ROVER PERSEVERANCE A POUCOS DIAS DE POUSAR EM MARTE 9 de fevereiro de 2021
Briony Horgan, professora associada de Ciências da Terra, Atmosféricas e Planetárias na Universidade Purdue, está a trabalhar para determinar se estamos sozinhos no Universo ou se existiu vida noutros planetas como Marte.
Crédito: Universidade Purdue/John Underwood
Quando o rover Perseverance da NASA pousar dia 18 de fevereiro na superfície de Marte, fá-lo-á na Cratera Jezero, que preserva evidências de uma época em que os rios fluíam no Planeta Vermelho.
A missão dará o próximo salto na ciência espacial, procurando sinais de vida passada. Não os marcianos da ficção científica, mas micróbios antigos que podem ter vivido nos rios e lagos há milhares de milhões de anos.
Este local de aterragem cientificamente importante no interior da Cratera Jezero foi selecionado pela NASA após uma apresentação por Briony Horgan, professora associada de ciências planetárias da Universidade Purdue, que é membro da equipa científica do Perverance. Horgan liderou um estudo da mineralogia do local, que produziu um dos principais resultados que contribuíram para a sua seleção. Ela também fez parte da equipa que projetou a câmara que será os olhos científicos do Perseverance.
A missão
A missão principal do rover Perseverance é procurar sinais de vida passada em Marte. Horgan e colegas abordam o trabalho como detetives forenses, em busca de pistas e evidências literalmente microscópicas.
Qualquer vida que já possa ter existido no Planeta Vermelho teria deixado pistas químicas que os cientistas esperam ainda estar presentes nas rochas.
"O objetivo desta missão é procurar sinais de vida passada em Marte e também recolher amostras para um futuro envio à Terra," diz Horgan. "É possivelmente a única chance que teremos de fazer as duas coisas, especialmente o envio de amostras. É muito difícil de fazer e é caro."
"Sabemos que poderíamos ter apenas esta chance de fazer isto, e foi difícil selecionar o local. Se tivéssemos que escolher apenas um local na Terra para reunir todos os dados sobre toda a história do planeta - bem, para onde é que nos dirigíamos? Mas nós pensamos que a Cratera Jezero é o melhor local para procurar evidências de que existiu vida em Marte, se é que alguma vez existiu. E o que encontrarmos ajudar-nos-á a saber mais sobre se estamos ou não sozinhos no Universo."
O Perseverance vai passar o seu tempo a tirar fotos, vídeos, a pulverizar rochas com lasers (para que os cientistas possam determinar a sua composição química), a usar microscópios para procurar moléculas orgânicas, a perfurar, a analisar e a fazer uma variedade de tarefas científicas. Isto vai produzir enormes volumes de dados que os cientistas levarão anos a analisar.
A NASA planeia, na próxima década, enviar uma missão para recuperar as amostras recolhidas, que estarão armazenadas no Perseverance.
"Obter amostras de Marte seria incrível," diz Horgan. "Não seria apenas um feito incrível de engenharia recuperar as amostras e enviá-las para a Terra, como seria a primeira vez que teríamos amostras trazidas de outro planeta para o nosso. Isto seria bastante histórico."
O rover
O primeiro rover marciano, o pequeno Sojourner com o tamanho de um micro-ondas, pousou no dia 4 de julho de 1997. O público achou o rover fascinante, possivelmente até adorável: a empresa Hot Wheels até começou a produzir um popular modelo de brinquedo do veículo.
O Perseverance, o quinto rover marciano da NASA, mais do que compensa em capacidades científicas o que lhe falta em "fofura". É o maior rover, o mais pesado, o mais bem "limpo", e contém um conjunto futurístico de tecnologias. Tem lasers para vaporizar rochas (para que os cientistas possam ver os comprimentos de onda da luz produzidos a fim de entender a composição química), capacidades de navegação autónoma para que possa mover-se mais depressa para o próximo local de investigação, brocas para recolher amostras do tamanho de um lápis, um sistema robótico interno para recolher e armazenar as amostras, um sistema de teste para criar oxigénio respirável a partir da atmosfera de Marte. E um drone semelhante a um helicóptero, que tentará voar numa atmosfera que é 100 vezes mais fina do que a da Terra.
Mas, para a equipa científica, a atenção estará focada no braço robótico com mais de 2 metros no exterior do veículo; na extremidade do braço está um conjunto de instrumentos do tamanho de um cortador de relva.
"Este braço robótico é que fará a maior parte do trabalho," disse Horgan. "Podemos colocá-lo com precisão milimétrica, o que é inacreditável. E no braço estarão estes incríveis microscópios para mapear minerais e materiais orgânicos em escala muito fina."
No topo do mastro está uma câmara de lente dupla especial, a Mastcam-Z, pela qual Horgan tem uma afinidade especial porque faz parte da equipa que a construiu e porque ajudará a operá-la em Marte.
A câmara tem uma capacidade de ampliação forte o suficiente para ser usada para ver uma mosca na outra extremidade de um campo de futebol. A câmara pode obter imagens a cores, em 3D e vídeo. É precisa o suficiente para que os cientistas possam usá-la para análises composicionais do terreno circundante.
"Nós podemos realmente fazer alguma espectroscopia simples olhando para a dependência do comprimento de onda da luz solar refletida nas rochas para ajudar a identificar as suas impressões digitais minerais," diz Horgan.
O local de pouso
O Perseverance deverá pousar num local específico a norte do equador marciano, numa cratera com 45 km de diâmetro chamada Jezero, um local selecionado por uma equipa científica. O local é atrativo porque pensa-se que a cratera já tenha contido um lago do tamanho do Lago Tahoe.
"Se olharmos para o local, podemos ver evidências de um grande canal que leva à cratera, criando um delta onde entrava num lago, e um segundo canal saindo da cratera," diz Horgan. "Este local de aterragem é empolgante porque temos evidências realmente claras de que este antigo lago existiu, que teve água líquida persistente por tempo suficiente para criar este antigo delta, e que havia água suficiente para transbordar e criar o canal de escoamento. Isto sugere que o lago era um ambiente estável e de vida longa que podia ter sido habitado por vida microbiana antiga."
O rover vai tentar pousar na orla da cratera, perto do delta, para que possa explorar ambas as paisagens. O local de destino é conhecido como "elipse de pouso".
"A elipse de pouso para o rover Mars 2020 tem cerca de 7 por 9 km, o que é realmente muito pouco. Se voltarmos atrás no tempo, há 17 anos, quando enviámos os dois rovers Spirit e Opportunity para Marte, a sua elipse de pouso tinha cerca de 100 quilómetros de comprimento. De modo que ficámos muito bons em localizar o nosso local de aterragem," diz.
A ciência
Para esta missão a Marte, os cientistas estão à procura de sinais de vida passada, em busca de bioassinaturas, pistas de que a vida já lá existiu. As bioassinaturas podem variar de algo tão pequeno como isótopos específicos ou substâncias químicas produzidas por seres vivos, como colesterol, até algo muito maior, como fósseis microscópicos.
"Um osso de dinossauro é um exemplo de uma bioassinatura que encontramos em rochas antigas na Terra," diz Horgan. "Eu adoraria encontrar evidências de que os dinossauros já vaguearam por Marte, mas, ao invés, vamos procurar bioassinaturas de micróbios do tamanho de bactérias."
É aqui que as amostras armazenadas no Perseverance entram em jogo. O plano é que uma missão separada, a ser feita em parceria com a ESA, vá a Marte, recupere as amostras e as envie para a Terra.
"Assim que estiverem na Terra, podemos usar ferramentas muito mais poderosas, como microscópicos eletrónicos de varrimento, para confirmar se estas bioassinaturas foram criadas por micróbios," diz Horgan.
"Como parte do nosso trabalho para avaliar Jezero durante a seleção do local, liderei uma equipa para estudar a mineralogia dos depósitos do lago. E obtivemos alguns resultados bastante interessantes."
Horgan e colegas descobriram evidências de carbonatos em torno da margem do antigo lago, no que Horgan descreve como um "anel de banheira". O anel de carbonatos ocorre exatamente onde antigas linhas costeiras e praias do lago estão previstas, de modo que a equipa propôs que se formaram à beira do lago.
Na Terra, os carbonatos são conhecidos por duas coisas. Em primeiro lugar, indicam que o local onde se encontram já conteve água. Em segundo lugar, formam sedimentos que geralmente são ricos em fósseis.
"Isto é realmente emocionante porque é exatamente o tipo de lugar onde procuraríamos bioassinaturas microbianas de um lago na Terra. Quando esses minerais precipitam da água, podem capturar qualquer coisa, incluindo micróbios e materiais orgânicos," diz. "Portanto, a nossa equipa tem trabalhado muito para tentar planear como vamos explorar este local."
A aterragem
"A aterragem é sempre muito stressante porque basicamente estamos a enviar o nosso valioso rover, no qual passámos tantas horas a pensar e a trabalhar, numa bola gigante de fogo que poderá colidir com a superfície de um planeta," realça. "A bola de fogo forma-se porque o rover entra na atmosfera de Marte a 21.000 km/h, produzindo um enorme invólucro de plasma em redor da cápsula. Não é possível obter sinais de rádio através desta bola de fogo de plasma. O rover leva sete minutos para descer até à superfície desde que entra na atmosfera.
"Mas também são necessários sete minutos para o sinal de rádio chegar até à Terra. Assim sendo, quando recebemos o sinal de que o rover atingiu a atmosfera, ou este está realmente à superfície do planeta, de boa saúde, ou colidiu com o chão. Simplesmente não sabemos, de modo que estaremos ansiosos por receber o primeiro sinal do veículo para saber que pousou em segurança. É por isso que chamamos a este espaço de tempo os 'sete minutos de terror'."
O futuro
"Um dos melhores aspetos de uma missão a Marte como esta é que é uma grande oportunidade para envolver os alunos. Tenho na equipa alguns alunos que estão a ajudar com a análise do local de aterragem e que vão ajudar a operar o rover em Marte," comenta Horgan. "Estamos também a planear ter alunos de Purdue a trabalhar no processamento e na análise de dados do rover".
Às vezes, o trabalho com os estudantes inclui trabalho de campo em locais na Terra que podem assemelhar-se ao terreno de Marte, que os cientistas chamam de ambiente análogo. Por exemplo, em setembro de 2019 Horgan, o estudante de doutoramento Bradley Garczynski e uma equipa de investigação viajaram oito horas de Istambul, Turquia, até ao Lago Salda. O lago tem carbonatos e micróbios fossilizados na forma de estromatólitos, exatamente o tipo que os cientistas que estudam Marte esperam encontrar na Cratera Jezero.
"É assim que treinamos o futuro da ciência planetária. Trazemo-los para a missão e, daqui a alguns anos, podem tornar-se líderes científicos," conclui Horgan.
O rover Perseverance vai chegar ao Planeta Vermelho no dia 18 de fevereiro. A cientista planetária Briony Horgan fez parte da equipa científica que selecionou o local de aterragem na Cratera Jezero, logo a norte do equador do planeta.
Crédito: Centro de Pesquisa Ames da NASA/USGS/JPL/Corrine Rojas
O rover marciano Perseverance tem o tamanho de um SUV e é um feito de engenharia tanto do ponto de vista tecnológico como do ponto de vista científico.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
O local de pouso do rover Perseverance é aqui visto na oval perto da fronteira da Cratera Jezero. Está na orla do que se pensa ter sido um antigo delta de um rio. Nesta imagem, o verde corresponde a maiores elevações e o azul a elevações mais baixas.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
Cientistas que procuram em Marte sinais de vida passada focam-se numa área rica em minerais chamados carbonatos (a cor verde nesta imagem), que na Terra são conhecidos por preservar vida fossilizada.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/MSSS/JHU-APL/Purdue/USGS
Esta ilustração mostra os eventos que ocorrem nos minutos finais dos quase sete meses de viagem do rover Perseverance da NASA. Centenas de eventos críticos devem ser executados na perfeição e exatamente à hora planeada para que o rover aterre em segurança em Marte no dia 18 de fevereiro de 2021.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
Por vezes, para estudar Marte, os investigadores têm primeiro que estudar locais parecidos na Terra que possam assemelhar-se com terreno marciano, que os cientistas chamam de ambiente análogo. Por exemplo, a oito horas de Istambul, encontra-se um lago profundo, o Lago Salda, que tem carbonatos e micróbios fossilizados na forma de estromatólitos, exatamente o tipo que os cientistas que estudam Marte esperam encontrar na Cratera Jezero.
Crédito: Universidade Purdue/Briony Horgan