudo.
Madhusudhan usou as observações para levar a cabo uma análise atmosférica detalhada usando uma técnica pioneira no estudo de atmosferas exoplanetárias. O programa informático que desenvolveu combina certas variáveis, tais como a distribuição de temperatura do planeta, com diferentes quantidades das moléculas mais proeminentes que existem em tais atmosferas, que são o metano, dióxido de carbono, monóxido de carbono, vapor de água e amónia, numa única fórmula que produz valores teóricos. O programa analisa milhões de combinações destas variáveis, seguindo aquelas que melhor coincidem com os valores medidos pelos telescópios. Através da análise estatística destes valores, Madhusudhan e sua equipa podem determinar a composição mais provável da atmosfera.
Com base em teorias da composição de "Júpiteres Quentes" como WASP-12b, assumindo um rácio carbono-oxigénio de 0,5, os modelos anteriores sugeriam que as suas atmosferas deveriam ter grandes quantidades de vapor de água, muito pouco metano e uma camada atmosférica conhecida como estratosfera. Ao invés, a equipa de Madhusudhan detectou uma atmosfera com 100 vezes mais metano e menos água que o esperado. A composição observada é consistente com um rácio carbono-oxigénio maior que um. A equipa também descobriu a ausência de uma estratosfera forte, o que contradiz as teorias actuais das atmosferas de "Júpiteres Quentes".
A descoberta sugere que os bocados de rocha, planetesimais, que se aglomeraram para formar WASP-12b há milhares de milhões de anos atrás, podiam ser constituídos por compostos ricos em carbono, como alcatrão - muito longe dos planetesimais gelados, ricos em água, que se pensa terem formado os planetas do Sistema Solar. Isto significa que se exoplanetas mais pequenos forem descobertos e tiverem atmosferas ricas em carbono, as suas superfícies podem estar cobertas por uma substância tipo-alcatrão. Estudos futuros irão investigar se a vida - talvez drasticamente diferente da que conhecemos - poderá sobreviver num ambiente tão rico em carbono.
"É excitante só pensar na possibilidade" de planetas ricos em carbono, afirma Adam Showman, cientista planetário da Universidade do Arizona, que explica que embora os cientistas já soubessem de outros sistemas com uma invulgar proporção carbono-oxigénio, "este estudo move finalmente a discussão de pura especulação para realidade plausível." Ele realça que os planetas extrasolares com interiores ricos em carbono podem exibir um conjunto de características superficiais, composições atmosféricas e potencial para oceanos ou vida.
No futuro, Madhusudhan planeia estudar exoplanetas de diferentes tamanhos e temperaturas para determinar quão comuns são estas atmosferas ricas em carbono. Irá também desenvolver novos modelos de exoplanetas ricos em carbono para investigar a formação de tais planetas, que materiais poderão ter existido nos seus interiores e que tipo de vida poderá sobreviver com muito pouca água e oxigénio, e muito metano.
Links:
Núcleo de Astronomia do CCVAlg:
21/05/10 - Hubble descobre uma estrela a comer um planeta
Notícias relacionadas:
NASA (comunicado de imprensa)
MIT (comunicado de imprensa)
SPACE.com
Universe Today
PHYSORG.com
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ScienceNews
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WASP-12b:
Wikipedia
WASP:
Site oficial
Wikipedia
Telescópio Espacial Spitzer:
Página oficial
NASA
Centro Espacial Spitzer
Wikipedia
Planetas extrasolares:
Wikipedia
Wikipedia (lista)
Wikipedia (lista de extremos)
Catálogo de planetas extrasolares vizinhos (PDF)
PlanetQuest
Enciclopédia dos Planetas Extrasolares
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Impressão de artista do exoplaneta extremamente quente WASP-12b e da sua estrela-mãe.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
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