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SURPRESAS GELADAS NO COMETA DA ROSETTA
22 de novembro de 2016

 


No final de março de 2015, o espectrómetro VIRTIS da Rosetta detetou uma grande área de dióxido de carbono gelado em Anhur, uma região no hemisfério sul do Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko. Esta é a primeira deteção de dióxido de carbono sólido num cometa.
A área de 80x60 m - quase do tamanho de um campo de futebol - foi observada em dois dias consecutivos. No entanto, quando a equipa observou a mesma zona três semanas depois, tinha desaparecido.
Acima temos imagens e espectros do cometa obtidos pelo VIRTIS nos dias 21 e 22 de março de 2015, com a assinatura inconfundível do dióxido de carbono gelado: uma série de três linhas de absorção a comprimentos de onda que rondam os 2 micrómetros, e duas linhas de absorção adicionais a 2,7 e 2,78 micrómetros. Estas características não estão presentes no espectro da água gelada.
A análise dos dados revela que a camada com 9 cm de espessura tem uma pequena percentagem de dióxido de carbono gelado combinado com uma mistura mais escura de poeira e material orgânico. Os dados sugerem que os grãos de gelo e material mais escuro estão separados na mistura.
Imagens posteriores e espectros, obtidos pelo VIRTIS nos dias 12-13 de abril, mostram que a assinatura do dióxido de carbono gelado tinha desaparecido.
Crédito: dados - ESA/Rosetta/VIRTIS/INAF-IAPS/Obs. de Paris-Lesia/DLR; G. Filacchione et al.; Science 10.1126/science.aag3161 (2016); imagem de contexto - ESA/Rosetta/NavCam
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No ano passado, à medida que o cometa da Rosetta se aproximava do seu período mais ativo, a sonda avistou dióxido de carbono gelado - nunca antes visto num cometa - seguido pelo aparecimento de duas áreas invulgarmente grandes de água gelada.

A camada gelada de dióxido de carbono cobria uma área comparável a um campo de futebol, enquanto as duas zonas de água gelada eram maiores do que uma piscina olímpica e muito maiores do que quaisquer outros sinais de gelo avistados anteriormente no cometa.

As três camadas geladas foram descobertas todas na mesma região, no hemisfério sul do cometa.

Devido a uma combinação da forma complexa do cometa, ao seu trajeto alongado em redor do Sol e à inclinação substancial da sua rotação, as estações são desiguais nos dois hemisférios do Cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, que tem dois lóbulos.

Quando a Rosetta aí chegou em agosto de 2014, o hemisfério norte ainda estava passando pelo seu verão de 5,5 anos, enquanto no hemisfério sul era inverno e grande parte estava envolto em escuridão.

No entanto, pouco antes da maior aproximação do cometa ao Sol em agosto de 2015, as estações mudaram e o hemisfério sul sofreu um breve mais intenso verão, expondo esta região novamente à luz solar.

No primeiro semestre de 2015, à medida que o cometa se tornava mais ativo, a Rosetta observou vapor de água e outros gases libertados pelo núcleo, levantando a sua cobertura poeirenta e revelando alguns dos segredos gelados do cometa.

Em particular, em duas ocasiões no final de março de 2015, o espectrómetro VIRTIS da Rosetta encontrou uma grande zona de dióxido de carbono gelado na região Anhur, no hemisfério sul do cometa.

Esta é a primeira deteção de dióxido de carbono sólido num cometa, embora não seja invulgar no Sistema Solar - por exemplo, é abundante nas calotes polares de Marte.

"Sabemos que os cometas contêm dióxido de carbono que, depois da água, é um dos elementos mais abundantes das atmosferas cometárias, mas é extremamente difícil de observar no estado sólido à superfície," explica Gianrico Filacchione do INAF-IAPS (Instituto de Astrofísica e Planetologia Espacial) em Itália, que liderou o estudo.

No ambiente do cometa, o dióxido de carbono congela a -193ºC, muito abaixo da temperatura em que a água se transforma em gelo. Acima dessa temperatura, muda diretamente do estado sólido para o estado gasoso, dificultando a sua deteção à superfície sob a forma de gelo.

Em contraste, já se descobriu água gelada em vários cometas e a Rosetta detetou muitas áreas pequenas em várias regiões.

"Esperávamos encontrar sinais de dióxido de carbono gelado e já estávamos à procura há algum tempo, mas foi definitivamente uma surpresa quando, finalmente, detetámos a sua assinatura inconfundível," acrescenta Gianrico.

A área, que albergava apenas uma pequena percentagem de dióxido de carbono gelado combinado com uma mistura mais escura de poeira e material orgânico, foi observada em março duramte dois dias consecutivo. Tiveram sorte na descoberta: quando a equipa observou a região novamente cerca de três semanas depois, tinha desaparecido.

Assumindo que todo o gelo foi transformado em gás, os cientistas estimaram que a zona de 80x60 metros continha cerca de 57 kg de dióxido de carbono, correspondendo a uma camada com 9 cm de espessura. A sua presença à superfície é provavelmente um caso isolado e raro, dado que a maioria do dióxido de carbono gelado está confinado às camadas mais profundas do núcleo.

Gianrico e colaboradores pensam que a área gelada remonta a alguns anos atrás, quando o cometa ainda se encontrava nos confins frios do Sistema Solar exterior e no hemisfério sul ainda era inverno longo. Nessa época, parte do dióxido de carbono, ainda libertado do interior do núcleo, condensava-se à superfície, onde permanecia congelado durante muito tempo, só se tornando em vapor quando a temperatura local finalmente subiu novamente em abril de 2015.

Isto revela um ciclo sazonal de dióxido de carbono gelado, que se desenrola ao longo dos 6,5 anos da órbita do cometa, ao contrário do ciclo diário de água gelada, também avistado pelo VIRTIS logo após a chegada da Rosetta.

Curiosamente, pouco depois do dióxido de carbono gelado ter desaparecido, a câmara OSIRIS da Rosetta detetou duas áreas invulgarmente grandes de água gelada na mesma zona, entre as regiões sul de Anhur e Bes.

"Já tínhamos visto muitas áreas expostas de água gelada em várias regiões do cometa, mas as novas deteções são muito maiores, cada medindo cerca de 30x40 m, e aí persistiram por mais ou menos 10 dias antes de desaparecem completamente," comenta Sonia Fornasier do LESIA-Observatório de Paris e da Universidade Paris Diderot, França, cientista principal do estudo que se focou nas variações sazonais e diárias da cor da superfície.

Estas áreas ricas em gelo aparecem como zonas muito brilhantes da superfície do cometa que refletem luz mais azul em comparação com os arredores mais avermelhados. Os cientistas experimentaram misturas de poeiras e água gelada para mostrar que, à medida que a concentração de gelo aumenta, a luz refletida torna-se gradualmente mais azulada até chegar a um ponto em que quantidades iguais de luz são refletidas em todas as cores.

As duas áreas recentemente detetadas contêm 20-30% de água gelada misturada com material mais escuro, formando uma camada de gelo sólido com até 30 cm de espessura. Uma delas provavelmente espreitava por baixo da camada de dióxido de carbono gelado revelada pelo VIRTIS cerca de um mês antes.

"Numa escala global, também descobrimos que toda a superfície do cometa ficou cada vez mais azul à medida que se aproximava do Sol e que a intensa atividade levantava grandes quantidades de poeira, expondo mais do terreno por baixo, rico em gelo," explica Sonia.

À medida que o cometa se afastava do Sol, os cientistas observaram a cor geral da superfície do cometa a tornar-se, novamente e gradualmente, mais vermelha.

Também revelaram variações locais de cor, indicativas do ciclo diário de água gelada. Transformando-se rapidamente em vapor de água quando exposta à luz solar durante o dia local, condensava-se novamente em camadas finas de gelo à medida que a temperatura diminuía após o pôr-do-Sol, apenas para vaporizar novamente no dia seguinte.

A distribuição de água gelada por baixo da superfície empoeirada do cometa parece amplamente difundida, mas não uniformemente, com pequenas zonas salpicando o núcleo, aparecendo e desaparecendo como resultado da atividade do cometa.

Ocasionalmente, são também reveladas porções maiores e mais espessas de gelo, que remontam a uma anterior aproximação ao Sol.

"Estes dois estudos do conteúdo gelado do cometa estão a revelar novos detalhes sobre a composição e história do núcleo," afirma Matt Taylor, cientista do projeto Rosetta da ESA.

"Apesar da parte de voo da missão ter terminado, a exploração científica da enorme quantidade de dados recolhidos pela Rosetta continua."

 


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No final de abril de 2015, a câmara OSIRIS da Rosetta detetou duas áreas invulgarmente grandes de água gelada no Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, entre as regiões sul de Anhur e Bes.
O gráfico mostra a aparência das duas zonas (indicadas como A e B), que aí persistiram durante cerca de 10 dias antes de desaparecem completamente.
As duas áreas ricas em gelo mediam mais ou menos 30x40 m cada uma - maiores do que uma piscina olímpica - e eram muito maiores do que outras áreas idênticas de gelo exposta, anteriormente avistadas no cometa.
Continham aproximadamentre 20-30% de água gelada misturada com material mais escuro, formando uma camada de gelo com até 30 cm de espessura. A área de água gelada A estava provavelmente por baixo da camada de dióxido de carbono gelado revelada pelo instrumento VIRTIS da Rosetta cerca de um mês antes.
Este achado faz parte de um estudo mais abrangente das variações sazonais e diárias da cor da superfície bom base em imagens do OSIRIS e obtidas durante toda a missão.
Crédito: ESA/Rosetta/MPS para a Equipa OSIRIS MPS/UPD/LAM/IAA/SSO/INTA/UPM/DASP/IDA; S. Fornasier et al., Science 10.1126/science.aag2671 (2016)
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A cor da luz visível refletida pelo Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko no dia 1 de agosto de 2014 (esquerda), pouco antes da chegada da Rosetta ao cometa, e um ano depois, no dia 30 de agosto de 2015, pouco depois da maior aproximação do cometa ao Sol. Os mapas são derivados da comparação de imagens obtidas a comprimentos de onda entre 535 e 882 nm com a câmara OSIRIS da Rosetta.
Numa escala global, toda a superfície do cometa tornou-se gradualmente mais azulada à medida que este se aproximava do Sol, e gradualmente mais vermelha quando se movia novamente para longe da nossa estrela. As cores mais azuladas são indicativas de porções da superfície mais ricas em água gelada.
À medida que o cometa se aproximava do Sol e a sua atividade aumentava, a libertação de vapor de água e outros gases expelia grandes quantidades de poeira, expondo mais do terreno rico em gelo por baixo.
Crédito: ESA/Rosetta/MPS para a Equipa OSIRIS MPS/UPD/LAM/IAA/SSO/INTA/UPM/DASP/IDA; S. Fornasier et al., Science 10.1126/science.aag2671 (2016)
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